Sexta-feira, 25 de outubro de 2013 - 20h11
MONTEZUMA CRUZ
De Brasília
Mobilização nacional pela demarcação de terras foi a mais forte decisão do Encontro de Lideranças do Movimento Indígena Morogitá Kagwahiwa, após três dias de debates em Humaitá, sudoeste amazonense, a 200 quilômetros de Porto Velho (RO) e a 675 km de Manaus (AM). Cerca de trezentos índios Tenharim, Parintintin, Mura, Jiahui, Munduruku, Gavião, Miranha, Arara, Zoró, Karitiana, Torá, Apurinã, Jupaú, Macuxi, Mura Piraha, e Sateré, entre os quais líderes e caciques, redigiram e enviaram documento à presidente da Funai, Maria Augusta Assirati, apelando para a retomada de audiências públicas propostas na Comissão Nacional de Política Indígena.
Eles preveem seminários em todo o País para repetir o que fizeram em Humaitá esta semana: opinar. Também reafirmaram a luta pela aprovação da PEC 320/2013, no Congresso Nacional, criando quatro vagas para deputados federais indígenas, e pediram aoSupremo Tribunal Federal (STF) o julgamento de processos que envolvem a garantia de territórios tradicionais. “A garantia da terra significa menos violência física, econômica e cultural”, assinalam.
Na Amazônia Ocidental Brasileira seriam retomadas as demarcações da Terra Indígena do Povo Mura do Itaparanã e Munduruku, e Mura do lago Capanã Grande, paralisadas desde a Constituição de 1988. Apoiando o fortalecimento da Funai, os indígenas acreditam que se esse enfrentaria invasores dos territórios Uru Eu Wau Wau, Suruí e Cinta Larga, em Rondônia; Mura e Munduruku, no Rio Marmelo (AM), e Capanã Grande (AM), todos ameaçados por atividades de grupos madeireiros, garimpeiros, grileiros e fazendeiros.
O encontro repudiou o governo federal, seus ministérios, e também parlamentares da chamada Bancada Ruralista do Congresso Nacional. “Eles representam interesses de grandes grupos econômicos, contra os nossos direitos originários e fundamentais, principalmente os direitos sagrados à terra, territórios e bens naturais garantidos pela Constituição Federal de 1988”, assinalam.
Criticaram as PECs 215/00,237/13, 038/99, PLs 1610/96 e 227/12, e “outras iniciativas legislativas nocivas”, por entenderem que elas “legalizam a exploração e a destruição disfarçada de progresso” dos seus territórios, pondo em risco a integridade física e cultural das atuais e futuras gerações. Movimento Negro, Movimento Atingidos por Barragens, comunidades tradicionais, Via Campesina), organizações sociais, sindicatos e movimentos populares do Amazonas, Acre, Rondônia e Pará, apoiaram o encontro e suas decisões.
“Insegurança jurídica e perpetuação do genocídio”
O governo da presidente Dilma é conivente com essa ofensiva que busca mudar a Constituição Federal, “promovendo a desconstrução da legislação ambiental e indigenista”, acusa o documento.
Segundo os indígenas, os ministros José Eduardo Cardozo (justiça), Luís Inácio Adams (Advocacia Geral da União) e Gleisy Hoffmann (Casa Civil), “articularam-se em compromissos com a presidente da Confederação Nacional de Agricultura, senadora Kátia Abreu”. “Se não fosse assim, o governo Dilma já teria mobilizado a sua base aliada para impedir os ataques que sofremos no Congresso”, ponderam.
O documento critica a Portaria 2498 e o Decreto 7957/2013, “porque destroem os territórios indígenas, por meio da expansão do agronegócio, das hidrelétricas e de tantos outros grandes empreendimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento”.
Lamenta que a presidente Dilma Roussef, “a exemplo do antecessor”, tenha paralisado a demarcação das terras indígenas, a criação de unidades de conservação, a titulação de quilombos e a efetivação da reforma agrária”. Conforme analisam, isso origina “a mercantilização, insegurança jurídica e perpetuação do genocídio inaugurado pelos colonizadores há 513 anos”.
Pede o respeito do Estado Brasileiro, notadamente do STF, no sentido da valorização de direitos, diversidade e pluralidade da sociedade brasileira. “Vamos resistir, inclusive arriscando as nossas vidas, contra quaisquer ameaças, medidas e planos que violam os nossos direitos e buscam nos extinguir, por meio da invasão, destruição e ocupação dos nossos territórios e bens naturais, para atender aos interesses de grandes empresas que geram grandes lucros e grandes impactos negativos para as populações indígenas e não-indígenas locais”.
