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A QUEDA DE UM REITOR: UMA SAÍDA DIGNA


Júlio César Barreto Rocha
Universidade Federal de Rondônia, UNIR
Núcleo de Ciências Humanas
Departamento de Línguas Vernáculas
Campus Universitário José Ribeiro Filho
BR 364, Km 9, 5
76900-970 – Porto Velho – Rondônia
Pessoal: (69) 8404-1989

 

A QUEDA DE UM REITOR: UMA SAÍDA DIGNA

Júlio César Barreto Rocha*

Não é comum, mas conforme nos entusiasma a crescente tomada de consciência do povo brasileiro, o gestor público que desvia recursos, que seja responsável por tergiversar acusações de malversação de verbas, reorienta-as para velhacarias, remunerando, algumas vezes, um séquito de pilantras, acaba indigitado pela Polícia Federal, obstaculizado pelo Ministério Público ou mesmo termina o seu caminho do crime em algemas, tal como tem ocorrido em meia dúzia de casos famosos, juízes afastados, ministros exonerados, assessores processados ou, afinal, na terminologia da Controladoria-Geral da União, “servidores públicos expulsos” dos seus cargos devido ao conluio com quadrilheiros de plantão, carrapatos do dinheiro alheio, corja sempre aos pés do poderoso de turno.

No âmbito das universidades públicas, ainda é muito raro haver a queda de um reitor pelo motivo de apropriação indevida de recursos públicos para o benefício pessoal e de sequazes. Em Brasília, um reitor conhecido por frequentar senadores e deputados federais, inclusivamente o próprio Presidente da República em diversas gestões, foi um dia acusado de desvio de finalidade na decoração luxuosa de um apartamento. Coisa banal, pensaram alguns.

Trata-se do ex-reitor Timothy Martin Mulholland, flagrado desfrutando da reforma de um apartamento de luxo em nome de Fundação Privada de Apoio à Universidade de Brasília. Banheira suntuosa e decoração requintada fotografada e difundida na internet, ele afirmou nada mais ser o fato do que uma simples utilização de dinheiro “que deixara de ser público”, uma verdade relativa no tema das fundações do tipo.

Pelo sim, pelo não, a fatia consciente, retrofalada, do povo brasileiro efetuou um levantamento detido e afinal realizou diversas manifestações. Docentes e discentes um dia ocuparam a Reitoria, e em seguida a sensibilidade política dos gestores do MEC e do Governo Federal, dada a vitrine acadêmica estar bem ao lado da Capital do Poder Constituído, sugeriu que a melhor solução seria a renúncia, uma saída condigna.

Na UNIR temos caso semelhante de um servidor público acusado –a despeito de que, em Rondônia, temos ainda apoio aberto de políticos a esse reitor e caminhamos para uma saída nada dignificadora para o nosso Estado. Tememos mesmo um banho de sangue, conforme um docente ligado à Reitoria afirmou com descaso e descaro hoje pela manhã, tomando café na sede da ADUNIR.

Nem vou comentar esta atitude de deboche, até porque muitos de nós, docentes, discentes, mães e pais de família, além de dirigentes responsáveis, atiramo-nos diversas vezes de madrugada, receosos, ao prédio da UNIR-Centro, horrorizados com a possibilidade insana de algum desfecho atroz.

A insensibilidade no nosso dia é moeda corrente. Combatem quem luta pela ética. Renegam e querem espancar aqueles que se negam a compartilhar o consabido da corrupção que mais tarde somente trará perdas sociais. Evitar concessões à corrupção é o interesse dos nossos discentes! Eles são herois do seu tempo!!

Não comento mas copio, abaixo, um modelo de saída –digna, diga-se, dentro do possível–, que foi a modalidade escolhida pelo reitor da UnB, ao assinar uma Carta ao Ministro de Educação no dia 14 de abril de 2008.

