ANA MARIA MEJIA e
MONTEZUMA CRUZ
Agência Amazônia
GUAJARÁ-MIRIM, RO — Olha o açaí! Olha o açaí geladinho! Pan, empanada y tortilla! Se você ouviu estes gritos no meio de uma tarde modorrenta, certamente está em Guajará-Mirim, vizinha a Guayaramerin, Bolívia, cidades separadas e unidas pelo Mamoré, imenso rio de águas barrentas. Além de se misturar na economia e elas também se misturam especialmente na cultura e na culinária. Montados sobre duas rodas vendedores ambulantes circulam pelos bairros, oferecendo seus produtos.
Um bom guajaramirense não dispensa esses pães artesanais. Também não dispensa a ida até o "Canarinho", lanchonete tradicional no centro da cidade, perto do Museu Histórico. Ali, o cardápio oferece a chicha (refresco feito milho seco, moído e cozido), refrescos de sinini (graviola), patiu (maracujá), palta (abacate),
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Pão artesanal boliviano é bem consumido nas duas cidades fronteiriças /ANA MEJIA |
saltenha (salgado assado com recheio suculento), quépi (quibe) e pastéis de queso (queijo), pollo (frango) e carne. O proprietário Randolfo Pinto Romero conta que há 30 anos abriu a primeira lanchonete na cidade e há 18 está no mesmo endereço. "Meus fregueses são brasileiros e bolivianos. Então, a gente escreve o cardápio dos dois jeitos", conta.
É preciso madrugar
Adaptados ao gosto brasileiro, alguns pratos cruzaram a fronteira e fazem parte do jeito fronteiriço de ser. A saltenha conquistou o paladar geral. Comer massaco de banana da terra verde ou de macaxeira (banana ou macaxeira cozida, socada no pilão junto com charque frito e queijo) no café da manhã é para poucos. Para conseguir comprar a iguaria no mercado municipal é preciso madrugar. O melhor é preparar em casa, num dia especial de reunião familiar.
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Canarinho oferece sucos especiais /M.CRUZ |
Esse jeito de comer em bancas montadas no meio de praças é 'a cara' dessas cidades. Guajará-Mirim tem bancas de tacacá, de sanduíche, de sorvete, numa grande praça de alimentação a céu aberto e em Guayaramerin, na Província do Beni, as bancas se espalham pelas praças ou meninos e meninas oferecem em cestos de madeira ou de palha pães, empanados, tortillas, cuñape – e refrescos.
Para conhecer as iguarias bolivianas chegue pelas quatro da tarde no mercado municipal. As mulheres comandam os negócios de comida. Interessante e preferidos são os rellenõs – tripa cozida e recheada com uma mistura de arroz e carne moída, servida com yuca (macaxeira). Para beber: mocochinche (refresco feito com pêssego seco), chicha e qualquer outro refresco de fruta da época.
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Solteiro (óculos escuros): churrasquinho na avenida tem 35 anos /M.CRUZ |
Churrasquinho do Solteiro
O churrasco vendido em espetos pequenos conquista a freguesia. Aos 72 anos, Cristiano de Abreu Viana Soares, o Solteiro se diz feliz. Vende espetinho de carne num ponto fixo, na Avenida Constituição, onde se encontra há 35 anos. "Estou aqui, graças ao falecido prefeito Rigomero Agra, que me encontrou trabalhando num beco pertencente a Paulo Nogueira. Fiquei lá cinco anos", conta. Rigomero, um paraibano que conquistou o coração dos guajaramirenses, já morreu.
Atacado pela malária, depois dos 60 anos, Solteiro não esmoreceu e voltou a fazer o churrasquinho. Para quem foi porteiro de boate, a atual atividade é brinquedo. A freguesia fiel só lhe dá folga às quartas-feiras e domingos. Paraibano nascido em Pombal, pai de quatro filhos e avô de quatro netos, Solteiro teve seu churrasquinho saboreado por políticos antigos, entre os quais o ex-deputado e governador Jerônimo Santana, o ex-vice-prefeito Antônio Bento e o comerciante Abrão Azulai. Entre os atuais políticos, o deputado estadual Miguel Sena sempre freqüenta o local.
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Tradição cinqüentenária: aqui todos têm bicicleta, para passeio e trabalho /M.CRUZ |
Vou de bicicleta!
Lojistas garantem: cada família desta cidade de 42 mil habitantes tem uma bicicleta. Muitos possuem motos. Crianças, jovens e até idosos andam sobre duas rodas em Guajará-Mirim, a 362 quilômetros de Porto Velho. Importadas, recauchutadas ou novas, as bicicletas emprestam um charme diferente à população, tornando-se definitivamente um meio de transporte ecologicamente correto.
O terreno plano favorece a circulação de bicicletas e motos – que também são centenas. Donas de casa costumam usá-las para a costumeira compra de hortifrutis no mercado municipal. Funcionários de lojas, bancos e escritórios estacionam esses veículos nas calçadas, na frente dos estabelecimentos.
Dom Rey tinha uma Philips
Desde os idos de 1960, a bicicleta é usada até por autoridades locais. A Philips que pertenceu ao bispo Dom Francisco Xavier Rey, por exemplo, está guardada como lembrança no Museu Histórico do Município, com campainha e tudo.
Desde que se tornaram Área de Livre Comércio, Guajará e Guayará se beneficiam de isenção de impostos, facilitando a compra de bikes e motos. A Tec Ciclo, loja especializada nesses produtos, expõe na calçada as motos da marca Jinko, cujas vendas sempre crescem no final do ano. Marcas japonesas e americanas originais, com titânico, ferro e alumínio.
A Renaut oferece sua linha para passeios ecológicos. A bicicleta mais cara custa R$ 1,7 mil. As nacionais estão na faixa de R$ 170, informa o gerente Eric Alan Alcoreza, 22. Por R$ 150 uma bicicleta usada pode se tornar semi-nova na Bicicletaria Tayna, onde dona Francisca Pereira de Souza cobra R$ 50 pela pintura e colocação de acessórios.O pneu custa R$ 13. As importadas chegam às lojas totalmente desmontadas. Os raios saem das caixas e são montados um a um. A Loja Gazin, na Rua Leopoldo de Matos, vende no cartão uma bicicleta em média por dia.
Fonte: Montezuma Cruz - Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião.
Segunda-feira, 25 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)