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Vinício Carrilho

Os Lamaçais e o metafísico na Sociologia do Botequim


Os Lamaçais e o metafísico na Sociologia do Botequim - Gente de Opinião

O metafísico é aquele advogado de Nárnia, todo mundo conhece, que, obviamente, é contrário aos Direitos Humanos – todo mundo se lembra do discurso como orador na sua formatura no curso de Antidireito, ao proclamar que “os Direitos Humanos não são direitos fundamentais e, portanto, não prestam para nada e devem ser removidos do ordenamento jurídico” (sic). Até agora, quando escrevo, o metafísico “acha” que fez uma Súmula Vinculante, ou seja, que vinculou a Terra à Nárnia. E, é claro, com vigência imediata, ab ovo.

Essa parte é melhor nem analisarmos hoje, porque o quadro de depressão global já é bem evidente. Outro dia veremos o que significa a pérola do metafísico, ao proclamar, como Oráculo, a inexistência dos Direitos Humanos.

Hoje temos uma história ainda mais curiosa, se é que é possível. Hoje vamos relembrar a passagem em que o metafísico julgou ter encontrado alguém à sua altura, para um desafio de trovas, pérolas, e coisas como: “Nesse rio passam águas que esse rio não beberá”. É incrivelmente metafísica essa expressão de sabedoria narniana do metafísico.

Nesse belo dia (sim, os dias ainda são belos), o metafísico se propôs a declamar suas pérolas de preciosa sabedoria milenar, para além das “margens do rio que o comprimem”. Isso não foi o metafísico quem falou, foi um pensador de verdade (Brecht).

Pois bem, na primeira tirada, o seu oponente – um desconhecido da moralidade pública apelidado pelos fãs de Don Pablito Boçal – o tirou para dançar na primeira emenda. Foi curto e grosso: “Metafísico, você é um verme de jardim”. O metafísico quis retrucar, pedindo regras de civilidade, mas o boçalito (para os mais chegados) mandou outra: “Metafísico, até sua mãe o condenou pela burrice, você foi deserdado”.

Nessa hora o metafísico – que até então se pensava como um ser de mistura perfeita entre substantivo e propriedades, um verdadeiro “nome próprio” (O Metafísico) – foi às lonas. Na hora sentiu raiva, ódio, quis matar e morrer. Aí alguns dias se passaram e o metafísico caiu na real: virou fã incondicional. Amava de paixão o Pablito Boçal – mantinha uma relação platônica, mas profunda.

O metafísico passou a pesquisar sobre a vida de Don Pablito, ou boçalito, e logo descobriu que esse indivíduo é o fundador de uma seita. Sim, uma seita no melhor estilo brasileiro – uma tipologia brasilis impecável. É a nossa “nata do leite C”.

Procurando mais um pouco, o metafísico (agora mais do que apaixonado) revirou todas as latas de lixo da história até encontrar o manifesto de alguém que procurou entender o Don Pablito Boçalito.

O produto é curto, porém, pode ser revelador, e como uma tentativa de análise tinha o seguinte título: “Sociologia do Botequim do metafísico”. Como assim, pensou o metafísico – esse escritor já me conhecia?

Depois vinha uma conclusão antecipada: “Nesse Botequim do Zé ruela só tem otário, ganhando mais do que todos nós nas redes antissociais e dizendo: ‘O que se espera, quando se está esperando? 'Mim ajuda".

Em seguida, no início da análise dizia-se mais ou menos assim:

“Não é só uma vigarice do lamaçal, é um padrão. Um padrão cultural criado por Don Pablito Boçal – o grão líder dos Lamaçais”.

E discorria: “São milhões de seguidores, eleitores, no mesmo padrão cultural. São portadores das mesmas crenças nas chagas que atingem todas as classes sociais, cada uma com a sua especificidade mórbida. 

Alguém apelidou de ’lumpemburguesia’, todavia, nesse caso não se enquadra, pois o lamaçal tem fãs em todas as classes sociais – do lumpem à burguesia. 

O traço cultural que os une é um tipo de brasilidade, de levar vantagem em tudo: a par da interpretação literal da propaganda de cigarros do Gérson. É a expressão da vigarice na face do Miguelito, do Zé ruela.

O traço cultural de união entre os fãs da vigarice é o apreço pela ascensão dessa mesma vigarice, com efetivo e efetividade social. É um conceito da dialética negativa, mas é.

É aquilo que, em outras palavras, Sérgio Buarque de Holanda chamou de Cordialidade. 

Essa Cordialidade é tão vigarista que o lamaçal provocou até tomar porrada e ficar descadeirado. 

Antigamente se dizia que o vigarista no estágio de lamaçal (o que dá nó em pingo d'água) é o cara que rouba a mistura da mãe. Aliás, houve outro personagem (Bozo) que já fez isso. Naquela época se falava de um chorume político, hoje tratamos de um lamaçal de chorumes procriados. Antes era um fenômeno político, atualmente é uma escatologia social, um escombro sociológico.

Em todo caso, não deixa de ser hilário que o ícone dos picaretas lamacentos tenha levado uma cadeirada”.

E fechava: “Don Pablito Boçal, rei dos Lamaçais, representa idealmente todos os vigaristas do lamaçal brasileiro. Na forma de tipo social podemos designar simplesmente como ‘Os Lamaçais’. O tipo social dos Lamaçais reúne características da burguesia brasileira (a ignorância da plutocracia) e o nível de um subsolo alagado pelo chorume do lumpem”. 

Por fim, a análise trazia uma súmula: “Don Pablito Boçal é a síntese, o sumo, a essência encarnada, a verdade escarrada de um tipo social. Esses são os Lamaçais!”. 

De minha parte, concluo a partir da exponenciação de certa depressão cívica (sendo cínica, por sua natureza depravada), porque, se não bastassem os chacais, agora temos Os Lamaçais. Não é fácil, não.

Talvez seja por isso que dizem por aí não fazer bem para a saúde escrever coisas como a “sociologia do botequim”. E não é que é verdade? Vai que alguém me joga uma cadeira...

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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