Este nosso texto, sinceramente, pleiteia uma saída suficientemente digna, de modo que a harmonia desconsiderada pelo Professor no exercício da reitoria, neste primeiro mês de greve, e a imperdoável ameaça intransigente a pairar sobre a cabeça dos nossos discentes, ou a desconsideração simples ao ano letivo e às conquistas da nossa comunidade acadêmica, não possam ser atiradas ao vento, destruição da Universidade Federal de Rondônia bem aí, no nosso horizonte.

Esperemos também que os políticos que apoiam o reitor da UNIR possam safar-se deste peso, pensem na nossa continuidade administrativa e tornem mais fácil a transição a um modelo de aproveitamento dos excelentes projetos que a nossa Academia –malgrado a péssima gestão da administração superior– poderá executar em parceria com aqueles da bancada que sempre nos têm apoiado.

Abaixo a Carta de Renúncia do então Reitor da UnB.

* O autor do texto acima, Doutor em Letras pela UFRJ e em Filologia Portuguesa pela Universidade de Santiago de Compostela, onde lecionou, é Diretor do Núcleo de Ciências Humanas da UNIR, onde se graduou em Direito. Quem queira saber dos “Termos da Sucessão” ocorrida com a UnB poderá me solicitar ou consultar no Portal da UNIR (enviarei à nossa Assessoria de Comunicação, que a publicará se recordar que não maneja um Blog do Reitor) ou no Blog do Comando de Greve (se aceitarem ali, espaço, creio, bem mais democrático hoje).

 

Brasília, 14 de abril de 2008.

Sr. Ministro,

Como é do seu conhecimento, os acontecimentos recentes na Universidade de Brasília em muito dificultaram o andamento normal da instituição. Como muitos outros colegas, vejo com tristeza a universidade a qual sirvo como professor há 32 anos ter as suas atividades interrompidas em um momento tão importante, quando projetos da maior importância para a UnB e para o país estão em pleno andamento, com vigor e ânimo.

Refiro-me particularmente às propostas de democratização do ensino superior apresentadas pelo Governo Federal, que a UnB e a sua atual administração souberam entender e incorporar como suas.

Como Vossa Excelência bem sabe, a UnB encampou com entusiasmo as iniciativas do Presidente da República para a universidade, tais como a expansão de oferta do ensino superior, a Universidade Aberta do Brasil, o Reuni, as obras nos diversos campi. Tenho orgulho de ter sido o vetor da sua materialização no Distrito Federal.

É em nome da continuidade desses projetos, que são maiores do que uma administração, Sr. Ministro, que renuncio, nesta data, ao cargo de Reitor da Universidade de Brasília, que honrei desde o primeiro momento em que exerci e que constitui na maior honra a que pode almejar um professor da nossa universidade.

Faço-o, Sr. Ministro, porque entendo que a minha presença à frente da Administração Superior da Universidade de Brasília pode comprometer estes importantes projetos do Governo Federal e da nossa universidade, que assumi como meus e que tenho a convicção que Vossa Excelência saberá conduzir com sabedoria e serenidade.

Deixo o cargo de Reitor, Sr. Ministro, com a certeza de ter cumprido com o meu dever de professor, cidadão e servidor público, na defesa dos maiores interesses da minha universidade e do meu país. Deixo o cargo de Reitor com a certeza e a tranqüilidade de que a verdade prevalecerá no que tange a acusações que foram feitas contra mim e contra a minha administração.

Deixo o cargo de Reitor com a certeza de que Vossa Excelência compartilha dos ideais do fortalecimento da universidade pública para todos, independente de raça, credo e posição social, nos termos da Constituição Federal que inspiraram o meu trabalho ao longo da minha vida acadêmica.

Ao agradecer o apoio que sempre dispensou durante o tempo em que exerci o cargo, de Reitor da Universidade de Brasília, solicito deferimento e me coloco à sua disposição.

Timothy Martin Mulholland

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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