Sexta-feira, 27 de janeiro de 2023 - 14h12
Vinício
Carrilho Martinez
Professor Associado da UFSCar/SP
Head of BRaS Research Group –
Constitucional Studies and BRaS Academic Committee
Member
https://youtube.com/c/ACi%C3%AAnciadaCF88
Vandalismo
ou Terrorismo? Essa questão não é justa. São questões, formulações
completamente diferentes. Podem, em certo grau provocarem o mesmo efeito ótico,
visual, sensorial, algumas reações assemelhadas em que as vê ou fica sabendo. Porém,
são situações (crimes) completamente diferentes.
Um grupo de pessoas que invade uma
escola pública e vandaliza o local, comete atos danosos, reprováveis e crimes
contra o patrimônio público. Um jovem que, por “diversão”, picha os muros dessa
mesma escola – muitas vezes com palavrões ou até “apologia ao crime” (aqui,
comete outro crime) – faz, sim, vandalismo e danifica o patrimônio público.
Quer dizer, por várias razões até inconcebíveis, esse indivíduo, com seu ato,
agride à sociedade e ao Estado.
Por piores que sejam essas ações e
outras, como passar trote nos serviços de atendimento e de socorro ao público,
como Polícia Militar e Corpo de Bombeiros, essas condutas não se tipificam como
Terrorismo. As leis são diferentes, a reação do Poder Público é diferente. Mas,
por que? Muitos perguntam. Porque as intenções, os objetivos e os danos
provocados (ou a serem alcançados) são diversos.
Vandalismo e Terrorismo estão em categorias criminais
(quanto ao bem protegido: o prédio da escola por exemplo) ou em prateleiras
políticas distintas – enquanto o Bem Maior a ser protegido; neste caso, seria
um conjunto de bens e de valores sociais e institucionais: Estado, Democracia,
Cidadania, Constituição.
Muito grosso modo, podemos dizer que o
vândalo quer atingir a sociedade, e ataca o prédio da escola. O terrorista quer
atingir de morte essa mesma sociedade e traça como meta alcançar o poder do
Estado, para, exatamente, impor-se ao conjunto da sociedade, subjugando-a,
dominando-a por completo. Muitas vezes o vandalismo tem o único propósito de
chamar a atenção, enquanto o terrorista chama a atenção por meio da violência,
da morte planejada. Todo terrorista está para um homicida, digamos assim, ao
passo que o vândalo está para o/a inconformado/a.
No Brasil, esse país em que a escola
pública é vandalizada, a educação mal chega às classes e segmentos mais pobres
e, quando chega, é precarizada. Daí que, ao se propor a dúvida inicial
(Vandalismo ou Terrorismo?), já se apresenta a confusão cotidiana e a
“transformação” dos atos terroristas (8 de Janeiro) em vandalismo. O povo
repudia a destruição do 8 de Janeiro, porém, a associa ao vandalismo (aquele do
ataque à escola pública). E isso não está correto.
É correto sim, obviamente, repudiar
todo o acontecido no 8 de Janeiro. O equívoco está se tratar o assunto como
“mero” Vandalismo. Afinal, o que se deu no 8 de Janeiro foi Terrorismo. E assim
deve ser encarado pelas instituições do Estado de Direito, aplicando-se as
penas mais duras previstas na lei. Que se faça valer o Império da Lei contra os
terroristas, todos e todas, os ativos e os financiadores, colaboradores. Essa é
a premissa da própria Lei Antiterror.
Se assim é, ou deveria ser, por que se
faz essa confusão?
Podemos pensar em muitas hipóteses, mas
uma ocorre por meio da história social e criminal: nós já tivemos, entre nós,
um denominado “crime de vadiagem” (KOWARICK, 1987). Por meio desse
instrumento, o Estado reprimia, prendia – mantinha preso, sem julgamento (e
como tem isso hoje ainda...) – qualquer pessoa “suspeita de vadiagem”, de não
fazer nada ou de, na vadiagem, estar “tramando algum outro crime”. Essas
“suposições legais” são abjetas, tanto hoje quanto foram ontem. Ninguém pode
ser julgado(a), condenado(a), preso(a), sem provas reais, lícitas. Ninguém pode
ser ameaçado(a) por ninguém, muito menos por agentes públicos que se baseiam em
“suposições”, “fortes convicções”. Afinal, nisto aqui, já se incorreria em
muitos outros crimes – a começar do “crime de ameaça”.
Com esse tal “crime de vadiagem” a
guiar o Poder Público – os policiais até hoje pedem para ver a Carteira de
Trabalho (e não a Identidade) –, o povo acabou submetido por essa avalanche de
punições racistas (claramente negros pobres, recém saídos da escravidão) e
também isso forjou uma cultura punitivista para quem “não-trabalha”. Criou-se,
propriamente falando, uma cultura que acabaria por “nivelar tudo por baixo”:
não devemos tolerar os vândalos, “bando de desocupados” – brada a cultura
popular e elitizada.
Neste sentido, os terroristas do 8 de
Janeiro foram repudiados como vândalos. E na verdade são os piores terroristas
que o país já viu, em toda sua história política.
Temos outros casos, exemplos, mais recentes em que a
população repudiou o Vandalismo: a quebradeira infanto-juvenil de 2013 é um
ícone unanimidade negativa. O seu contrário foi em 2015, com a ocupação de
escolas públicas por jovens esclarecidos e organizados, a fim de que essas
unidades escolares não fossem fechadas pelo Governo do Estado. Esse movimento
ganhou enorme simpatia popular, até hoje move os melhores sentimentos em defesa
da escola pública.
...
Referência
KOWARICK,
Lúcio. Trabalho e vadiagem: a origem do
trabalho livre no Brasil. São Paulo : Brasiliense, 1987.
A ciência que não muda só se repete, na mesmice, na cópia, no óbvio e no mercadológico – e parece inadequado, por definição, falar-se em ciência nes
A Educação Constitucional do Prof. Vinício Carrilho Martinez
Introdução Neste texto é realizada uma leitura do livro “Educação constitucional: educação pela Constituição de 1988” de autoria do Prof. Dr. Viníci
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