Biopirataria e tráfico de mulheres repercutem na Europa
MONTEZUMA CRUZ
BRASÍLIA– A Federação Agostiniana Brasileira denunciou nesta sexta-feira, em Roma, a "omissão do Estado perante as injustiças e a "facilidade para a invasão do capital estrangeiro e da biopirataria" na Amazônia. Padres e freiras agostinianos atuam há décadas na região e já perderam líderes em conflitos fundiários. A entidade se reuniu este mês em Perus, São Paulo.
Quarta-feira, 14, em Belém (PA), o bispo do Marajó, dom Luiz Azcona, desabafou na Assembléia Legislativa do Estado do Pará: "A biopirataria, tráfico de armas e drogas, exploração sexual e tráfico de seres humanos estão acontecendo no Marajó e a rota de entrada e saída é por causa da proximidade com o Amapá e Suriname.
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Dom Luiz depõe na CPI da Pedofilia / LUCIVALDO SENA-AG. PARÁ |
"Em novembro de 2007 uma menor de 17 anos, natural de Portel, foi presa pela PF no Aeroporto de Guarulhos (SP), quando tentava embarcar para a Espanha. No depoimento ela disse que outro grupo de mulheres do Marajó estava chegando para ir para a Espanha", revelou dom Luiz.
Há algum tempo, bispos da Amazônia estão ameaçados de morte, lembrou esta semana a presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil no Pará, Mary Cohen. Ela prometeu pedir às Secretarias de Segurança Pública e de Justiça e Direitos Humanos do Pará garantias de vida para dom Luiz.
"O governo do Estado e a Polícia Federal já me ofereceram proteção, mas recusei porque ela pode ser ineficaz. O certo é a polícia investigar a prender as pessoas mandantes de crimes de encomenda", apelou. Os outros dois bispos ameaçados: dom Erwin Krautler, de Altamira e dom Flávio, de Abaetetuba. Apenas dom Erwin tem proteção da Polícia Federal.
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Breves, rota do tráfico de mulheres / UFPA
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Fronteiras atingidas
A Rádio Vaticano lembrou hoje, 16, que a Federação Agostiniana se reuniu no 11º Congresso Nacional Agostiniano em Perus (SP) entre os dias 5 e 11 de janeiro, com a presença de 250 participantes e mais de 20 delegados. E a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil divulgou um manifesto no qual os religiosos daquela Ordem defendem os ameaçados de morte na região amazônica: mulheres traficadas, o meio ambiente e o direito à terra.
A Federação denuncia que o Estado está deixando que a região "se transforme em um corredor de exportação". De acordo com dom Luiz, a situação é de segurança nacional: "Atinge nossas fronteiras. Na rota para o exterior não há um único navio da Marinha ou posto da Polícia Federal. "Existe uma rede interligada do crime organizado na região", disse.
Jovens estão se matriculando na rede pública de ensino com o objetivo de aliciar menores para a exploração sexual. Segundo o bispo, eles marcam encontros com empresários e políticos da região. "Há diretores, professores e servidores envolvidos e tudo isso acontece nas vistas da polícia", lamentou. O deputado Carlos Bordalo (PT) disse que pedirá o depoimento de diretores de escolas na CPI.
O presidente da CPI da Pedofilia, deputado Bira Barbosa (PSDB), informou que vai apurar as denúncias do bispo. "A CPI é para investigar a exploração sexual e não apenas de pedofilia". A advogada Vera Tavares, integrante da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos, disse que a CPI "tem boa vontade dos deputados em apurar estes crimes hediondos".
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Pedofilia: 2,4 milhões de vítimas
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"Projeto de morte sem responsáveis"
O documento lançado pelos agostinianos acusa um "projeto de morte" que não têm responsáveis. E exige das autoridades "uma séria e ampla investigação dos problemas e suas causas reais, prejudiciais à sociedade".
Recomenda ações firmes e enérgicas "para que não vigore o domínio do mais forte, a violência e a mentira, e sim, que seja assegurado o direito à vida de todos pela verdade e pela justiça".
Expressa solidariedade "aos nossos irmãos, irmãs e famílias ameaçadas". Assume ainda a missão de defender e promover a vida e a dignidade humana: "Reafirmamos a nossa esperança na força do Espírito Santo que age na História e buscamos nesse gesto concreto o início da transformação da Cidade dos Homens em Cidade de Deus".
Crimes no Amapá, Pará, Guiana e Suriname
BRASÍLIA – Durante depoimento à CPI da Pedofilia, quarta-feira, na Assembléia Legislativa do Pará, dom Luiz Azcona apresentou um relatório feito por uma instituição, entre 17 e 19 de novembro de 2007, revelando casos de abuso sexual e tráfico de seres humanos.
Ele não disse o nome da instituição, mas alertou também para relatos da regional Norte da CNBB, os quais confirmam: a exploração sexual acontece em todos os 143 municípios paraenses. A Organização Mundial do Trabalho estima em cerca de 2,4 milhões de pessoas são vítimas do tráfico humano, que movimenta cerca de US$32 bilhões (R$56 bilhões) por ano. É a terceira atividade criminosa mais lucrativa do mundo, segundo a organização.
● Os municípios marajoaras citados pelo bispo são: Breves, Bagre, Curralinho, Melgaço e Portel. É preciso diagnosticar o problema da exploração sexual; descobrir os motivos dessa situação desumana; apurar as responsabilidade e apontar medidas concretas a curto, médio e longo prazos.
● "As pistas, disse o bispo, são casos concretos da rota de exploração sexual e tráfico humano entre Breves, Melgaço, Portel, Soure, Guiana Francesa e Suriname".
●Em Portel, a exploração sexual envolve meninas entre 12 e 17 anos, na orla e nos bares "Altas Horas", "Mormaço" e "Tropical".Na praça central de Breves, uma menor de nove anos foi engravidada pelo avô.
● Em Anajás, quadrilhas de lésbicas aliciam meninas para exploração sexual em municípios vizinhos e traficam para Suriname e Guiana Francesa. Em Bagre, meninos e meninas atendem pescadores e donos de embarcações, em programas que custam R$ 3.
● Curralinho: 27 denúncias de exploração sexual chergaram ao Conselho Tutelar, em 2007. Cinco processos estão parados. Em Soure foi preso um homem de 24 anos, conhecido por Bruno. Ele mantinha uma rede de pedofilia via internet.
● O rio Tajapuru, por onde "circulam 70% da rota marítima entre o Pará e o Amapá, já foi alvo de reportagem no "Jornal Nacional (TV Globo) que mostrou a exploração sexual de menores".
● O Marajó está recebendo um plano de desenvolvimento sustentável elaborado pelos governos federal e estadual. No próximo dia 21 será inaugurado o Centro de Referência de Assistência Social, que atenderá casos relacionados à infância e adolescência.
● Dom Luiz sugeriu parcerias entre prefeituras e escolas, trabalho de conscientização nas áreas portuárias, atuação da inteligência da Polícia Civil para desmobilizar as rede criminosas, ação da justiça, aparelhamento dos Conselhos Tutelares, programa de geração de renda para famílias e formação de grupos de jovens.
Fonte: Montezuma Cruz - A Agênciamazônia é parceira do Gentedeopiniao.