MONTEZUMA CRUZ
Editor de Amazônias
Com a mini-bicicleta, o menino ensaia entrar num trecho inundado do Bairro da Balsa. Sob a ponte, um casal apanha a cesta básica. As águas arrastam aquilo que o homem despeja, sejam troncos de madeira ou plásticos. Nunca se viu tanto plástico poluindo áreas alagadas, entre a Baixa da União e a Balsa.
Este é o retrato de Porto Velho na manhã desta terça-feira carnavalesca, 4 de março de 2014, dia de São Cassimiro, um santo croata que não arredava pé dos seus deveres políticos. Era um nobre que, apesar de ter títulos de príncipe da Polônia e grão-duque da Lituânia, desde pequeno abriu mão do luxo da corte e de suas ricas festas.
Cassimiro ajudou o pai desde os 17 anos, principalmente nos problemas referentes à Lituânia, onde foi muito querido pelo povo. Sua história muito bonita está nas enciclopédias, porém, falamos aqui da cheia recorde do Rio Madeira e de seus afluentes na Amazônia Ocidental Brasileira.
Em 1979, o meteórico jornal Barranco publicava crianças nuas, em homenagem à pobreza do Ano Internacional da Criança, proclamado pela Organização das Nações Unidas. O jornal foi apreendido pela Polícia Federal, por "atentado à moral e aos bons costumes". Ontem, na beira-rio, o menino nu repete 1979, e desta vez, ninguém irá punir nenhum órgão de imprensa, pois as imagens se propagam na velocidade da luz, Brasil adentro e mundo afora. E o nu sublime desse menino mostrará que a região tem clima tropical úmido, permitindo banhos dessa natureza, sem pudores.
E o menino pesca! Seria o peixe que o ex-presidente Lula ironizou antes de construir as hidrelétricas do Rio Madeira? Foi um bagre mesmo? Verifiquem.
Na sequência de imagens, voluntários e Defesa Civil iniciam mais um périplo fluvial, rumo às moradias de famílias flageladas ou aos pontos combinados para a entrega de água potável, gêneros alimentícios, medicamentos, roupas e agasalhos. É a manifestação autêntica da solidariedade desta cidade cujo destino já fora previsto nos anos 1960 pelo seringueiro José Gabriel da Costa, guia espiritual num centro espírita da Rua Abunã: "Será uma das maiores cidades da Amazônia". O auxílio aos flagelados veio de Brasília, do governo estadual, de igrejas, centros espíritas, Maçonaria, direções e servidores hospitalares, emissoras de rádio e TV e clubes de serviço.
Sensível em seu dever e olhar crítico, o repórter fotográfico Marcos Freire, do Departamento de Comunicação Social do Governo de Rondônia, percorreu a beira-rio para colher, pacientemente, esses flagrantes. Sugerimos que o leitor-internauta guarde-os em seus arquivos de informática para comparar a situação atual com as próximas cheias.
Ou então, nada disso. Apenas guarde-os para se lembrar que a Mãe Natureza nos reserva maravilhas, mas também não nos poupa de dores cíclicas. Mesmo aquelas, cujo conteúdo contém desabrigados e, ao mesmo tempo, o espetáculo das águas visto na Praça da Madeira-Mamoré.
FOTOS MARCOS FREIRE / DECOM