Com pouca arrecadação sobre seus produtos minerais e vegetais e totalmente dependente de Brasília, o Território Federal de Rondônia conheceu o fundo do poço nos anos 1960. Recordista em pouca permanência no cargo, o coronel Paulo Eugênio Pinto Guedes (PRP) ficou apenas três meses e 13 dias. Pediu para sair dois meses antes do início do regime militar, em 1964.
Estava mal o território, embora tivesse à disposição do comércio e da indústria nacionais 366 quilômetros de estrada de ferro, enquanto o Pará dispunha de 118 quilômetros – menos da metade –, o Amapá, 194, Sergipe, 270, a Guanabara (depois Rio de Janeiro), 132, e o Distrito Federal, apenas 66.
“Quando se ouvia o espocar de fogos na cidade, já se sabia de algum fato importante, especialmente, a troca do governador”, recorda o jornalista Sílvio Santos de Macedo, Zé Katraka. “O rádio contava tudo, por isso, A Voz do Brasil tinha em Rondônia um dos mais altos índices de sua audiência”, ele acrescenta.
Passado o governo do tenente-coronel aviador Abelardo Mafra e a intervenção do capitão de engenharia Anachreonte Coury Gomes, entre 1961 – ano da eleição e renúncia do presidente Jânio da Silva Quadros – e 1964 – ano do golpe militar, o Território Federal de Rondônia teve nove governadores: Paulo Nunes Leal (pela segunda vez desde o Guaporé); Abelardo de Alvarenga Mafra, Ênio dos Santos Pinheiro (pela segunda vez), Milton Lima, Wadi Darwich Zacarias, Ari Marcos da Silva, Paulo Eugênio Pinto Guedes, José Manuel da Cunha Lutz Menezes, e Abelardo Mafra, outra vez.
MILTON LIMA, CINCO MESES
O paraense Milton Lima (PTB) fora escolhido não apenas pela competência, mas por residir em Porto Velho desde a década de 1940. Ele governou de três de julho de 1962 a 12 de dezembro daquele ano.
Integrante da corrente política pele curta, ele fora diretor do Serviço de Administração Geral, e também secretário geral do Território, a partir de 1961, no quarto governo, exercido pelo coronel Ênio Pinheiro.
“Nas eleições de 1962, o caudilho Aluízio Ferreira, em pleno exercício do terceiro mandato de deputado distrital federal, anunciou seu afastamento da vida pública, dizendo: decido não concorrer e mando a política para o inferno”, conta o escritor Antonio Serpa do Amaral Filho.
“Nada mais disse e ninguém se atreveu a perguntar-lhe, mas, na qualidade de chefe político, ele pretendia manter o controle da região, por isso lançou o nome do governador, coronel Ênio Pinheiro.
O militar se afastava para concorrer às eleições à Câmara, e pôs interinamente o funcionário Milton Lima”, assinalou Serpa do Amaral. Seria exonerado em 12 de dezembro de 1962, com a derrota de Ênio Pinheiro para o médico Renato Medeiros. E aposentado do serviço público pelo governador Jorge Teixeira de Oliveira.
WADI DARWICH ZACARIAS, CINCO MESES
Paraense de Belém, Wady Darwich Zacarias (PSD) passou apenas cinco meses no cargo, de 12 de dezembro de 1962 a 27 de maio de 1963. Estava no território desde a década de 1950 e chegou ao governo por indicação do deputado Renato Medeiros e apoiado pela bancada do Amazonas.
Em 1952 assumiu o cargo de diretor de obras e serviços públicos na gestão do governador Jesus Bulamarqui Hosannah, que mandou prendê-lo, juntamente com os médicos Ary Pinheiro, Renato Medeiros e Osmar de Oliveira. Eram socialistas e incomodavam no território dominado inicialmente por seringalistas que visavam o lucro a qualquer custo.
Libertado, Zacarias rompeu politicamente com o grupo aluizista e cinco anos depois seria nomeado diretor geral da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré por decreto assinado pelo presidente Juscelino Kubistchek de Oliveira.Wady Zacarias, irmão do advogado Fouad Darwich Zacarias, primeiro presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, ficara no cargo de direção da EFMM até 1959.
