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Vinício Carrilho

Em Defesa da Democracia - vamos ler, mandatário?


Em Defesa da Democracia - vamos ler, mandatário? - Gente de Opinião

Por

Vinício Carrilho Martinez – Cientista Social

Miriam Morata Novaes – Arquiteta

Neide Ferreira Marinho – Turismóloga

Caio Henrique Lopes Ramiro – Advogado

Walter Gustavo Lemos – Advogado

Vanderlei de Freitas Nascimento Jr. – Advogado

Marfiza Calixto de França – Música/OMB 463

Mariana Antero Paladini – Pedagoga

Ricardo Almeida Zacharias – Advogado

Alzira Bombonato Melo Rios da Silva – Enfermeira/Especialista em Bioética

 

Muitas vezes, para se definir algo com rapidez e clareza, é mais fácil começar pelo seu contrário, ou seja, por sua negação. Não é o melhor jornalismo, sem dúvida, porém, para uma conversa certeira com o (e)leitor mais desatento ou retinto, é a trajetória mais curta. Vejamos.

          Democracia é o oposto de Autocracia – que, por sua vez, está além de algum atributo autoritário. Afinal, nós sempre temos algo de autoritários: o pai que tira o celular ou impede que o filho adolescente chegue de madrugada em casa ou não vá à aula, porque bebeu demais, com certeza será exorcizado pelo jovem e talvez por muitas pessoas, como um pai autoritário. Então, Autocracia não é sinônimo de autoritarismo, ainda que toda Autocracia, obviamente, seja absurdamente autoritária.

          A Autocracia, como o avesso da democracia – desde a antiga Grécia – indica que o poder está centralizado num único agente político: AUTO + CRACIA (poder). O poder autocrático é aquele que desemboca num único tirano, com todo o poder estando a cargo de uma só pessoa.

          Nesse sentido, é o oposto de Democracia (DEMO + CRACIA), em que o povo é o detentor da soberania, sendo-lhe conferida a chancela da soberania popular, isto é, o soberano é o povo; ao reverso da Autocracia, em que o soberano é o tirano.

          Com isso, já sabemos o que não é a Democracia e, ainda, conhecemos um dos elementos vitais da Democracia: soberania popular. Além disso, podemos dizer que a Democracia tem vários métodos para se conferir a soberania popular – uma delas é o sufrágio universal, em que a maior parcela possível do povo seja conclamada a decidir sobre os rumos do grupo, do país e os seus próprios caminhos. No Brasil, sabemos disso, o sufrágio universal está em constante ampliação, nosso regramento constitucional, eleitoral, é um dos melhores do mundo ocidental: votam analfabetos, presos em condição de ressocialização, menores de 18 e acima de 16 – sem contar a plena isonomia, eleitoralmente falando, entre homens e mulheres, brancos, negros e não-brancos, ricos e pobres. Isto é, aplica-se a regra liberal mais básica: “cada cidadão, cada cidadã, um voto”.

          Outro aspecto decorrente disso reflete-se na aprovação e diplomação das pessoas eleitas. Ou seja, quem teve a maior parcela de votos (quociente eleitoral ou votos absolutos) é quem recebe o direito de legislar (Poder Legislativo) ou de dirigir o Poder Político (Poder Executivo). E é esse, exatamente, o ponto em debate hoje em dia. O atual mandatário – sabedor da derrota antecipada, incontestável, em outubro – quer melar o processo eleitoral. Aí inventa – junto com a Falange do Mal – suspeições contra a urna eletrônica: possíveis alegações que nunca foram comprovadas. Aliás, a urna eletrônica passou em todos os testes técnicos (públicos) a que foi submetida sua segurança e confiabilidade. Portanto, o modus operandi do mandatário não decorre do zelo, cuidado, com a Democracia, a República, o Estado de Direito, a Constituição.

          Como também sabemos, as tentativas de deslegitimar o processo eleitoral, a Justiça Eleitoral (Tribunal Superior Eleitoral), fracassaram rotundamente: até mesmo militares de alto escalão, empresários, Juízes pela Democracia, ministros de segurança, de outros países, assinaram a Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa da Democracia. Assim como esses que subscrevem o artigo.

          Ao mandatário, incapaz de garantir de impedir uma derrota fragorosa e assegurar uma vitória limpa, restaram poucas opções, e nenhuma lhe é satisfatória – por exemplo: falou-se em aprofundar o caos social, a guerra civil, para então se editar (com apoio do centrão) uma PEC anulando a eleição e esticando os mandatos de todos, por um ou dois anos (não colou); depois, essa ainda está em jogo, foi aconselhado a buscar a anulação de sua chapa, porque, assim, impedido de participar do pleito de 2022, não seria o único presidente reprovado em sua reeleição, desde que FHC iniciou o pior estatuto da Democracia brasileira.

          O mandatário, na prática diuturna e em todas as suas “manifestações de pensamento” (sic), nunca, sequer entendeu e proporcionou o acolhimento das regras mais elementares desta chamada Democracia Liberal ou Representativa. Nem é preciso dizer que é avessa qualquer menção a uma Democracia Social, econômica, inclusiva, civilizatória – e menos ainda aceitaria conselhos para o aprofundamento democrático: como Democracia Radical ou Profunda. É óbvio que os pesadelos lhe cortariam qualquer “pensamento” que ultrapassasse o nível dos xingamentos.

          Jamais iria concordar com a menor das regras democráticas, como nos ensinou o eminente jurista italiano Norberto Bobbio, promovendo a própria síntese do Ocidente Democrático: entendimento do sufrágio universal, prevalência dos direitos fundamentais, aceitação da vontade da maioria, conciliação e respeito integral às minorias.

          Como a imensa maioria já sabe, a única regra que o mandatário conhece é a que ecoa no cérebro, partindo de seu sistema pessoal de comunicação. Por isso, muitas vezes, todas as vezes – parece-nos mais adequado assim, o eco bate no fundo da caixa óssea, sem se aproximar da consciência.

          A base, no entanto, que o mandatário adepto de ruptura institucional ignora solenemente, traz a essência da tolerância, os Direitos Humanos, o Império da Lei, a não-violência, a paz social, o combate austero ao Fascismo, a Verdade Pública em revés da mentira programada por algoritmos.

          E é em torno disso que todos os não-fascistas, democratas, republicanos, liberais, socialistas, comunistas se alinharam nos últimos tempos, em cartas comuns, ensaios, manifestos, abaixo-assinados e, mais ainda, tomando as ruas e pintando com as cores da Liberdade, do respeito às regras do jogo, em vias públicas e privadas que descortinam os valores humanos e a convivência pacífica. E é por isso que a derrota do Fascismo virá em outubro.

 

Vamos ler, mandatário?

BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de janeiro : Paz e Terra, 1986.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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