Terça-feira, 23 de novembro de 2010 - 05h02
MONTEZUMA CRUZ
Amazônias
ALTO ALEGRE DOS PARECIS, Zona da Mata (RO) – Além de pedras, cerâmicas e ossadas, invasores do território indígena ajuru exploram madeira, praticam pesca predatória e extraem palmito. Cedro, cumaru ferro e mogno são tombados dia e noite. Raridade, o cumaru está praticamente extinto. Alguns mateiros caminham dois a três dias para localizá-lo.
Leonice Tupari, Walda Ajuru e Rosinha Sakirabiá, mesmo sem o apoio da Funai e da polícia, acreditam que a presença do Iphan pode tornar visíveis indígenas que perderam territórios para fazendeiros /MONTEZUMA CRUZ |
No ano passado, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) apreendeu na região de Vilhena mais de cinco toneladas de palmito, açaí e pupunha retirados em sua maior parte de terras indígenas. Está claro que há trabalho para diversas operações da Força Nacional, a partir de relatos do próprio Ibama, da Polícia Federal, do Serviço Reservado da Polícia Militar e dos próprios indígenas.
O mais doloroso no momento é a cooptação de lideranças. O povo miqueleno, por exemplo, é o mais frágil. Já constatou alguns representantes recebendo agrados de fazendeiros, entre os quais, dinheiro e viagens.
Anos 1980: tiros, espancamentos e humilhação. Comovida, Walda Ajuru descreve a via crúcis de sua gente, expulsa por fazendeiros apoiados pelo Incra, sob a conivência da Funai. Para ter certeza de que os índios tomariam o rumo de Ricardo Franco, fazendeiros fizeram acordo com o então administrador da Funai em Guajará-Mirim (fronteira Brasil-Bolívia), Dídimo Graciliano de Oliveira.
Pedras com alguma preciosidade: cabe à PF investigar se os roubos se destinam à comercialização ou coleções /MONTEZUMA CRUZ |
Jantar com tiros
– Os abusos aconteceram às vistas das próprias autoridades – lamenta a cacique. Lembra um fato: em 2002, enquanto representantes do Cimi e do Ministério Público jantavam em Porto Rolim, Vitor Hugo Zabala, o Diogo, disparou um revólver 38 contra um grupo de índios e fugiu numa moto. O indigesto jantar acabava ali. Os índios foram embora numa canoa, assustados.
– Diogo ainda disse que se quisessem ficar na área teriam que falar com o governador Cassol – lembra a cacique. Segundo um relatório do Conselho Indigenista Missonário (Cimi), cerca de 80% do território ajuru está nas mãos do ex-governador Ivo Cassol (PPS), agora eleito senador da República.
Um dia depois daquele atentado, policiais fardados vindos de avião pousaram numa pista próxima a Porto Rolim, enquanto os indígenas participavam de uma assembléia. Consumiram diárias e combustíveis, apenas para constatar a denúncia de que eles teriam quebrado o cadeado da fazenda. Era mentira.
A serraria de Rubens Restri funciona desde 1982, explorando madeira da terra indígena. A região ainda tem mogno, cerejeira, castanheira, cedro e angelim. Walda classifica de “desrespeitoso” o plano de manejo aprovado pela Funai e Sedam sem consultar os indígenas que já se manifestaram em assembléias sua contrariedade à pesca, extração de madeira e de recursos extrativistas de maneira predatória.
– Toda vez que algum de nós reclama e dizemos que voltaremos às nossas terras originais, eles dizem: vocês voltam, mas a justiça é lenta. Isso é um desaforo, não é?
Sem apoio policial, da Funai, notando a indiferença das autoridades regionais, três mulheres corajosas ainda estão esperançosas em que a presença de representantes do Iphan possa tirar-lhes do anonimato ao qual foram submetidos. Falar de índios isolados em Rondônia atualmente é um desafio de consciência.
Milagrosamente, este raro exemplar de samaúma continua em pé. Mateiros não poupam espécies raras, nem aquelas cujo corte é proibido /MONTEZUMA CRUZ |
Lugares sagrados violados
ALTO ALEGRE DOS PARECIS, Zona da Mata (RO) – Na mesma situação dos Tupari e dos Ajuru, encontram-se atualmente os povos Arara, Arikapu, Aruá, Gavião, Kanoé, Karitiana, Kaxarari, Kwazá e Makurap. Sofrem quase todos do mesmo mal: desde a chegada do Programa de Desenvolvimento Integrado do Noroeste Brasileiro (Polonoroeste), financiado pelo Banco Mundial, Rondônia promove revisões de demarcação das terras indígenas.
