Sábado, 5 de agosto de 2023 - 09h05
Se bem que é mais papai, porque lá pelo Supremo
Tribunal Federal a gente infelizmente só tem duas mamães, entre os onze que
compõem a sua formação, Rosa Weber, a presidente que está para sair, obrigada,
vai fazer 75 anos, e Cármen Lúcia. São eles que vêm traçando os destinos não só
da Nação, como também os nossos em muitas questões comportamentais.
Que a gente acha até que um dia vai abrir o box do
chuveiro e encontrar um deles determinando algo, pode ser, tanto têm feito. Que
o STF tem passado do ponto em muitas coisas, criando encrencas, falando
verdades e exagerando outras, nos garantindo, mas batendo nas nossas mãos com
palmatórias, tentando regular muito mais do que as próprias pernas, e por isso
sendo atacado pesadamente por extremistas dessa divisão burra – necessário
dizer. Claro que é preciso estar atento e forte, porque muitas decisões que
hoje aplaudimos efusivamente de alguma forma podem num futuro se voltar contra
nós, se o tempo fechar. É preciso expressar isso claramente para o horror da
esquerda. Que há limites, especialmente para o “mandou prender”, “mandou tirar
do ar”, entre outros, que fique claro.
De outro lado, ultimamente eles parecem muito mais
próximo de nós, pobres mortais, do que eram num passado ainda, pode-se até
dizer, recente. O que se acelerou durante o governo passado, quando em inúmeras
vezes nos salvaram das mãos da ignorância e do autoritarismo reacionário e
conservador de extrema direita que ainda hoje teima em se criar e nos aborrecer
aqui e ali. Um dos ministros, Alexandre de Moraes, o que mais tem se destacado,
a ponto de ganhar apelido popular, Xandão, e memes engraçados, usados em
conversas nas redes, para o bem e para o mal, de um lado e de outro das
questões discutidas.
Só nessa semana tivemos duas notícias de lá
daqueles lados onde tudo tem indo parar. A primeira é até ridícula que ainda
estivesse sendo discutida em pleno agosto de 2023, a tal legítima defesa da
honra, a tese utilizada em casos de feminicídio ou agressões contra mulher
buscando justificar o comportamento do acusado. Carimbada agora como
inconstitucional, por unanimidade. Ufa!
A segunda notícia foi um voto até histórico do
Xandão em um julgamento que ainda vai dar muito pano para a manga – seria ao
fim uma questão de descriminalização da maconha, do uso recreativo da cannabis.
O julgamento está em 4 favoráveis a zero. Já votaram a favor, mas com
divergências pontuais, os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luis Roberto
Barroso. Mamãe Rosa Weber suspendeu a votação por enquanto, isso porque Gilmar
Mendes acha que a coisa deveria ser mais completa, para outras drogas. No caso,
se discute o porte: quanto seria legal? Quanto seria tráfico? Segundo Xandão,
além de apontar o racismo, mais negros que brancos presos, usuário seria “quem
adquirir, guardar, tiver em depósito ou trazer consigo de 25 a 60 gramas de
maconha ou seis plantas fêmeas”, bem explicadinho assim. Gritaria geral, com
esse Congresso esquisito querendo ser ele a instância a decidir. Falam até em
plebiscito.
Enfim, o que vem ao caso é como tudo agora passa
ali pelo plenário do STF, por conta disso mesmo tão destruído simbolicamente
durante a raivosa invasão dos bolsonaristas em 8 de janeiro. Os ministros
continuam mantendo presos muitas vezes quem roubou um bife, um shampoo. Mas
saiu dali também a liberação de com quem casamos, uniões estáveis,
homoafetivas, e logo estará sobre a mesa uma questão importantíssima,
fundamentalmente ligada às mulheres: o aborto, e as condições para sua
liberação, aliás leis e normas que há anos são soterradas pelos parlamentares
que fogem do tema, literalmente, como o diabo foge da cruz, por envolver
questões religiosas. Mais uma hipocrisia nacional tentando ocultar a realidade,
assim como a questão da maconha.
Só que até há pouco estavam dez ministros votando,
e chegou agora o 11º, o pálido e indecifrável Cristiano Zanin, indicado por
Lula, e de forma bastante discutível. Uma tristeza, por ser agora o mais jovem
entre todos lá, aos 47 anos, já chegando como conservador, como se definem os
que não querem mudar nada, nem mexer em vespeiros. Para ser aprovado nas
sabatinas até respondeu a perguntas sobre casamento homoafetivo, legalização do
aborto e descriminalização das drogas, se apegando à Constituição e no papel do
Congresso, que conhecemos bem qual é na discussão dos temas. Ficou na corda
bamba.
No país machista, de poder predominantemente
masculino, onde as ministras de governo cantadas em verso e prosa estão sempre
citadas primeiro em listas de trocáveis por acordos políticos, o que vai
acontecer de agora em diante? Logo, em poucos meses, Rosa Weber sai, vão virar
dez ministros de novo, e caberá a Lula mais uma indicação para completar o
quadro tão irregular, já contando com os dois homens terrivelmente indicados
por Bolsonaro.
Será o nome de mais um papai? Mais uma mamãe, uma
mulher que tanta falta faz por ali? Precisamos ficar atentos a essa família que
vive passeando em nossas casas.
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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de
comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano - Bom
para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na
Amazon). marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br
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