“Ele era um homem de prestígio. Seu cargo na ferrovia seria elevado ao de superintendente, pois JK criara a Rede Ferroviária Federal, que também viria encampar os trilhos da Madeira-Mamoré – Rochilmer Melo da Rocha, jornalista e advogado
Em outubro de 1976, dentro de um ônibus da Viação Rondônia, Wady e outros dez candidatos a vereadores em Porto Velho “comiam a poeira” na BR-364 numa inesquecível excursão de arenistas [apoiadores do partido situacionista] entre a Capital e Vilhena, na divisa com Mato Grosso. A maioria não se elegeu, incluindo o ex-comandante da Guarda Territorial Eduardo Lima e Silva, o ex-vereador Edgar Vasconcelos, o maçom Esmite Bueno de Melo, o ex-prefeito José Saleh Moreb, o indigenista Osni Ferreira e o comerciante Manoel Bezerra.
Wady Zacarias encerrava a carreira política. O governador do território era o coronel Humberto da Silva Guedes.
ARI MARCOS DA SILVA, CINCO MESES
O primeiro tombamento dos prédios públicos territoriais e o enquadramento do funcionalismo ocorreram no governo do médico veterinário Ari Marcos da Silva (PRP), nascido em Vitória (ES).
Nomeado pelo presidente João Goulart por indicação do deputado Medeiros, ele também exerceria um curto mandato de cinco meses, entre 27 de maio de 1963 e 14 de outubro daquele ano.
Durante a gestão de Ari Marcos começaram também os primeiros estudos visando ao aproveitamento energético da Cachoeira Samuel, no Rio Jamari.
Outros estudos seriam feitos pela Eletronorte nos anos 1970, e a usina hidrelétrica iniciada em 1982, quando Rondônia fora elevada a estado, só foi concluída 14 anos depois.
Conta-se que os salários atrasaram, levando os servidores territoriais ao estado falimentar. Acusado de desmandos administrativos e de corrupção, Ari foi exonerado. Morreu em 1988.
PAULO EUGÊNIO PINTO GUEDES, TRÊS MESES
Ele veio para apagar o fogo entre cutubas e pele curtas, mas não foi além de um maçudo relatório.
Ex-chefe de gabinete do presidente Goulart, o tenente-coronel do Exército Paulo Eugênio Pinto Guedes (PRP) tomou posse em 14 de outubro de 1963 e saiu em 27 de janeiro de 1964.
O território não dispunha de recursos para executar programas mínimos, a folha de pagamento estava inchada e o precário abastecimento de energia elétrica a óleo diesel não atendia à necessidade de escolas e hospitais.
Tão complicada estava situação que o governador precisou suspender o crédito nos armazéns, levando à penúria as próprias residências oficiais dele e do secretário geral.
O que fez o carioca Paulo Guedes? Usou o seu meteórico período no poder para instaurar inquéritos administrativos e remetê-los à Promotoria Pública. Casos mais graves foram encaminhados à Polícia Civil.
Nacionalista, a exemplo do presidente Goulart, dez dias depois da posse Paulo Guedes mandou cancelar a escritura de venda e a ação demarcatória do Seringal Rio das Garças, adquirido pelo norte-americano James Bryan Choate, então representantes da empresa Galron Melhoramentos.
Desgastado, mas certo de que cumprira a missão, pediu para ir embora. Em seguida, assumiu o cargo o tenente-coronel Abelardo Mafra, que fora o terceiro governador territorial e agora seria o nono.
CUNHA E MENEZES, O 1º DA REVOLUÇÃO
Também carioca, o coronel do Exército José Manuel Lutz da Cunha e Menezes (PSD) veio sob as bênçãos do partido que em 1964 somava suas forças com o PTB no qual militou o coronel Aluízio Ferreira. “Ele andava a cavalo, usando sempre um rebenque”, conta o historiador Abnael Lima.
Carioca, ele assumiu por decreto assinado pelo presidente Castelo Branco, após o vendaval político-administrativo promovido pelo capitão Anachreonte Coury Gomes.
“A gestão Menezes marcou o fim de um ciclo político com predominância de líderes carismáticos e do poder regional exercido por cutubas e pele curtas”, analisa o historiador Francisco Matias.
Líder pele curta, o deputado Renato Medeiros teria o mandato cassado pelo Ato Institucional nº 5. Apenas pelo fato de ser adversário da poderosa corrente cutuba, que na prática dominava economicamente o território.
