Domingo, 30 de março de 2014 - 15h47
MONTEZUMA CRUZ
De Guajará-Mirim
Os governos brasileiro e boliviano permitem e não conseguem frear desde 2005 a exploração de um garimpo na Baía das Onças, no Rio Guaporé, a 250 quilômetros de Guajará-Mirim, na fronteira brasileira com a Bolívia. Operadas dia e noite por bolivianos, as dragas extraem seixo (fragmento de mineral ou de rocha), constituídos predominantemente de quartzo, coloração clara, possivelmente destinado à construção civil.
A Baía das Onças situa-se em águas internacionais do Brasil e da Bolívia, a uma hora e meia do Forte Príncipe da Beira, em lancha voadeira. Antes de deixar a região, um coronel do Exército Brasileiro contou 15 dragas em operação.
Não existe acordo bilateral para a exploração mineral na região fronteiriça. Aos olhos curiosos dos aproximadamente índios Makurap, o assoreamento já visível em riachos da região avança no leito do rio. “A extração do cascalho está desbarrancando no rumo da Aldeia Ricardo Franco; é uma agressão lamentou ao site Gente de Opinião Basílio Makurap.
Em setembro de 2013, o Exército Brasileiro apreendeu duas embarcações com 34 metros cúbicos de seixo. Outras cinco estavam no lado boliviano. Doze bolivianos foram presos e recolhidos à sede da Polícia Federal em Guajará-Mirim. Também no ano passado,agentes da Polícia Federal flagraram tráfico de cocaína na área da baía, prendendo duas pessoas.
“Eu voltei da França em setembro do ano passado e fiquei feliz com a presença policial na região, depois me desanimei, porque liberaram dois motores de popa e soltaram o preso”, contou o coordenador da equipe do Cimi, o médico Gilles de Catheu. “Tão importante quanto investigar o tráfico de drogas é evitar esse garimpo”, sugeriu.
Segundo Basílio Makurap, o canal do rio sofre alterações e a pesca nunca foi tão escassa. “As dragas chupam dia e noite no meio e também nas barrancas. Faz barulho até de madrugada”.
“A exploração na margem brasileira é absolutamente ilegal e fere diversas normas, dentre elas o artigo 225, §1º da Constituição Federal, o art. 2º da Lei 6.634/79 e o art. 4º da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho”, promulgada pelo Decreto nº 5.051/2004”, disse o procurador da República em Guajará-Mirim, Daniel Luís Dalberto.
Ele instaurou inquérito civil público, autuado sob o nº 1.31.000.001411/2012-32, no qual apura e adota medidas para solucionar o problema. No entanto, conforme explicou, a situação é complexa: “Já houve algumas medidas efetivas, mas o problema persiste. Estamos trabalhando no assunto a fim de buscar solução definitiva”.
Em fevereiro de 2013, dez índios naufragaram após o choque de uma chata com o barco no qual viajavam. Alguns pularam na água e foram salvos por bolivianos. Sem saber nadar, um idoso pendurou-se na proa. Uma mulher bateu a cabeça no barco, ferindo-se.
A madeira nobre já foi extinta na região. Atualmente, as famílias sobrevivem com pequenos plantios de abacaxi, abóbora, amendoim, batata doce, cana de açúcar, cará, banana, feijão, mandioca, melancia, mamão e milho. Colhem castanhas, extraem látex (borracha) e criam um rebanho com cerca de cem cabeças de gado bovino. Segundo a Funai, 120 índios estão alfabetizados.
Remanescentes de etnias ali aglomeradas no século passado pelo extinto Serviço de Proteção ao Índio vivem na baía. Foram transferidos de suas áreas tradicionais para uma só terra indígena, Ricardo Franco, no Guaporé.
Construído no século XVIII para proteger a fronteira, o forte com 970 m², muralhas de 10 m de altura está abandonado. Reencontrado pelo Marechal Rondon em 1930, abrigou o Contingente Especial de Fronteira do Forte Príncipe da Beira, cuja designação mudou em 1954 para 7º Pelotão de Fronteira. Em 1950, foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
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