Algumas incongruências insistem em açular a curiosidade geral em dois rumorosos casos policiais recentes, aqui e alhures. A primeira a incomodar o raciocínio lógico é a anunciada inocência do presidente da Assembleia, Hermínio Coelho, nas denúncias de corrupção na proposta, gestada no governo de Ivo Cassol, de favorecimento das hidrelétricas do Madeira com isenção de impostos estaduais. O esquema, denunciado pelo ex-presidente Valter Araújo em busca de se livrar da cadeia através da delação premiada, atinge indiscriminadamente todos os deputados, acusados de receber R$ 1 milhão por cabeça para aprovação do projeto. Todos menos Hermínio. Dá para acreditar?
Outra delas envolve um caso de grande comoção nacional: o assassinato do garoto Bernardo Boldrini pela madrasta, que agora diz que a morte foi acidental, segundo matéria publicada em Veja desta semana. Também aí o noticiário deixa no ar uma dúvida. Não a respeito desse crime, mas relacionada à morte da mãe do menino, Odilaine Uglione, um suicídio curiosamente ocorrido quando também ela se preparava para colocar as mãos, após a separação oficial, em parte dos bens do então marido, o médico Leandro Boldrini. “Sigam o dinheiro” – recomendam os filmes policiais.
É exatamente esse o caso em ambas as mortes. Pouco antes de morrer, Bernardo pediu à promotora Dinamárcia Maciel de Oliveira que o entregasse à guarda de outra família, o que, se efetivado, tiraria do domínio do médico a herança da ex-esposa. Mas ela preferiu dar uma chance ao pai do garoto e o resultado foi a morte de Bernardo pelas mãos da madrasta, Graciele Boldrini que, segundo a Polícia, sepultou o menino em uma cova aberta dois dias antes da “morte acidental”. Não seria o caso de uma investigação mais cuidadosa do até agora suicídio de Odilaine?
Uma verdade incontrastável, todo o mundo sabe, tem o poder de oferecer credibilidade a dez mentiras que dela se fazem acompanhar. Da mesma forma, uma única mentira identificável pode comprometer dez verdades sobre um mesmo assunto. No caso da delação premiada pretendida por Valter Araújo, se confirmado o que se publicou a respeito, pode tirar o valo das informações e mantê-lo em cana. Porque, afinal, ele haveria de inocentar o sucessor, que era seu vice-presidente na mesa diretora e acabou herdando o espólio, em um raro caso de condenação da caçamba pela água turva da cacimba e inocência da corda que a trouxe de lá.
É sabido que HC, reconhecidamente maluco, não rasga dinheiro, embora ele mesmo admita gostar de um carteado. Por isso ninguém que o conheça irá engolir a história de que ficou fora na partilha da propina parlamentar distribuída pela aprovação da isenção concedida às usinas. É uma mentira com poder de colocar sob suspeita toda a credibilidade da confissão de Araújo. Para confirmar isso, basta ouvir a voz dos corredores daquela Casa. E quem sabe seguir o dinheiro, como recomentam os filmes.