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Gente de Opinião

Antônio Cândido

POVO DE MEMÓRIA CURTA


 
Lembro-me perfeitamente do final de mandato do Presidente Sarney, a inflação incontrolável, a moeda que não valia nada e do administrador financeiro desse caos, o então Ministro Delfim Neto sendo entrevistado na televisão quando a repórter fez-lhe a seguinte pergunta: 

— Ministro o senhor pretende continuar na política? 

— Claro – respondeu Delfim. 

— E o Senhor acredita que depois da situação em que está a economia o Senhor conseguirá se eleger? 

— Claro. O povo tem memória curta...

Delfim Neto foi eleito na eleição seguinte, dois anos depois, e em todas que se candidatou depois desse episódio, geralmente foi e é consultado sobre os rumos da economia e dá opiniões sobre aquilo que ele não conseguiu fazer.

Aqui, na aldeia Karipuna, essa fraqueza de memória vem acompanhada de ignorância histórica, interesses particulares e puxa-saquismos, quando se trata de atropelar as leis para nomear os espaços públicos, dando-nos a impressão que a vida da aldeia tem meia dúzia de luas de idade, e qualquer um que tenha chegado à reserva a partir de 1980, se considera um pioneiro, um trazedor de progresso e de cultura, merecedor, portanto, de todas as homenagens, inclusive o direito de ser tuxaua.

Disse certo político que, “no Brasil, leis e donzelas existem para serem violadas,” o que diz bem do respeito que o nosso povo tem com relação ao que existe para garantir o que é direito ou dever, certo ou errado na vida de um povo.

Com tantos problemas gritando por uma legislação na nossa terra, os nossos políticos ficam a legislar sobre legislação existente, dando a impressão que o “revogue-se as disposições em contrário” é o meio legal para que uma lei possa ser atropelada.

Falo de um projeto de lei que circula na Câmara Municipal instituindo a obrigatoriedade (para ficar somente no que é nosso), de se cantar o Hino do Município de Porto Velho nas escolas municipais. Se aprovado, será mais uma legislação sobre o assunto, enquanto para os demais hinos existe a Lei Federal nº 5.700, de 1º de setembro de 1971, que já traz esta obrigatoriedade.

A lei N. 249, de 11 de outubro de 1983, que instituiu os Símbolos Municipais, no seu Capítulo IV, determina:

Art. 8º - O Poder Público Municipal tomará as providências necessárias para que seja mantida uma coleção completa de exemplares-padrões dos Símbolos Municipais, a fim de servirem de modelos obrigatórios para a respectiva feitura, constituindo o instrumento de confronto para a aprovação dos demais exemplares.

Art. 9º - Os exemplares da Bandeira Municipal e do Brasão Municipal não podem ser colocados à venda sem a identificação discreta do fabricante e data de sua feitura.

Art. 10 – É obrigatório nos estabelecimentos de ensino de 1º e 2º Graus, no território do Município de Porto Velho, o ensino do desenho e do significado da Bandeira Municipal, do Brasão do Município bem como do canto e interpretação da letra do Hino Municipal.

Em verdade, o que precisamos não é de uma lei, e sim, cobrar do Executivo Municipal o cumprimento da Lei, o que é obrigação do Legislativo Municipal.

Eu, 1983, tive a felicidade de ver o Brasão e a Bandeira do nosso Município, por mim criados, serem os escolhidos para simbolizarem a nossa terra. Lembro da concorrência e de quanta pesquisa e estudo eu tive que fazer para chegar a algo que representasse a história desta terra e do seu povo.

Quanta tristeza eu sinto hoje quando ao passar ou visitar os órgãos públicos, inclusive a sede da Prefeitura e da Câmara Municipal e vejo principalmente a Bandeira de Porto Velho, mutilada nas suas cores, nas suas normas de feitura e nos princípios de heráldica.

O que precisamos é de legisladores que não fiquem criando leis para mudar ou dividir homenagens, prestadas a pessoas que mereceram como acontece com os nomes de ruas, como quando um vereador fez isso para homenagear o próprio pai, ou quando alguém pretendeu mudar o nome da Rua Álvaro Maia, porque o ilustre alienígena, propositor da mudança, em defesa do seu projeto, argumentou: Quem é esse Álvaro Maia?

Será que as pessoas sabem onde fica a Avenida Juscelino Kubitschek? 

A Praça Mal. Rondon, transformada em Praça do Baú? 

A Praça Aluízio Ferreira, hoje conhecida como Praça do Porto? 

Onde Começa a Rua Joaquim de Araujo Lima? 

Onde termina a Rua Bolívia e começa a Rua Vespasiano Ramos? 

Onde começa a Avenida Jorge Teixeira? A John Kennedy? Ou agora devem 
ser conhecida por BR- 364? 

Quem foi Mãe Esperança? 


O desconhecimento da história regional e pior ainda, a falta de interesse em conhecê-la, tem dado oportunidade para essas irregularidades onde os responsáveis pela Casa de Leis não conhecem as leis criadas pela própria Casa, ou como o caso de um Governador, no centenário de Aluízio Ferreira que começou o seu discurso dizendo que: “não podia falar de Aluízio Ferreira porque quando ele aqui chegou Aluízio já tinha morrido...”

Nas Escolas, é fato comprovado, os alunos não conhecem a história das pessoas que deram nome aos colégios em que estudam. Ninguém lhes ensina (porque dá trabalho pesquisar) quem foi José Otino de Freitas, João Bento, Joaquim Vicente Rondon, Flora Calheiros Cutrim, Major Guapindaia, etc.

É triste constatar na nossa reserva Karipuna que Delfim Neto tem razão. Do jeito que a coisa vai seremos um povo sem pioneiros e sem heróis, com uma história que começará, mais ou menos, a partir de 1960...1970...

Fonte: Antônio Cândido da Silva

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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