Pesquisadores decidem enviar documento ao governo federal. Hoje, a cultura dá emprego a 1 milhão de pessoas
MONTEZUMA CRUZ
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BOTUCATU, SP – Pesquisadores de todo o País aprovaram documento que reivindicará ao governo federal a inclusão da mandioca na matriz energética nacional. A decisão foi tomada no encerramento do 13º Congresso Brasileiro da Mandioca, promovido pelo Centro de Raízes e Amidos Tropicais (Cerat), da Universidade Estadual Paulista. Eles acreditam que a exploração da mandioca para produção de álcool tornou-se uma alternativa definitiva para a diversificação e a quebra do monopólio da cana-de-açúcar na produção de álcool.
O documento deverá ser enviado na próxima semana aos ministros Reinhold Stephanes (Agricultura) e Edson Lobão (Minas e Energia) pelos presidentes da Sociedade Brasileira de Mandioca, Mário Takahashi; da Associação Brasileira dos Produtores de Amido de Mandioca, Ivo Pierin Júnior; e da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Mandioca, do Ministério da Agricultura, Maurício Yamakawa.
Estimativas feitas por essas entidades indicam uma produção de aproximadamente 60 milhões de litros de álcool, extraídos numa média até 200 litros de álcool por tonelada de mandioca. Para tanto, são necessários 10 mil a 11 mil hectares de terra, com produtividade de 28 toneladas por hectare. No Vale do Purus, entre os estados do Acre e do Amazonas, a Embrapa, a produção média ultrapassa 20 t, alcançando até 60 t, a exemplo do município de Sena Madureira, com as variedades pirarucu, paxiubão e araçá.
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Eloízio Lopes Júnior (Alagoas) conversa com o diretor do Cerat, Sílvio José Bicudo, a respeio dos resultados do encontro /M.CRUZ
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O diretor do Cerat, professor
Sílvio José Bicudo, anunciou para setembro deste ano o início das operações da destilaria de álcool de mandioca na Fazenda. Ela possui capacidade para esmargar 36 t de raízes/dia e fabricar 200 mil litros/dia de álcool e seus equipamentos foram custaram R$ 6 milhões. Essa produção representa apenas 10% do valor necessário à instalação de uma usina de cana-de-açúcar com a mesma capacidade de processamento.
Assediado, Bicudo recebeu pedidos de apoio a projetos nas regiões norte e nordeste. Composta por 22 pessoas (secretários municipais de Agricultura, técnicos do Sebrae e representantes do governo estadual), a delegação alagoana solicitou a presença de químicos do Cerat por lá, conforme o presidente da Associação dos Beneficiadores de Mandioca do Estado e da recém-criada Câmara Técnica de Mandioca,
Eloízio Lopes Júnior. A Câmara é a primeira do nordeste brasileiro.
“Na Amazônia, a mandioca é a melhor alternativa para o etanol, porque não polui. Ela poderá baixar o preço do litro de combustível em municípios pobres e isolados”, disse por sua vez o deputado Fernando Melo (PT-AC), da Comissão de Amazônia da Câmara, o único parlamentar presente às palestras e debates. Jordão, por exemplo, fica a mais de 640 quilômetros da capital, Rio Branco e a uma semana de barco de Tarauacá. Ali, o litro de álcool combustível custa R$ 6 e o quilo de cenoura ou de tomate pode alcançar R$ 8. Ele e o pesquisador Diones Salla lembraram que o Ministério Público proibiu as seculares queimadas praticadas por uma parcela dos cerca de 30 mil produtores acreanos.
Concluir primeiro para comemorar depois
No seu discurso de abertura, o professor Bicudo lançou um desafio: “Pesquisas para se obter bolhas coloridas consumiram US$ 3 milhões. Quanto recebe a mandioca que alimenta o brasileiro e pode saciar a fome no mundo?”. Com a experiência de 20 anos de pesquisas, o vice-diretor do Cerat, engenheiro químico Cláudio Cabello, defendeu com cautela a produção do etanol de mandioca: “Gostamos de concluir primeiro o nosso trabalho, para depois anunciar os resultados, mas é possível afirmar que destilarias de mandioca, de pequeno e médio porte, são viáveis hoje no Brasil, ao contrário da cana, que requer investimentos muito maiores”.
