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Energia elétrica a carvão passou raspando


Energia elétrica a carvão passou raspando - Gente de Opinião
 

RONDÔNIA DE ONTEM

MONTEZUMA CRUZ

Não é de hoje que o debate a respeito do setor energético vem fervilhando em Rondônia. Ele já existia no extinto Território Federal, que durante muitos anos foi abastecido por termelétricas a diesel. Em 1978 e 1979, discutia-se acaloradamente o futuro rondoniense, mesmo a distância dos escalões do poder em Brasília.


Lembro-me de uma crise que parou nas páginas de economia da Folha de S.Paulo. Foi protagonizada pelo então presidente da Ceron, economista José Gomes de Melo, no governo do coronel Humberto Guedes: antes da construção da Usina Hidrelétrica de Samuel, no Rio Jamari, a Petrobras só vendia óleo à vista. A cartilha da estatal não permitia parcelamentos, o fiado, como diz o povo.


Por causa do atraso no pagamento da conta, a Petrobras deixou o território à beira de um colapso no fornecimento de energia em 1977. “Desembolsamos o que não tínhamos para garantir o óleo das usinas”– desabafava Melo, que vivia um constante “Deus nos acuda”.


Em março de 1979, a Ceron consumia 2,3 milhões de litros, dos quais, 1,6 milhões somente na capital, Porto Velho. Traduzindo em miúdos: gastavam-se diariamente 100 mil litros (!) na geração de energia. Dois anos antes, em 1977, as despesas com combustíveis representavam 54% do custo da Ceron; em 78, elevou-se para 62%.


O deputado Jerônimo Santana (MDB-RO) protestava na Câmara contra um plano frustrado do então presidente da Eletrobrás, Maurício Schulman, para o uso de carvão mineral na geração de energia aqui. “Se uma peça de reposição para os geradores da Ceron demora mais de dois meses para vir da General Eletric, dos Estados Unidos, imagine o carvão de Santa Catarina!”– pilheriava o vereador Itamar Dantas (MDB).


Na verdade, o balão de ensaio do envio de carvão do sul para o norte brasileiro desaquecia os projetos hidrelétricos de Balbina, no Amazonas, e de Samuel, em Rondônia. Teixeirão morreu, mas Guedes vive em Brasília e pode dizer o que sabe dessas manobras.


A paralisação do projeto de Samuel representava o segundo recuo da Eletrobras diante de uma obra que beneficiaria até o vizinho Acre. Samuel fazia parte de um programa da Eletronorte avaliado em US$ 300 milhões, para substituir a energia de origem térmica por hidrelétrica na região norte.


Rapidamente, a classe empresarial marcava posição contra a Eletrobrás, que pretendia aplicar US$ 1,5 mil por quilowatt numa usina a carvão, enquanto a futura primeira hidrelétrica exigia investimentos de US$ 3 mil/KW. O presidente da Associação Comercial de Rondônia, Moisés Mourão, chiava: “Temos muito mais a oferecer do que a pedir” — referindo-se ao ouro, à cassiterita e ao cacau, que se sobressaíam na economia local.


A Ceron custava 6 milhões de cruzeiros mensais, mas recebia recursos da Light, Copel, Cesp e Cemig. Um relatório redigido já no governo do coronel Jorge Teixeira de Oliveira (que sucedeu Guedes) foi entregue ao ministro dos Transportes, Mário Andreazza, para que intercedesse com o colega César Cals (Minas e Energia), reconsiderando o projeto de Samuel.


Atribuía-se à Eletrobrás ações que retardavam o desenvolvimento do futuro estado. Bem antes dessa crise, o ex-deputado Jaime Araújo (PSD-AM) traduzia corretamente o sentimento de outros estados em relação ao norte do País: “Quando se trata de uma reivindicação para soja ou trigo, o governo atende prontamente, mas, em se tratando da Amazônia, sempre ele fala em dificuldades”.


Trinta anos depois de Araújo, ao lado de Jerônimo Santana, o deputado Aluízio Bezerra (MDB-AC) demonstrava sua indignação ao que classificava de “protecionismo internacional”: “Eu estive no Projeto Jari (do milionário norte-americano Daniel Luwig) e eles exigem do governo uma hidrelétrica, que deve ser autorizada; por que não enxergam melhor o Amazonas, o Acre e Rondônia, onde a carência de energia elétrica é bem maior?”.


Assim aconteceu naquele palco iluminado, pouco antes da virada na página final do ex-território. No momento em que estudos técnicos revelavam: o Rio Madeira possuía um potencial de 100 milhões quilowatts.

Publicado simultaneamente por RondôniaSim, GentedeOpinião e pelo Correio Popular.


    
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