Sábado, 29 de janeiro de 2022 - 11h13
Como se proteger de tantas coisas ao
mesmo tempo? Penso em redomas. Há muitos anos um grande cara, Fernando Portela,
jornalista, escritor e grande conhecedor das coisas abstratas, me ensinou a
imaginá-las me protegendo quando precisasse entrar em um lugar, digamos, mais
esquisito...Nunca esqueci.
Normalmente quando
pensamos em redomas, as pensamos de vidro, mas elas nesse caso em que as
criamos podem ser de vários materiais, de um invisível material, tecido mágico,
entre inúmeras tramas que nosso cérebro sabe e pode tecer, e a nossa imaginação
fortalecer. São sobre essas redomas das quais falo. Que nos envolvam
completamente nas situações que delas precisamos. Inclusive que nos protejam de
nós mesmos, que sempre nos ameaçamos e podemos ser nossos próprios e piores
algozes.
Há, claro, a redoma
mais concreta. Me sinto mais protegida ultimamente de tudo isso - e bota tudo
isso nisso, que a cada dia se ampliam mais e mais as ameaças – quando estou em
casa, que imagino como a maior proteção que alguém pode ter, sua casa, seu
canto, sua caverninha, seu buraquinho. Digo casa no sentido mais amplo e
ilimitado, e que pode ser também as barracas improvisadas que protegem as
famílias vivendo nas ruas; ou o colchão ou papelão encontrado nas caçambas, e
até o cobertor nas costas do drogado que vagueia perdido no seu mundo cão.
Todos deveriam ter direito a um telhado firme, um chão seguro, sem medo de como
três porquinhos sendo atacados pelo lobo mau não terem para onde correr.
Mas como não podemos
nos limitar, mesmo em tempos de distanciamento, temos de sair de nossos cantos,
e a cada dia está mais difícil sair e não se aborrecer antes de retornar, tanto
desequilíbrio. Nossa redoma seria como lembrar da Oração de São Jorge: “...Para
que meus inimigos, tendo pés, não me alcancem; tendo mãos, não me peguem; tendo
olhos, não me vejam. E nem em pensamentos eles possam me fazer mal. Armas de
fogo o meu corpo não alcançarão; Facas e lanças se quebrem sem o meu corpo
tocar; Cordas e correntes se arrebentem sem o meu corpo amarrar...”
As redomas etéreas,
as que imaginamos, são infinitas e ilimitadas. O legal é que você pode
floreá-las. Em determinadas ocasiões, redomas tecidas em malhas de ferro ou
aço, firmes, que possam rechaçar e repelir inclusive olhares malignos, olhos
gordos ou falsos.
Em outras, peço aos
céus e aos entes que me protegem que se unam e se fechem sobre mim, me cobrindo
e ocultando.
Há as redomas
misteriosas, podem ser de tule, com transparências e névoas que nos ocultem e
mostrem até mais interessantes para os olhares externos que para ela se voltem,
boas para procurar por aí paixões, amores, pessoas interessantes. Mais seguros
poderíamos ir nos tornando, então, mais visíveis ao interesse externo. Ou, ao
contrário, dali desaparecendo sem deixar rastros, depois das observações.
Verso sobre isso
porque, assim como aprendi a tecer esses mantos, poderia ajudar a outros, que
tentem esse mesmo tricô. E não será por falta de situações – medos,
insegurança, loucura, ameaças - que todos poderão testar alguma eficácia delas
no momento terrível em que estamos expostos a tantas poluições reais e
espirituais que tanto mal seguidamente vêm nos trazendo.
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MARLI GONÇALVES –
Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de
Feminismo no Cotidiano - Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora
Contexto. Nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon.
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