Quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008 - 12h35
MONTEZUMA CRUZ
Hosana nas alturas e aleluias vêm sendo ouvidos em Mato Grosso e adjacências, por conta de uma suposta anistia do governo aos proprietários rurais que derrubaram ilegalmente áreas de floresta. Péssimo sinal. Tanto que, nesta quarta-feira, a Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados deve promover audiência pública para averiguar as minúcias dessa alardeada possibilidade.
O barulho é grande. O ex-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso, deputado Homero Pereira (PR-MT), levanta-se para assegurar que o tal perdão nesse estado campeão (junto com Rondônia) em derrubadas e queimadas não resultará em novas agressões ambientais. Ele até acredita que a proposta vai pôr fim a um conflito que se arrasta por muito tempo e permitiria a exploração sustentável da floresta.
Retorno de uma viagem de um mês ao norte brasileiro. Rondônia, por exemplo, dona do primeiro Zoneamento Agroeconômico e Ecológico do País, continua governada por um empresário simpático à causa de alguns (há exceções, claro) madeireiros gananciosos. Em Boca do Acre, no Purus (Sudoeste Amazônico), vi a grilagem desenfreada classificar o município entre os 36 maiores desmatadores do País. Em Itapuã do Oeste e Candeias do Jamari, ambos no Estado de Rondônia, visitei os arredores da primeira grande Floresta Nacional brasileira (Flona Jamari), que está disputada por oito grupos.
O fato de o projeto estabelecer a "exploração sustentável por 40 anos" me faz refletir: não chegará a uma década o tempo para que se saiba, claramente, quem pretende pôr abaixo – e queira Deus que não a Flona – os arredores desse território-cobaia. Na região central do Estado, sucessivos roubos de madeira, assassinatos de jagunços de madeireiros, sem-terra e camponeses, levam a nocaute a combalida estrutura do Ibama. Avalie-se o drama, observando-se que em diferentes casos de apreensões de madeira, os fiscais do instituto não conseguem identificar os donos da madeira. Há queixas ao Ministério Público Federal.
A motosserra vence. De Nova Mamoré às proximidades da Flona Jamari, os pátios das madeireiras estão abarrotados de toras. Com um agravante maior: o tráfico de drogas estendeu seus tentáculos a pelo menos uma grande fazenda, conforme denuncia há mais de um ano um dos movimentos de luta pela terra. Numa conversa com o delegado da Polícia Federal em Guajará-Mirim, Pedro Maia, manifestei o palpite de que o barril de pólvora possui diversos estopins por ali e nesse ritmo serão inevitáveis novos conflitos.
O senador Jeferson Péres (PDT-AM) disse: "Basta desmatar cerca de 50% – e não está longe disso, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – para se ter um regime claustrofóbico, sem chuva, e com savanização da Amazônia".
O professor e decano Marc Dourojeanni, da Faculdade Florestal da Universidade Nacional Agrária de Lima, Peru e Diretor Geral Florestal desse país, alerta que todos os governos do Brasil, tanto como os dos países vizinhos, "caem sistematicamente na mesma armadilha de anunciar como triunfo o que na realidade é apenas o fruto de conjunturas econômicas ou climáticas que resultam em breves períodos de redução do desmatamento seguidas de longos períodos de sua aceleração".
Segundo os governos, a Amazônia como um todo, perdeu "apenas" ao redor de 15% da sua superfície florestal. Mas, segundo os observadores independentes que descartam os mil e um truques que os governos usam para satisfazer seu mal aplicado orgulho nacional, a Amazônia já perdeu bem mais de 30% das suas florestas, sem considerar que até 70% do que resta já sofre algum grau de degradação.
"A verdade crua é que o desmatamento da Amazônia progrediu sem trégua desde os anos 1940 e que o ritmo da destruição da natureza desse enorme pedaço da América do Sul aumenta a cada ano. Isto, nem as reconhecidas capacidades contorcionistas dos que fazem as estatísticas públicas conseguiram dissimular", adverte o professor.
De sua parte, o governador "rei da soja", Blairo Maggi, assanha-se, afirmando que "a redução da reserva é um direito dos produtores rurais". Segundo ele, os produtores rurais instalados no nortão mato-grossense desde as décadas de 1970 e 80 compraram terras pensando que poderiam ocupar os 50% da área, um antigo desejo de cada um deles. "Um direito deles", conforme sublinha Sua Excelência.
Sob pressão de ambientalistas, Maggi pondera que a anistia "é muito boa, mas deve ser acompanhada de outras medidas, entre as quais, uma solução para o impasse que envolve a Medida Provisória 2.166, que estabelece o percentual de preservação nos estados da Amazônia e alterou a determinação do Código Florestal. O percentual caiu de 50% para 20%. Enfim, Maggi suplica aos ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura estabeleçam um acordo para a voração da MP.
Maggi nega risco de novos desmatamentos. Contraditoriamente, cresce a produção de soja e aumenta o rebanho bovino em diferentes regiões de Mato Grosso. Ao ouvir a notícia da suposta aninistia, ele também sugeriu o plantio de seringueiras e castanheiras em áreas que perderam a mata nativa. Ele e tantos outros incentivadores das exportações de grãos (em demasia) para países europeus devem estudar melhor o quanto tempo leva a regeneração da mata nativa. Há espécies, todos sabem, que nunca mais se desenvolverão como hoje ainda se encontram.
Costumo invocar virtudes e defeitos do bicho homem , porque há 55 anos comecei a ser criado numa região de terra assada: Lupionópolis, no norte do Paraná. Daquele estado, na dácada de 1970, partiu o maior contingente humano – mais de 1 milhão de pessoas – rumo a Mato Grosso e Rondônia. Vi ainda pecuaristas da Alta Sorocabana se transferirem para o Acre, derrubando seus seringais nativos para a formação de pastagens.
Ainda menino, vi a derrubada das matas paranaenses e do Pontal do Paranapanema paulista. Aos 24 anos desembarquei no extinto Território Federal de Rondônia e acompanhei a necessidade (aliada depois à fúria) do homem e suas investidas contra a floresta nativa: o posseiro sem título definitivo do Incra; o assentado obrigado a desmatar para ter crédito bancário; as multinacionais do minério; os grileiros ávidos por latifúndios – todos, despreocupados em medir conseqüências futuras.
A vontade governamental e a vontade da classe produtora podem convergir para um diálogo no qual prevaleça o bom senso. Os números são reveladores e devem se sobrepor às paixões. No entanto, a ameaça de se repetir na Amazônia a política da terra arrasada que vitimou estados do sul há quase um século põe no molho as barbas dos inteligentes. Yo no credo en brujas, pero que las hay, las hay!
Sustentatibilidade é o verbo que todos andam conjugando, a cada reunião, a cada simpósio ambiental. Acredito ser inconcebível que o caráter dos governos de estados amazônicos se nivele a tantos escândalos, entre eles, a gastança exacerbada com cartões corporativos. Tampouco, ao desrespeito a zoneamentos agroeconômicos e ecológicos que eles próprios conceberam. Eles não fizeram isso apenas para enfeitar prateleiras de bibliotecas, repartições públicas, ou colorir a tela de computadores.
Fonte: MONTEZUMA CRUZ - Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopiniao
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