Sábado, 10 de agosto de 2024 - 08h05
Seguem observações cotidianas. Ando pelo mundo
prestando atenção em tudo, cantarolando mais do que em cores e nomes, como na
música Esquadros, de Adriana Calcanhoto, embora ela relate também muito do que
também vejo e sinto.
É incontrolável, e natural, da minha personalidade, e creio
até que é muito por isso sigo no jornalismo há tantas décadas, e escrevendo
contando as impressões. Isso me vale um enorme cansaço no fim do dia. Meu
irmão, brincando, até briga comigo: me chama de síndica quando observo as mínimas
mudanças por aí, ao redor, algumas pequenas, que poderiam até ser consideradas
desimportantes. Para mim, não são. São transformações, mudanças, progresso ou
ruínas, lascas profundas na memória, e explicações ou comprovações.
Comportamentos a serem registrados.
Observo, mentalmente meus olhos captam tudo ao redor,
sempre fui assim, o que me garantiu várias vezes a sobrevivência em situações
de risco. Sempre de alguma forma ligada, vendo, aliás, também ouvindo,
pensando, anotando mentalmente o mundo passar na minha frente, tentando
entender. E eu - e todos nós - caminhando nele enquanto gira, cada vez mais
rápido, vertiginoso. Ciclos que vêm e vão com mais assiduidade do que as ondas
que não vieram e frustraram muitos surfistas agora no Taiti, onde disputavam a
Olimpíada.
Creio que as pessoas não deviam estar tão distraídas como
muitas que noto, absortas em telas, na vida dos outros, em questões menores
enquanto as principais podem afundá-las. É difícil, por exemplo, até sem
querer, você ouvir a conversa de mais de duas pessoas e elas não estarem
fritando uma outra que não está presente, e que onde estiver sua orelha
esquerda deve ficar em chamas.
Mas nem tudo é para o mal, e apresento a maior novidade do
momento que tenho reparado, no meio de tanta intolerância: a volta de uma certa
gentileza; digo certa porque ainda não é generalizado. Mas mais gente que cruzo
no caminho dá um sorriso, um bom dia, uma boa tarde. Dá licença. Para o carro
na faixa para que os pedestres atravessem. Busca ser solidário em algo, ser
necessário, dá atenção. Acho que começa uma reação ao muito que perdemos de
qualidade de relacionamento durante a pandemia. Mesmo estando bem ciente que há
uma grande loucura no ar, e cada vez sabendo mais de gente “normal”
surpreendendo e tendo atitudes e reações absurdas, algumas violentas, e
incontroláveis.
Tenho sabido, por outro lado, também de um número bem
significativo de pessoas maravilhadas com uns remedinhos esquisitos para
emagrecer. Ozempic, Wegovy, Monjouro; deve ter outros, e chegar mais porque
rentáveis, ah, lá isso são. Todos muito caros, coisa para quem pode comprar,
importar, conseguir por algum meio. Estão na moda. São indicados para diabetes,
mas usados por quem não tem esse mal, doença terrível que conheço bem porque
perdi minha mãe com ela. Na época, o máximo que tínhamos – e eu importava com
muita dificuldade - era uma medicação alemã de liberação prolongada de
insulina, o Lantus, hoje já no mercado e mais acessível.
Comento porque já vi desastres com modas como essa. Adolescente,
quase pirei na época pré-vestibular com a indicação médica – e ele era bem
conhecido: um tirava o apetite e ligava; outro, desligava. Como um interruptor.
Parei a tempo. Teve quem não conseguiu.
Hoje, dizem, esses modernos ligam, deixam as pessoas se
achando mais inteligentes e capazes; pior, sendo associados a outras drogas
indicadas para quem tem TDAH, Transtorno do Déficit de Atenção com
Hiperatividade. Devo informar que estão espalhadas no mundo artístico,
empresarial e político, entre as pessoas que comandam muitas vezes algo que nos
diz respeito. O que explicaria até como de vez em quando somos informados de
decisões e ações fora de parâmetros, de acidentes causados por playboys em
possantes, promessas políticas feitas de dia e desfeitas à noite como
Penélopes. Uma espécie de cocaína oficializada, inclusive por muitos daqueles
que vêm batendo no peito contra a descriminalização de drogas como a maconha,
essa planta com efeitos terapêuticos comprovados.
Temos muito a observar por aí. Além da magreza.
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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação,
editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano - Bom para mulheres.
E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon). Vive em
São Paulo. marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br
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