Domingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Antônio Cândido

QUE NOME SERÁ DADO AO TEATRO DA CIDADE?


QUE NOME SERÁ DADO AO TEATRO DA CIDADE?  - Gente de Opinião



 
Antônio Cândido da Silva

Tenho acompanhado a luta pela construção do Teatro da capital e agora, com maior interesse, a disputa pela escolha do nome que será dado àquela futura casa de espetáculos. 

A corrida e as opiniões para encontrar esse nome têm feito parte das colunas na imprensa falada, escrita e televisionada da capital Karipuna, e nomes interessantes têm surgido sem levar em conta, em alguns casos, se podem ou não concorrer a essa importante disputa. 

Sabe-se que a legislação do País não permite que o nome de pessoas vivas possa ser dado às ruas, praças, travessas, becos, prédios públicos etc. o que já eliminaria um nome de peso, o de Dona Labibe Bártolo, defendido e cantado com muita justiça em prosa e verso pelo colunista Silvio Santos

Quando começou a construção, isso no governo Raupp, o deputado Heitor Costa encaminhou e fez aprovar o nome de “Sérgio Valente” para identificar o teatro da cidade, através da Lei Estadual nº 802/99, de 10.05.99. 

Aqui, por ignorância ou desconhecimento da história (geralmente os dois juntos) tudo é feito à revelia, atropela-se as leis existentes, muda-se nome de ruas, de praças, impõe-se nomes como o de “Mãe de Esperança” a uma maternidade sem saber se a “Mãe” chegou, pelo menos, a ser mãe ou se ficou somente na “Esperança.” 

Caso a Lei citada seja mais uma das muitas que já foram jogadas no lixo, e se resolva escolher outro nome para paraninfar o nosso Teatro, eu quero deixar registrada a minha colaboração e que, pelo menos agora, seja escolhido o nome de uma pessoa que pelo seu trabalho, dedicação e amor tenha deixado marcas indeléveis em benefício da arte teatral no nosso Estado.

Jango Rodrigues é um nome lembrado e defendido pela classe artística, segundo a coluna Cultura do O Observador. Jango fez parte do grupo que iniciou em 1978, o movimento denominado pelos participantes de a segunda fase do teatro em Rondônia. 

Jango Rodrigues faleceu em acidente de trânsito, em Brasília, e embora tenha feito um trabalho que merece elogios, por parte daqueles que conviveram profissionalmente com ele, há de se convir é um nome a ser repensado em virtude do pouco tempo e do rápido trabalho em prol do teatro. 

Chicão Santos escreveu “História do Teatro em Rondônia” e faz um bom trabalho com relação à “segunda fase” do teatro em Rondônia, isso, a partir de 1978, o que representa muito pouco se levarmos em conta que os saraus fazem parte da história karipuna desde os primórdios do Século passado. 

Os padres e freiras salesianos foram grandes incentivadores do teatro estudantil e no auditório do Colégio Maria Auxiliadora, em datas festivas predeterminadas, principalmente nos finais de ano, se podia assistir a grandes espetáculos com danças, teatro e poesias, inclusive com apresentações dos alunos do colégio Dom Bosco, naquele auditório. 

O incentivo ao teatro dado por esses religiosos teve início com a chegada do Padre Antônio Carlos Peixoto, em 9 de novembro de 1926, para iniciar os trabalhos da Prelazia de Porto Velho e perdura até os dias de hoje, em datas festivas, no Instituto Laura Vicuña. 

Paulo Mourão e outros fizeram a “preliminar” de muitos artistas famosos no Cine Teatro Resky, na década de 50 e 60, do Século passado, isto, apenas para lembrar que naquele cinema o público também se deleitava com grandes apresentações. 

São muitos os nomes que poderão ser lembrados, como por exemplo: Luis Antônio de Araujo Silva (Luiz da SATED), um briguento, literalmente, no bom sentido, em defesa do teatro e de um lugar para apresentações teatrais. Faleceu sem ver o seu sonho realizado, mas, com certeza, feliz por ter visto a retomada da construção do Teatro da nossa capital. 

Xuluca (não sei o seu nome) é outro nome que merece ser lembrado. Morreu afogado na cachoeira de Santo Antônio, na tentativa de salvar o último de seus alunos quando o barco em que passeavam, virou na águas traiçoeiras do rio Madeira. Salvo engano, Xuluca foi o pioneiro em trabalhos com teatro de Bonecos, ou no mínimo, um de seus maiores incentivadores. 
QUE NOME SERÁ DADO AO TEATRO DA CIDADE?  - Gente de Opinião

Abrigo dos Vicentinos em Porto Velho/DESBRAVADORES


Porém, sempre existe um porém, eu quero registrar o nome de uma pessoa que há muito caiu nas gavetas do esquecimento, mesmo para enriquecer a história do teatro em Rondônia, já que o nosso amigo Chicão Santos não o conheceu. 

Trata-se do Padre Miguel Ângelo Carneiro Bastos, um verdadeiro professor Pardal, que palmilhou essas terras nos anos de 1950, e faleceu a pouco tempo na cidade de Humaitá-AM, após colaborar por mais de 50 anos com a congregação salesiana da qual fazia parte, em prol da juventude, nas cidades da Amazônia.

