Na busca de competitividade, eles aprendem com pesquisadores da Embrapa Mandioca e Fruticultura Tropical. No Acre, o aproveitamento de resíduos mobiliza assentados
MONTEZUMA CRUZ
e LÉA CUNHA (*)
Agência Amazônia
BRASÍLIA – Mandioqueiros da Amazônia e do Nordeste estão levando para seus estados maior conhecimento a respeito do uso múltiplo dessa raiz. Um grupo de 50 agricultores de Cruzeiro do Sul (AC) e Petrolina (PE) concluiu na semana passada, em Cruz das Almas (Recôncavo Baiano) a participação em mais um curso sobre usos e processamento da mandioca, organizado pelos pesquisadores do Centro de Tecnologia em Mandioca da Embrapa Mandioca e Fruticultura Tropical, Mauto de Souza Diniz e Joselito da Silva Motta.
Uma semana antes, eles recebera também quatro especialistas do Gabão, país africano que vem privilegiando o estudo de raízes e tubérculos. Lá, a mandioca é o principal alimento básico, com um consumo per capita (por cabeça) de 167 kg/ano. Basicamente, 80% da mandioca produzida no Gabão é consumida internamente. De maneira geral, cada produtor cultiva uma área de cerca de meio hectare, obtendo rendimento médio de 3,639 t/ha, muito baixo quando comparado com outras regiões produtoras.
Perdas elevadas
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Além da farinha, muito comum no Acre, produtores aprendem agora a fazer o uso múltiplo da mandioca /MONTEZUMA CRUZ
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Segundo Motta, no Gabão as perdas são bastante elevadas, devido a vários fatores, entre os quais, bactérias, fungos, vírus e cochonilhas, e sistemas de cultivos que utilizam tecnologias de produção rudimentares, em conseqüência da falta de resultados de pesquisa.
A mandiocultura gabonesa é composta por numerosas cultivares locais, com ciclos produtivos variando de 14 a 24 meses. As cultivares mansas são utilizadas para o consumo fresco, na forma de raízes cozidas, enquanto as amargas são processadas na forma de “baton de manioc”, uma espécie de pamonha.
Por desconhecimento, o empresariado brasileiro ainda não constatou o desperdício de pelo menos 1 milhão de litros de manipueira (líquido leitoso resultante da prensagem da mandioca) a cada dois dias, nas farinheiras das regiões do Juruá e Purus, no Estado do Acre. Esse volume triplica no pico da produção e poderia ser totalmente aproveitado na produção de tucupi, fertilizantes e antipraguicida natural, em vez de ser jogado nas valas e escorrer para igarapés e rios. Se aproveitada, 24 horas depois da industrialização, deixa de ser tóxica.
Fosse considerada e reconhecida de fato pelo governo federal, mesmo contendo ácido cianídrico, a manipueira estaria na lista das riquezas amazônicas, ao lado da castanha, do cacau, do látex, do café (
Rondônia é o maior produtor da região norte), dos peixes e das frutas. Ela pode render muito dinheiro. (Ver matéria indicada no final desta matéria)
Acre busca o aproveitamento integral
RIO BRANCO, AC – Produtores e extensionistas de diversos municípios do Alto e Baixo Acre estão se dedicando ao aproveitamento integral da mandioca, de maneira a torná-la mais competitiva. Ao mesmo tempo, eles querem solucionar problemas ambientais.
Por meio do Programa “Mais Alimento”, do governo federal, e apoiadas pela Embrapa Mandioca, a Embrapa Acre e a Secretaria de Extensão Agroflorestal e Produção Familiar (Seaprof) ofereceram conteúdos teóricos aos agricultores do Projeto de Assentamento Benfica, na BR-317, a 15 quilômetros de Rio Branco (AC). Na casa de farinha comunitária do Ramal Novo Horizonte, os participantes aprenderam técnicas para o preparo de feno e silagem utilizando raízes e folhas da mandioca. Também visitaram lavouras para conhecer sistemas de produção.
Alimento para animais
A exemplo de toda atividade produtiva, o processamento da mandioca produz grande quantidade de resíduos, que geralmente se perdem nas áreas de produção por desconhecimento do produtor sobre as alternativas de uso. “A mandioca é consumida em diversas partes do mundo, mas pouca gente sabe que ela é um alimento quase completo para a maioria das espécies animais, pelas propriedades nutritivas que apresenta”, assinala José Raimundo Filho. Há 15 anos ele atua em pesquisas sobre a cultura na Embrapa Mandioca em Cruz das Almas.
“Além das raízes, as cascas e as folhas também podem ser aproveitadas na alimentação de pequenos rebanhos. A parte aérea, por exemplo, é rica em vitaminas, proteínas e minerais, enquanto as raízes são importante fonte de energia”, explica o pesquisador e instrutor de capacitação,
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País colhe 25 milhões de toneladas de mandioca/ano e 25% desse total está direcionado à alimentação animal /MONTEZUMA CRUZ
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O Brasil colhe 25 milhões de toneladas de mandioca/ano e 25% desse total está direcionado à alimentação animal. A utilização integral da mandioca na alimentação animal contribui para o aumento de leite, carne e ovos, reduzindo significativamente os custos da atividade. No Acre, devido à grande tradição com a cultura, especialmente para produção de farinha, a ampliação das possibilidades de uso da mandioca, além de fortalecer outras atividades como a criação de pequenos animais, representa uma alternativa para tornar a atividade mais limpa ambientalmente.
Ânimo
Para o produtor José Francelino do Carmo, um dos 30 participantes do curso, o aproveitamento integral da mandioca pode ser um grande diferencial para o desenvolvimento da cultura e uma forma de incentivar novos plantios e melhorar a renda do agricultor familiar. “Estamos nos preparando para aumentar a produção e abastecer o mercado local e de outros Estados”, afirma.
Apesar das vantagens desta prática, alguns produtores ainda têm receio em relação à presença de princípios tóxicos, especialmente na parte aérea da mandioca. Filho alerta que, para resolver este problema, o produtor deve conhecer as variedades e tomar alguns cuidados como picar o material e deixar descansar pelo menos 24 horas, período em que as substâncias tóxicas evaporam. Outra dica é promover a incorporação gradativa do produto à dieta alimentar dos animais, para facilitar a adaptação dos rebanhos.
(*) Lea Cunha é assessora de imprensa da Embrapa Mandioca e Fruticultura Tropical em Cruz das Almas (BA). Colaborou: Diva Gonçalves (Embrapa-AC). Fale com o pesquisador José Raimundo Filho Telefone: (075) 3312-8009
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