Quarta-feira, 29 de março de 2023 - 10h55
Vinício
Carrilho Martinez (Dr.)
Cientista Social
Professor Associado da UFSCar
https://youtube.com/c/ACi%C3%AAnciadaCF88
Considerações iniciais: objetivamente, diremos que: onde desfila a miséria humana,
já se destilou o ódio social – objetivando-se quem “poderia” sofrer violências
e negações.
Esse
é o tipo de ódio que gruda e teima, como segunda pele. É esse ódio que faz
distinção de vida: quem deve viver, quem pode (“merece”) morrer.
Esse
tipo de ódio é retratado em nossa história como um contínuo, um assombroso
eterno retorno, em continuidade ao escravismo em sua mentalidade e nas suas
práticas.
Esse
ódio social nos explica porque modos de produção antigos, obsoletos,
necrosados, atávicos como marquises de mitologias degeneradas, ainda subsistem
no Brasil.
Trata-se de um ódio escravista,
encrustado, sacramentado religiosamente, supremacista, condescendente com a
morte planejada e aguardada. Por isso vemos tantas pessoas serem resgatadas das
condições de trabalho análogas à escravidão. Em alguns casos há até grilhões.
Esse
ódio social ainda exemplifica o fato de que o Brasil combinou perfeitamente,
num hibridismo de Plantation, a
escravidão e o capitalismo – na fase de acumulação primitiva de capitais. O
consumo e o bem-estar sempre foram do colonizador.
Desse
modo, resta evidente que, a luta pela integralidade dos Direitos Humanos
Fundamentais, classistas, contudo, pela angular de quem olha a “contrapelo”,
tem por objeto central a derrota do ódio social, racista, misógino, disruptivo
da dignidade humana.
Um
pouco mais sobre o objeto
A luta pelos Direitos humanos
continua, é contínua e é sempre uma luta sistêmica, especialmente contra o
arbítrio, as desigualdades, as intolerâncias, e toda forma de
autocracia. É uma Luta pelo Direito, no sentido de Ihering[1], como luta
política por dentro da luta de classes.
Para vermos a luta de classes,
basta-nos abrir a janela e olhar para as ruas – sobretudo, se estiverem
afastadas do conforto das classes médias em seus labirintos de condomínios
excludentes, prontos a repelir, banir, como ávidos e hábeis sistemas
banópticos.
O dia 1º de Abril de 2023, o
primeiro sob a vigência da democracia ainda insuficiente, no pós Golpe de
Estado de 2016, deve assim ser visto: ícone do atentado contra a Nação, o povo,
a classe trabalhadora, os pobres, as mulheres negras e os indígenas.
O golpe de 1964 só trouxe arbítrio e
trevas, gerou por exemplo 2018 e as piores sequelas fascistas. Ainda estão em
todo lugar. Assim, o dia 1° de Abril é o Dia da Mentira e do golpe de
1964.
O golpe foi real, até hoje tem
efeitos maléficos no povo e no Estado, porém, é Mentira (maiúscula) que
houvesse iminência de comunismo. E, pior ainda, que o comunismo fosse
prejudicial ao país.
O comunismo não come criancinhas,
mas fascistas degenerados sim; aliás, o fascista-mor desse país (exilado pelas
urnas) gaba-se de "ter pintado um clima", com meninas de 12
anos.
O entreguismo da soberania nacional,
as torturas, os assassinatos, as gravíssimas violações de direitos humanos, o
AI-5 que eliminou formalmente os direitos fundamentais, tudo isso foi muito
real, no pós-64.
Os efeitos dessa realidade,
escondidos em escombros de mentiras, tudo isso foi e ainda é muito real.
Portanto, o dia 1° de Abril deve ser
considerado como o dia da pior mentira nacional. O dia em que teve início
o planejamento meticuloso da corrupção dos nossos símbolos, das nossas riquezas
nacionais, da própria "alma brasilis" - com reflexos na incapacidade
de reflexão histórica que ainda nos compele.
Também deve ser tido como o Dia da
Verdade, da verdade histórica impulsionada pelas inúmeras lutas de resistência
política e popular. O Dia da Verdade que até hoje buscamos, e lutamos para
que não seja esquecido.
Tratamos da luta de todos e de todas
que perseveram na luta pelos Direitos Humanos - agora como eixo da diversidade
cultural brasileira, nosso Processo Civilizatório, pela dignidade do povo, pela
mais justa e equilibrada "unidade na diversidade".
Pois, é disso que tratam os Direitos
Humanos.
Acrescente-se que devemos tratar dos
Direitos Humanos Fundamentais, ou seja, da fixação de urgência da dignidade do
povo pobre, negro e oprimido. Como urgência, urgentíssima, afinal, a fome não
espera. A fome de tudo, porque tudo lhes é negado.
Este deve ser o fundamento do Estado
Democrático de Direito.
Em que pese o fato óbvio que a
dignidade humana de ninguém possa ser mitigada, secundarizada, é ainda mais
óbvio e contundente (a quem tenha inteligência social) que a dignidade do povo
pobre, negro e oprimido deve ser a guia social, política e econômica.
Se contabilizarmos os esforços por
dizimar os povos tradicionais, os indígenas, os povos da floresta, os
quilombolas, os miscigenados à força, a conta crescerá muito. Porém, ainda
devemos acrescentar todos os atos criadores de privilégios, em benefício da Tecnocracia,
das hostes do Poder Público, aburguesadas e enviesadas pelo capital
concêntrico, aglutinador de espólios e da renda nacional. Esse é, por exemplo,
o perfil do Poder Judiciário, encastelado em redomas, sob a vertigem de uma
casta que flutua sobre a realidade prosaica dos “reles mortais” (os
contribuintes de suas benesses). Essa história, se não fosse um conto do
vigário, seria uma replicação de Kafka, em seu Processo descontínuo da
credibilidade (honestidade pública) e do seu Castelo: onde vivem os
jurisconsultos herdeiros dos piores tipos da Roma antiga.
Somemos a isso os verdadeiros
atentados político-jurídicos cometidos contra a classe trabalhadora, as
reformas trabalhistas que, praticamente, nunca trouxeram um benefício, um
direito real aos trabalhadores – menos ainda para a mulher negra da classe
trabalhadora.
Não é difícil perceber, entender, quando temos
alguma inteligência social, que a luta pelos Direitos Humanos é muito mais do
que uma luta pelo Direito; efetivamente, é uma luta política por meio da luta
de classes. É uma luta que tem hora para começar, hoje, agora mesmo, neste
instante em que escrevo, mas que não tem término: o malfeito sempre nos
atingirá. E o pior a se fazer é, notoriamente, nada fazer.
Daí que a luta pela eficácia dos
Direitos Humanos Fundamentais é o miolo de urgência na retomada do Estado
Democrático de Direito. Trata-se, então, de colocar a dignidade do povo pobre,
negro e oprimido, como requisito essencial da luta pela recuperação dos
Direitos Humanos neste país.
Esta é a premissa do que aqui
considero como Direitos Humanos Fundamentais: lastrear a dignidade do povo
pobre, negro e oprimido para que não mais conheçamos a miséria humana.
Por isso insistimos, mais do nunca:
é imperiosa a Luta pelo Direito, como luta política por meio da luta de
classes, em defesa e na promoção da efetivação dos Direitos Humanos
Fundamentais do povo pobre, negro e oprimido.
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