Padre Miguel era polivalente. Fabricava, artesanalmente, com a ajuda dos moleques da minha época, trens de madeira (tipo tobogã atual) instalados no pátio da catedral, nos quais descíamos por mais de trinta metros até a Rua Dom Pedro II, tudo devidamente lubrificado com o que restava das velas acesas nos ofícios da igreja. 

O primeiro carrossel que conheci também foi feito por ele no pátio da Matriz, com a ajuda valiosa de alguns funcionários da oficina da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, movido à força do braço, onde nunca aconteceu um acidente, porque tudo era devidamente observado e a manutenção era feita pelo próprio inventor. 

Quem passa na Rua Tenreiro Aranha com Paulo Leal, certamente vai ver o Asilo ou Abrigo dos Velhinhos, hoje mantido pelo governo do estado, com assistência social e tudo mais. 

Poucas pessoas sabem que aquela construção hoje ampliada e reformada, foi erguida pelo Padre Miguel que fabricou os tijolos de blocos de cimento onde hoje está situada a livraria Paulinas, e com a ajuda da meninada, transportados para o local da construção em carros de mão feitos de madeira e com rodas de ferro fabricadas na oficina da ferrovia. 

Os recursos foram conseguidos com mensalidades da Associação de São Vicente de Paula, por ele criada, e que só mesmo com ajuda divina, foi possível manter por muito tempo aquele abrigo. Depois passou a ser administrado pelo Lions Club e, finalmente, pelo governo do Estado. 

Mas o que tem isso a ver com o nome do nosso Teatro? 

Foi justamente no teatro que Padre Miguel deixou a sua marca ao construir, literalmente, na esquina das Ruas Carlos Gomes e Gonçalves Dias, aonde hoje funciona uma papelaria, o “Teatrinho do Padre Miguel”, assim chamado carinhosamente pelos frequentadores. 

QUE NOME SERÁ DADO AO TEATRO DA CIDADE?  - Gente de Opinião

Santa Missa celebrada pelo Pe.Miguel A.C.Bastos entre um grupo de pessoas contempladas e amparadas pela assistência social da Prelazia de Porto Velho/DESBRAVADORES

Essa “casa de espetáculo” não conhecia luxo: paredes de madeira de segunda, sem pintura; cobertura de zinco cheio de furos; piso de “concreto magro” que de tão magro parecia mais esquelético; bancos corridos de tábuas de segunda sem acabamento e sem encosto e por aí vai. Chamava a atenção à iluminação elétrica que não tinha bocal, e a parte rosqueada das lâmpadas eram retiradas e os filamentos ligados diretamente na rede elétrica, artifício encontrado para evitar o roubo das lâmpadas. 

As peças teatrais eram ensaiadas por Dona Eva, que morava na Rua Almirante Barroso sub-esquina de Mal. Deodoro, e apresentadas depois do convite feito após as novenas de domingo.

Assisti no Teatrinho do Padre Miguel a todos os filmes de Charles Chaplin, o Carlitos, filmes protagonizados por Alan Ladd e lembro-me dos filmes Ivanhoé, A Paixão de Cristo, do seriado Correios do Sul, e por aí vai. 

Participei de algumas “peças” teatrais e declamei muitas poesias de Olavo Bilac e Casimiro de Abreu no palco famoso daquele Teatro. 

Como Padre Miguel conseguia fazer tudo isso e ainda dar aula é uma pergunta que não sei responder. Ele era um sonhador e usava a fé para realizar os seus sonhos, acreditava que era possível e apenas isso lhe bastava... 

Lembro-me que quando ele entrava na sala de aula, a primeira coisa que fazia era escrever três letras no ângulo esquerdo superior do quadro negro: j m j (Jesus, Maria e José), depois disso tudo era possível...

Nota- As fotos inseridas neste texto foram digitalizadas do livro Desbravadores Vol II, de Vitor Hugo

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoDomingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

ASSASSINOS DA NOSSA HISTÓRIA - A ORIGEM

ASSASSINOS DA NOSSA HISTÓRIA - A ORIGEM

Estou escrevendo o meu sexto romance entre os meus treze livros já escritos e, “Nas terras do Até que Enfim,” retrata a ocupação do antigo Território,

NA NOITE DE NATAL

NA NOITE DE NATAL

          Antônio Cândido da Silva. Na minha infância de menino pobre deixava meus pedidos na janela que eram feitos pra Papai Noel durante minhas noi

PORTO VELHO — SETENTA ANOS DE CUMPLICIDADES

PORTO VELHO — SETENTA ANOS DE CUMPLICIDADES

  Antônio Cândido da Silva   Estou a caminho de completar setenta anos que cheguei a Porto Velho, no distante ano de 1945. Vinha do Seringal Boa Hora,

CANHOTOS UNIDOS, JAMAIS SERÃO VENCIDOS!

CANHOTOS UNIDOS, JAMAIS SERÃO VENCIDOS!

          Antônio Cândido da Silva           Como estamos em tempos de igualdades, de reivindicações das minorias, de indenizações pelo que os nossos

Gente de Opinião Domingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)