Exigências em cada estado
▪ Criação de uma Comissão Especial com a participação de indígenas para impulsionar a aprovação urgente do Estatuto dos Povos Indígenas, antes de qualquer outro projeto, bem como aprovação do PL 3571/2008 de criação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e da PEC 320/2013 que propõe a criação de quatro vagas para deputados federais indígenas;
▪ Urgente revogação de todas as portarias e decretos editados pelo governo Dilma e que afrontam direitos, principalmente a Portaria 419/2011, Portaria 303/ 2012, Portaria 2498 e Decreto 7957/2013;
▪“Diante da enganação e violação dos direitos dos povos indígenas e populações tradicionais da Bacia do Rio Madeira, no rio Xingu (PA) e no Rio Teles Pires (em MT) onde estão construindo hidrelétricas para viabilizar hidrovias, para os quais exigimos respeito”;
▪ “Reafirmamos que somos contra a construção de barragens nos rios Machado (UHE Tabajara), Madeira (UHE Ribeirão), Tapajós, Juruena e Teles Pires. Não vamos aceitar compensações para nos destruir, porque a água para nós é fonte de Vida e não de morte. Onde não for possível evitar, exigimos o pagamento de royalties às comunidades envolvidas durante toda a vida útil do empreendimento”.
▪ “Exigimos incluir as terras indígenas Igarapé Lourdes, Pirahã, Jiahui, Nove de Janeiro, Ipixuna, Torá, Mura, Mundurukudo Baixo Marmelo e todas as terra Tenharin e de índios isolados como áreas que serão afetadas pela construção da hidrelétrica Tabajara;
▪ “Exigimos respeito e cumprimento de nossos direitos, reconhecidos pela Constituição Federal, assegurando para os nossos povos efetivas políticas públicas, específicas e diferenciadas, nas áreas da educação, da saúde e de todas as áreas do nosso interesse que gere melhoria na qualidade de nossa vida. Somos contrários à política de compensação desencadeado por empresas interessadas em T.I. que utilizam disso como fator de manipulação e cooptação de lideranças”;
▪ Na educação escolar indígena, estados e municípios não cumprem as leis e tampouco os recursos destinados atendem às necessidades. “Temos um custo diferenciado na Amazônia que necessita ser revisto com máxima urgência. No tocante aos territórios etnoeducacionais, defendemos a retomada urgente deste debate metodológico como unidade de planejamento e execução da educação escolar específica e diferenciada”;
▪ “Exigimos funcionamento urgente da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai). “Estamos cansados de ver nossas crianças e idosos morrendo por falta de atendimento nas aldeias, fruto do descaso do governo. Em muitas regiões não temos Polo Básico, medicamentos, transporte, ou seja, não temos a condição mínima de atendimento e ficamos a depender da boa vontade de quem e responsável”
▪Há recursos paralisados em prefeituras, entre elas, a de Ji-Paraná (RO), que deveriam ser utilizados na melhoria da qualidade do atendimento e resolução de pendências antigas com servidores e fornecedores, que por falta de deliberação da Sesai e Ministério da Saúde corre o risco de se perder na corrupção institucional”;
▪ “Exigimos a resolução da sobreposição de terras com máxima urgência, para acabar com as sobreposições de T.I. com unidades de conservação por isso pleiteamos que sejam declaradas terras indígenas”;
▪“Denunciamos que os povos que vivem na condição de isolamento correm risco de vida diante da ofensiva dos projetos hidrelétricos e expansão da agropecuária. Entre estes exigimos a inclusão da informação 70 no Rio Marmelo e na REBIO Jaru (Tarumã) e Jacundá para proteção antes de iniciar o processo de licenciamento da UHE Tabajara”;
▪“Denunciamos que as Unidades de Conservação que ocupam um papel fundamental no equilíbrio ecológico correm risco de serem desafetadas para dar lugar a lagos de usinas à exemplo do ocorrido no Parque Nacional Campos Amazônicos. Por isso reafirmamos nosso irrestrito apoio ao ICMBio no cumprimento de sua função e na não-violação do direito ecológico da Unidades de Conservação, respeito ao direito originário dos povos indígenas. Exigimos que também seja ouvida a equipe local do ICMBio caso haja propostas de construção de hidrelétricas ou qualquer outro tipo de empreendimento que impacte unidade de conservação”;
▪ “Denunciamos que a maioria das Terras Indígenas na Amazônia continuam sem o benefício do Programa Luz para Todos, embora é tido como público prioritário do programa, que antes mesmo de cumprir sua meta social já está em fase de extinção. Como potencializar os processos produtivos para gerar renda e qualidade de vida se a eletricidade não chega até nossas aldeias. Porque não utilizar o potencial de energia solar para atender as nossas demandas e para apoiar o funcionamento de sistema de comunicação (telefonia rural) benefício que até agora não chegou, deixando muitas aldeias isoladas e à mercê da própria sorte com a ausência total do Estado brasileiro”;
▪ “Deixamos claro que as políticas públicas devam atender os povos indígenas das aldeias e os que vivem nos centros urbanos por algum motivo, até porque o Brasil era todo nosso, logo não temos indígenas desaldeados, porque se moramos no Brasil fazemos parte desta grande aldeia que foi invadida há mais de 513 anos, que agora compartilhamos com os não-indígenas, tratada com muita falta de respeito infelizmente pelos invasores”
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