Cunha e Menezes quis comprar o acervo cultural com aproximadamente duas mil peças [indígenas, metais, borboletas e insetos] do médico Ary Tupinambá Pena Pinheiro, ao que ele respondeu: “O patrimônio indígena não pertence a ninguém, e sim à Nação”.
Em vez de vendê-lo, Ary doou todas as peças, que foram catalogadas e fichadas com o auxílio do ornitólogo húngaro José Idasse.
Menezes assinou o Decreto nº 434, de 26 de março de 1965, instituindo como Dia de Rondônia o 5 de maio, data de aniversário do marechal Cândido Mariano Rondon. Criou também a Ordem do Mérito com o nome dele, que é atualmente a mais alta honraria do Estado.
O coronel pediu para sair do cargo.
O BRASIL EM 1961
31 de janeiro – Jânio da Silva Quadros torna-se o 22° presidente da República, sucedendo Juscelino Kubitschek.
25 de agosto – Jânio renuncia ao cargo. O presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, assume interinamente como 23° presidente.
2 de setembro – O Congresso Nacional aprova a Emenda Constitucional n° 4, que estabelece o parlamentarismo.
7 de setembro – João Belchior Marques Goulart toma posse como o 24° presidente.
8 de setembro – O Congresso Nacional aprova a formação do primeiro Conselho de Ministros.
O BRASIL EM 1964
13 de março – O presidente João Goulart discursa em comício na Central do Brasil, no Rio de Janeiro, defendendo reformas de base e a democracia.
19 de março – Ocorre a primeira Marcha da Família com Deus pela Liberdade na cidade de São Paulo. Cerca de 500 mil pessoas pedem intervenção por parte dos militares. Dezenove sargentos indiciados em inquérito policial-militar (IPM) são condenados a quatro anos de prisão.
25 de março – Marinheiros da baixa oficialidade se revoltam contra as péssimas condições de vida e seus superiores, e apoiam as reformas de base do Presidente João Goulart. Essa revolta foi liderada pelo Cabo Anselmo, mais tarde revelado traidor.
31 de março e 1º de abril – Tropas militares se movimentam de Minas Gerais para o Rio de Janeiro. Na Costa Brasileira, posicionam-se soldados e oficiais da Marinha dos EUA. O golpe fora perpetrado.
2 de abril – Em sessão extraordinária, o Congresso Nacional declara que o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazilli, assume interinamente a Presidência da República.
11 de abril – Humberto de Alencar Castelo Branco é eleito, pelo Congresso Nacional, presidente do Brasil.
13 de abril – Ranieri Mazzilli revoga o decreto da Superintendência de Política Agrária, assinado por João Goulart no Comício da Central.
15 de abril – Castelo Branco toma posse como o 26º Presidente do Brasil, e o primeiro do Regime Militar.
13 de maio – O Brasil rompe as relações diplomáticas com Cuba.
21 de agosto – Castelo Branco cria o Banco Nacional da Habitação, para a construção de moradias destinadas à classe média brasileira.
30 de novembro – É promulgado o Estatuto da Terra, que regula direitos e obrigações relacionadas aos bens imóveis rurais.
ENTENDA A FUSÃO DE PARTIDOS
● Partido Republicano Progressista foi fundado em 1945 por Café Filho e Ademar de Barros. Devido aos resultados eleitorais muito abaixo do esperado – foram eleitos apenas dois deputados, Romeu dos Santos Vergal e o próprio Café Filho – a sigla fundiu-se com o Partido Popular Sindicalista (PPS) e o Partido Agrário Nacional (PAN) pra formar o Partido Social Progressista (PSP), em 1946.
● O PPS foi fundado por Miguel Reale e Marrey Júnior em 1945 fundiu-se com o Partido Republicano Progressista (PRP) de Adhemar de Barros e o Partido Agrário Nacional (PAN), resultando no surgimento do Partido Social Progressista (PSP).
● O PAN também foi fundado em 1945 e foi fundado pelo fazendeiro Mário Rolim Teles. Nas eleições gerais de 1945, não conseguiu eleger nenhum representante para a Câmara. Já na eleição presidencial, apresentou a candidatura de Mário Rolim Teles, que teve votação irrisória, vencendo apenas no Território Federal do Rio Branco (atual estado de Roraima). Logo depois das eleições, em 1947, o PAN fundiu-se com o PPS e o PRP, em 1947, para formar o novo Partido Social Progressista (1946), que foi o quarto maior partido do País entre 1947 e 1965, quando extinto.