A pior conseqüência disso é que a maior parte dessas terras perdeu lugares sagrados, espaços nos quais há cemitérios, pedras e, supostamente, antigas e milenares oficinas de cobre.
O Cimi apoiou esses povos no pedido de revisão de seus limites territoriais, sob a justificativa de que a falta de espaço impede a sua reprodução física e cultural. Não é a toa que vem ocorrendo casamentos intertribais, como forma de preservação.
A angústia desses povos aumenta, na medida em que se sentem impotentes para expulsar mateiros, jagunços de madeireiros irregulares, pescadores, e garimpeiros. A Terra Cujubim está estrangulada: parte do território tradicional foi transformada em reserva extrativista e outra parte está ameaçada por um projeto de assentamento do Incra.
Em 2009, o grito indígena alcançou a Europa, quando sete representantes dos povos Aruá, Jabuti, Kanoé, Makurap e Tupari, que vivem nas terras indígenas de Rio Branco e Guaporé, viajaram para a Suiça, apoiados pelos museus etnográficos de Basiléia, naquele país; de Viena, na Áustria; de Berlim, na Alemanha; e do museu de Leiden, na Holanda.
Eles mostraram a cultura de cada etnia, trocaram conhecimentos com pesquisadores suíços, mas aproveitaram para denunciar a situação de cada um. (M.C.)
Temor de perder tradições e conhecimentos
Ibama faz apreensões regulares quando recebe denúncias; terra indígena também virou alvo de palmteiros em Rondônia/DIVULGAÇÃO |
ALTO ALEGRE DOS PARECIS, Zona da Mata (RO) – Segundo Leonice Tuí Tupari, 33 anos, o último pajé Tupari era Cassimiro, que morreu aos 105, em abril deste ano. Índios com idade até 30 anos vêm aprendendo muito a respeito da seca, da cheia, das plantas medicinais e dos antigos rituais de seus antepassados. Entre as plantas, por exemplo, algum futuro pajé sempre terá oportunidade de trabalhar com a surucuína, cujo extrato é usado naturalmente no combate e picadas da cobra jararaca.
– Nós não sabemos de onde viemos – diz Leonice, que mora na Linha Nove. Há pouco tempo ela se casou com um Suruí. Os Ajuru por sua vez unem-se pelo matrimônio com pessoas Canoé, Jaboti, Makurap e Oro Nao.
Outro conhecido por “grande pajé” responsável por curas espirituais foi Lourenço Ajuru, o “Pororoca”. Durante muito tempo, atendeu e ensinou doentes de outras terras. Brancos também aprenderam com ele.
– Será que vamos sobreviver? – pergunta Leonice, com leve sorriso.
Mas os pajés que significaram guarnição, segurança e conhecimento aos povos estão morrendo sem deixar substitutos à altura. Para a formação de pajé o jovem deve permanecer 30 dias na floresta sem comer carne e peixe. Alimenta-se apenas de gongos de palheira, amendoim e milho.
O uso de conhecimentos tradicionais ainda cura picadas de cobras, de arraia, outras doenças entre os Sakirabiá (ou Mequéns), povo pescador e caçador, cuja terra (107,5 mil ha) fica entre os rios Xupingal, São João, Mequéns, e Igarapé Espanhol, em Alto Alegre dos Parecis. Mulheres herboristas, parteiras e pajé seguem a medicina natural e dos rituais de cura. Agentes indígenas de saúde trabalham com a medicina alopática para combater as doenças mais comuns: diarréia, verminose, gripes e leishmaniose. (M.C.)
POVOS INDÍGENAS FORA DOS TERRITÓRIOS TRADICIONAIS
▪ Aruá ▪ Aikanã ▪ Cabixi ▪ Tupari
▪ Apurinã ▪ Arikapu ▪ Gavião
POVOS INDÍGENAS SEM TERRA NO ESTADO DE RONDÔNIA
▪ Atikum ▪ Cassupá ▪ Massaká ▪ Salamãi
▪ Cujubim ▪ Jaboti ▪ Miqueleno ▪ Wayoró
▪ Canoé ▪ Kampé ▪ Puruborá ▪ Urubu
A Terra Indígena Rio Branco, habitada pelos Arikapu, Aruá, Canoé, Jaboti, Kampé, Tupari e Makurap, foi homologada pelo decreto 93.074, de 6/8/1986 e possui a extensão de 293.137 hectares. Abrange parte dos municípios de Alta Floresta do Oeste, São Francisco do Guaporé e São Miguel do Guaporé.
FONTE: CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO (CIMI)
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