Terça-feira, 10 de setembro de 2024 - 11h24
Por
que alguém teria (tem) o direito de se tornar trilionário?
Falamos
aqui da possibilidade de Elon Musk (o dono do famoso X, banido do Brasil
pelo STF) em se tornar o primeiro trilionário deste planeta.
Então,
por que, para que alguém possa se tornar o primeiro trilionário do mundo[1] –
em fortuna avaliada em dólar –, milhões, bilhões de outras pessoas “devem”
viver em absoluta miséria, com fome aguda, dor – por falta de equipamentos
médicos?
Será
que esse indivíduo tem (ou terá) alguma consideração pelo sujeito, pelo ser
social – ou os lucros e os meios de aquisição dessa fortuna estratosférica
estão em primeiro lugar?
Será
que o trilionário de amanhã (Elon Musk) está ou já esteve empenhado na defesa
da democracia, do combate às piores formas de desigualdade social, da
emancipação do humano?
Será
que é um bilionário (trilionário amanhã) empenhado na Ética social, na
segurança da cidadania e da soberania dos povos – ou seu mega negócio tem “assuntos
mais importantes” na Lua e em Marte?
Qual é
o nível de “informação” que esse indivíduo produz, junto aos seus pares?
Na
prática, construída por esse futuro trilionário (o mesmo que diz: “darei golpe
quando eu quiser”) e por seus pares milionários, em concomitância à miséria
humana que colecionam – jamais poderão gastar nem 10% de suas mega fortunas –,
na condição efetiva e real, esses indivíduos (altamente dessocializados)
provocam e mantém um fenômeno que chamaremos de “Sinistralidade societal”.
Por
falta de um termo mais adequado, e pensando na necessidade de outro conceito
sociológico que abrigue essas “loucuras sinistras e sistêmicas”, vamos tratar
como “Sinistralidade societal”.
Vale
uma explicação inicial: sinistralidade vem de sinistro, como um tipo de
acidente grave (a exemplo dos seguros de automóveis e residenciais), porém,
também nos remete a algo não apenas terrível, fatal (como o acidente), ou seja,
tratamos de algo sombrio, bizarro, altamente destrutivo, apavorante, algo como
o pior pesadelo em vida.
Além
disso, projetemos essa condição de sinistralidade para o conjunto geral não só
de uma sociedade ou de algumas sociedades (países mais pobres, a África, a
América Latina, boa parte do Oriente Médio), mas já incutindo efeitos muito sinistros
para a Humanidade.
Portanto,
um poder ou capacidade de impor sinistralidades sobre as relações sociais, com
indiferença ao poder soberano, à própria soberania popular e estatal, capaz de
desfazer atividades, setores, as próprias bases econômicas e de produção, e
atuante a fim de que a cultura daí resultante lhes seja dócil, controlada,
obediente.
A
Sinistralidade societal, como se vê, não é somente social, é política,
econômica, cultural, ideológica. Por meio de sua supremacia, uma imposição sem nenhuma
contestação, não há qualquer pedra na Terra ou na Lua que não possa ser
remexida, removida (assim como as pessoas e os Estados), sempre ao inconteste
bel prazer dos bilionários e futuros trilionários. Sim, porque uma vez que seja
rompida essa marca dos bilhões, quem ficou para trás irá querer o mesmo: “O
homem mais rico do mundo” deve guardar sua virilidade no cofre do sonho
aberrante.
Dizem
que a ganância pela posse e propriedade (pelo poder também) tem um efeito
similar à cocaína: esse “lucrar e enriquecer cada vez mais” (“o primeiro
trilionário) atuaria na mesma estrutura cerebral em que a cocaína age. Talvez
realmente seja verdade, especialmente quando observamos que essa é a droga
preferida pela maioria dos operadores de mercado fazendo trade, especulando com
as finanças dos outros.
Não
causa assombro, neste caso, que milionários (ou trilionários) sejam sempre
associados ao uso de drogas com forte poder alucinógeno. Em parte, pelo
conjunto da obra da Sinistralidade societal, esse tipo de dependência química
se associaria aos “sonhos”, desejos, impulsos, compulsões por “deter tudo”, ser
dono de tudo. Como se pudessem ser donos da realidade.
Não
bastaria, assim, serem donos de toda a riqueza do mundo, das pessoas, de suas
produções, pois, nessa ânsia, loucura, ganância total, querem se apossar da
própria realidade. Como se quisessem construir outro mundo, à sua imagem e
semelhança, igual aos seus caprichos e fantasias.
É
óbvio que esse desvario em se apossar da realidade jamais irá ocorrer, pois seria
equivalente a se tornarem donos da lei da gravidade, como se fossem capazes de
inverter a noite pelo dia. Porém, como não conseguem isso, vão tornando a vida
de milhões, bilhões de pessoas cada vez mais obscuras (a mente deles é obscura)
e a realidade em que vivemos em algo muito sinistro.
Como
não mandam na realidade, mas, com total (fatal) manejo dos recursos de poderio
incontrolável, tornam nossa realidade desconexa dos valores humanos, sociais,
ambientais. Como são absolutamente incapazes de domar a lei da gravidade,
tornam nossa realidade uma distopia das mais graves que a Humanidade já
conheceu.
Não
conseguem dominar a realidade (as condições objetivas da Humanidade) e nem, por
completo, nossa subjetividade, porém, de tanto tentarem, destruindo, atacando, todos
os sinais e suportes de vida, acabam por nos relegar isso que chamamos de
Sinistralidade societal.
Em sua
loucura individual e social, os bilionários e trilionários (absolutistas) dissolvem,
com sua Sinistralidade societal, as condições objetivas e as subjetividades
humanas, tanto quanto destroem as condições ambientais de suporte da vida – não
só humana – no planeta.
Em
tempo: é muito provável que essa Sinistralidade societal não seja uma invenção,
uma moda pós-moderna. É bem provável que tenha a idade do capital – que é
anterior ao capitalismo, bem anterior aos irmãos de José quando o venderam como
escravo. No entanto, nunca o capital teve o poder de destruir toda a vida no
planeta. Agora tem. E outro aspecto que diferencia completamente nossos “tempos
sombrios” é a inversão completa que demos ao significado de fortuna: na
renascença europeia, a Fortuna era entoada como “valor contra o furor”, a ira,
o poder de fazer o mal. Isso está assim nos versos de Petrarca e nas máximas de
Maquiavel (que nunca foi maquiavélico como Elon Musk e seus pares). Hoje, a
fortuna é a extrema riqueza de meia dúzia de indivíduos capazes de destruir o
planeta inteiro para concretizarem suas perversas ambições.
Enfim,
podemos dizer que a Sinistralidade societal é letal, devastadora, sombria, sinistra
(uma aberração imoral, antissocial), macabra (anti-humana), bizarra
(alucinógena), porquanto seja uma alucinação com o poder absolutista.
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