Domingo, 31 de julho de 2022 - 12h09
Por
Vinício Carrilho Martinez – Cientista Social
Miriam Morata Novaes – Arquiteta
Neide Ferreira Marinho – Turismóloga
Caio Henrique Lopes Ramiro – Advogado
Walter Gustavo Lemos – Advogado
Vanderlei de Freitas Nascimento Jr. – Advogado
Marfiza Calixto de França – Música/OMB 463
Mariana Antero Paladini – Pedagoga
Ricardo Almeida Zacharias – Advogado
Alzira Bombonato Melo Rios da Silva – Enfermeira/Especialista
em Bioética
Muitas vezes, para se
definir algo com rapidez e clareza, é mais fácil começar pelo seu contrário, ou
seja, por sua negação. Não é o melhor jornalismo, sem dúvida, porém, para uma
conversa certeira com o (e)leitor mais desatento ou retinto, é a trajetória
mais curta. Vejamos.
Democracia
é o oposto de Autocracia – que, por sua vez, está além de algum atributo
autoritário. Afinal, nós sempre temos algo de autoritários: o pai que tira o
celular ou impede que o filho adolescente chegue de madrugada em casa ou não vá
à aula, porque bebeu demais, com certeza será exorcizado pelo jovem e talvez
por muitas pessoas, como um pai autoritário. Então, Autocracia não é sinônimo
de autoritarismo, ainda que toda Autocracia, obviamente, seja absurdamente
autoritária.
A Autocracia,
como o avesso da democracia – desde a antiga Grécia – indica que o poder está
centralizado num único agente político: AUTO + CRACIA (poder). O poder
autocrático é aquele que desemboca num único tirano, com todo o poder estando a
cargo de uma só pessoa.
Nesse
sentido, é o oposto de Democracia (DEMO + CRACIA), em que o povo é o detentor
da soberania, sendo-lhe conferida a chancela da soberania popular, isto é, o
soberano é o povo; ao reverso da Autocracia, em que o soberano é o tirano.
Com
isso, já sabemos o que não é a Democracia e, ainda, conhecemos um dos elementos
vitais da Democracia: soberania popular. Além disso, podemos dizer que a
Democracia tem vários métodos para se conferir a soberania popular – uma delas
é o sufrágio universal, em que a maior parcela possível do povo seja conclamada
a decidir sobre os rumos do grupo, do país e os seus próprios caminhos. No
Brasil, sabemos disso, o sufrágio universal está em constante ampliação, nosso
regramento constitucional, eleitoral, é um dos melhores do mundo ocidental:
votam analfabetos, presos em condição de ressocialização, menores de 18 e acima
de 16 – sem contar a plena isonomia, eleitoralmente falando, entre homens e
mulheres, brancos, negros e não-brancos, ricos e pobres. Isto é, aplica-se a
regra liberal mais básica: “cada cidadão, cada cidadã, um voto”.
Outro
aspecto decorrente disso reflete-se na aprovação e diplomação das pessoas
eleitas. Ou seja, quem teve a maior parcela de votos (quociente eleitoral ou
votos absolutos) é quem recebe o direito de legislar (Poder Legislativo) ou de
dirigir o Poder Político (Poder Executivo). E é esse, exatamente, o ponto em
debate hoje em dia. O atual mandatário – sabedor da derrota antecipada,
incontestável, em outubro – quer melar o processo eleitoral. Aí inventa – junto
com a Falange do Mal – suspeições contra a urna eletrônica: possíveis alegações
que nunca foram comprovadas. Aliás, a urna eletrônica passou em todos os testes
técnicos (públicos) a que foi submetida sua segurança e confiabilidade.
Portanto, o modus operandi do mandatário não decorre do zelo, cuidado, com a
Democracia, a República, o Estado de Direito, a Constituição.
Como
também sabemos, as tentativas de deslegitimar o processo eleitoral, a Justiça
Eleitoral (Tribunal Superior Eleitoral), fracassaram rotundamente: até mesmo
militares de alto escalão, empresários, Juízes pela Democracia, ministros de
segurança, de outros países, assinaram a Carta às Brasileiras e aos Brasileiros
em defesa da Democracia. Assim como esses que subscrevem o artigo.
Ao
mandatário, incapaz de garantir de impedir uma derrota fragorosa e assegurar
uma vitória limpa, restaram poucas opções, e nenhuma lhe é satisfatória – por
exemplo: falou-se em aprofundar o caos social, a guerra civil, para então se
editar (com apoio do centrão) uma PEC anulando a eleição e esticando os
mandatos de todos, por um ou dois anos (não colou); depois, essa ainda está em
jogo, foi aconselhado a buscar a anulação de sua chapa, porque, assim, impedido
de participar do pleito de 2022, não seria o único presidente reprovado em sua
reeleição, desde que FHC iniciou o pior estatuto da Democracia brasileira.
O
mandatário, na prática diuturna e em todas as suas “manifestações de
pensamento” (sic), nunca, sequer entendeu e proporcionou o acolhimento das
regras mais elementares desta chamada Democracia Liberal ou Representativa. Nem
é preciso dizer que é avessa qualquer menção a uma Democracia Social,
econômica, inclusiva, civilizatória – e menos ainda aceitaria conselhos para o
aprofundamento democrático: como Democracia Radical ou Profunda. É óbvio que os
pesadelos lhe cortariam qualquer “pensamento” que ultrapassasse o nível dos
xingamentos.
Jamais
iria concordar com a menor das regras democráticas, como nos ensinou o eminente
jurista italiano Norberto Bobbio, promovendo a própria síntese do Ocidente Democrático:
entendimento do sufrágio universal, prevalência dos direitos fundamentais,
aceitação da vontade da maioria, conciliação e respeito integral às minorias.
Como
a imensa maioria já sabe, a única regra que o mandatário conhece é a que ecoa
no cérebro, partindo de seu sistema pessoal de comunicação. Por isso, muitas
vezes, todas as vezes – parece-nos mais adequado assim, o eco bate no fundo da
caixa óssea, sem se aproximar da consciência.
A
base, no entanto, que o mandatário adepto de ruptura institucional ignora
solenemente, traz a essência da tolerância, os Direitos Humanos, o Império da
Lei, a não-violência, a paz social, o combate austero ao Fascismo, a Verdade
Pública em revés da mentira programada por algoritmos.
E é
em torno disso que todos os não-fascistas, democratas, republicanos, liberais,
socialistas, comunistas se alinharam nos últimos tempos, em cartas comuns,
ensaios, manifestos, abaixo-assinados e, mais ainda, tomando as ruas e pintando
com as cores da Liberdade, do respeito às regras do jogo, em vias públicas e
privadas que descortinam os valores humanos e a convivência pacífica. E é por
isso que a derrota do Fascismo virá em outubro.
Vamos ler, mandatário?
BOBBIO,
Norberto. O futuro da democracia:
uma defesa das regras do jogo.
Rio de janeiro : Paz e Terra, 1986.
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