Cabello expôs a produção de bioetanol de raízes de mandioca em usinas de pequeno porte. Entre outros dados, mencionou que atualmente o quilo de enzimas custa US$ 3,5 nos Estados Unidos e US$ 8 no Brasil.
Mandioca ainda agüenta muito desaforo
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Pesquisador da Embrapa, Marco Antonio Rangel: sistema de produção integrada tem pólos na Bahia, Mato Grosso do Sul, Paraná, São Paulo e Santa Catarina /M.CRUZ
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BOTUCATU – O audiovisual mostra um mandiocal no alto de um morro. O pesquisador da Embrapa Mandiocultura e Fruticultura Tropical,
Marco Antonio Sedrez Rangel, desabafa: “A mandioca ainda agüenta muito desaforo”. Ao apresentar o programa Programa Produção Integrada de Mandioca, ele lembra que o processamento de farinha e fécula proporciona 1 milhão de empregos diretos no País; receita bruta equivalente a US$ 2,5 bilhões; e uma contribuição tributária de US$ 150 milhões.
Esse sistema visa produzir alimentos seguros e outros produtos agrícolas de qualidade pela utilização de tecnologias adequadas. Resumindo-o, Rangel. “É contínuo e participativo”, ele disse. “O modelo participativo requer a integração e a complementaridade de competências nas ações dentro da cadeia produtiva, e com isso, conquistar a sustentabilidade”, explicou. “Com rastreabilidade, fortalecemos o mercado interno da mandioca e a adequação dos produtos às exigências do mercado externo”, acrescentou.
Bahia, Mato Grosso do Sul, Paraná, São Paulo e Santa Catarina são os estados onde começaram os levantamentos de produção, capacitação de profissionais, avaliação de impactos ambientais das lavouras e estudos de mercado. Conforme Rangel, essas prioridades são levantadas por comissões técnicas de produção integrada de mandioca em localidades-pólo. (M.C.)
Qualidade não é privilégio de rico,
adverte pesquisador do IAC
BOTUCATU – “A qualidade não é privilégio do rico. Não é porque a agricultura seja industrial que ela é melhor que a agricultura familiar”, advertiu o pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas (IAC),
Afonso Peche Filho. Em sua palestra “Qualidade operacional: base para agricultura de precisão na cultura da mandioca”, ele abordou aspectos que demonstram o uso correto dos instrumentos agrícolas, “do facão ao trator”.
Peche Filho explicou as bases históricas do movimento mundial pela qualidade: no século XIX predominava a indústria artesanal: no início do século XX, veio a moderna industrialização; em 1922 saiu o primeiro livro importante sobre qualidade.
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Coheita "no sujo" é altamente prejudicial, alerta o pesquisador Adolfo Peche Júnior, ao debater a qualidade da lavoura /M.CRUZ
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“No período pós-guerra, a reconstrução dos países pressupôs menos perdas, menos desperdícios, daí chegarmos hoje à preocupação aceitável com o corte correto de manivas. Para obter gestão de qualidade no campo, é preciso educar, treinar e desenvolver, mas não é dizendo soca o pau! Muito menos, chamando de cabeçudo o agricultor que errou”.
Mencionou o PDCA para dizer que a sua aplicação visa resultados dentro de um sistema de gestão e pode ser utilizado em qualquer empresa, independente da área de atuação. A sigla significa: Plan, de planejamento; do, de execução; check, de verificação; e act, de ação.
“O que vou produzir?” – indagou o pesquisador. Descreveu em seguida, na fase germinativa da mandioca, as linhas plantadas, a aplicação de herbicidas, o controle da mata e o sulco da lâmina do trator. Para Peche Filho, os danos físicos da operação são pontos fundamentais na fase tenra da planta, porque contribuem para os indicadores de plantio. “O pós-maturidade exige o controle da mata: se erramos três dias, teremos a qualidade prejudicada. A isso se chama colher no sujo”.
O pesquisador lembrou que, na semeadura do milho numa propriedade em Porto Feliz (SP), ele apenas mudou o jeito do passo do agricultor, desde a madrugada. Colheram-se seis espigas de cem gramas cada, a cada metro quadrado da lavoura. “Corrigimos uma semeadura malfeita, reduzindo principalmente a longa andança do produtor para 600 mil plantas”, disse. (M.C.)
Fonte: Montezuma Cruz - A Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião e do Opinião TV