Sexta-feira, 1 de março de 2024 - 09h46
O pedido para criação do Tribunal de Justiça foi feito pela OAB-RO, mesmo no tempo do território federal. Houve o caso de um advogado síndico de prédio que fora erroneamente nomeado juiz temporário em Rondônia. Não havia Ministério Público, nem Defensor Público. “Eu fui nomeado defensor público diversas vezes, sem as garantias constitucionais, e quando promotor, com malária eu fui ao banheiro do hospital e tive a segurança do traficante a quem eu deveria acusar”, conta emocionado o decano fundador da Seccional, advogado Francisco Arquilau de Paula.
No cinquentenário da OABRO Arquilau de Paula descreve a luta dos advogados no período em que Rondônia só recorria a juízes temporários.
O conflito entre advogados e policiais era constante. “Provas eram conseguidas mediante tortura; evidente, a pessoa torturada, espancada, diz tudo para se ver livre da dor.”
A polícia arbitrária naquela época se deveu, conforme ele analisa, à ausência de uma polícia experiente: “Os delegados que precisavam sobreviver eram nomeados sem qualificação técnica e sem saber fazer perícia”, ele conta.
“Foi uma luta dura para conseguir que o Estado se organizasse e se preparasse com competência para tratar o réu com humanidade, respeito, isso está na Constituição, não era apenas o querer dos advogados, mas o que a justiça quer” – explica.
Presidindo a Seccional em 1981, Arquilau de Paula cobrava rigorosamente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) a ampliação da Justiça no território.
Naquele ano Rondônia tinha sete municípios: Porto Velho, Guajará-Mirim, mais antigos, e aqueles criados em 1977: Ariquemes, Vilhena, Ji-Paraná, Cacoal e Pimenta Bueno. No entanto, somente os dois primeiros contavam, quando tinham, com juízes e promotores.
“A falta de um Tribunal de Justiça em Rondônia mata mais que a fome” disse ele certa vez. Mas, em vez de represália, a OAB colheu os frutos da imediata designação de promotores e juízes temporários para Ji-Paraná e Vilhena.
“Tivemos algumas vezes que agir assim para fazer valer a OAB-RO. Brasília tratava Rondônia como uma lixeira. O juiz ficava abandonado, a Justiça amarrada e era difícil atuar”, depõe o advogado Pedro Origa Neto, duas vezes presidente da Seccional.
Arquilau de Paula lembra o maior nó górdio dos advogados: “Os juízes temporários desconheciam a realidade regional, pouco sabiam, e isso nos prejudicava sobremaneira.”
Ao site do Tribunal de Justiça, o ex-desembargador
Hélio Fonseca lembrava que naquele entre os anos 1950 e 1960, a Justiça de
Rondônia era subordinada ao Rio de Janeiro e depois de 1960 passou para
Brasília.
“O Tribunal ficava muito distante e não dava a menor
confiança para a justiça local. Tinham a justiça dos territórios como de
segunda classe, e isso desestimulava os juízes e promotores; quem vinha para cá
não tinha nem o direito de promoção, era nomeado Juiz e jamais chegaria a
desembargador do Tribunal de Justiça” – conta Fonseca.
“O promotor daqui jamais seria promovido para chegar ao
cargo de procurador, então a carreira morria” – relata o ex-desembargador.
Fonseca chegou a Rondônia em 1959 para ser promotor
público e assumiu como desembargador na criação do Poder Judiciário, em 1982.
Em declaração ao repórter, antes de presidir a Seccional, Origa Neto afirmava: “Se Brasília, com cerca de um milhão de habitantes, reclama que o Judiciário é inoperante, imagine-se a situação do território, onde somente dois juízes atendem uma população de 600 mil habitantes.”
Atualmente tudo é bem diferente daquele marcado pela falta de comunicação e difícil acesso. “Tempo em que os advogados tinham dificuldade em protocolar uma simples petição, pois nem sequer havia estradas adequadas, e as ações se concentravam em Ji-Paraná e Porto Velho”, assinala o advogado, ex-prefeito e ex-governador José de Abreu Bianco.
Quatro anos antes, em junho de 1977, o advogado e deputado Jerônimo Santana (MDB) analisava a criminalidade no território federal, condenando a ação de grileiros, a conivência da Secretaria de Segurança Pública e a falta de autonomia das cidades.
A respeito da prevenção à criminalidade e da reformulação da política fundiária regional, ele reivindicava a criação de comarcas e municípios nas vilas-cidades territoriais e a abertura imediata de concursos para juiz de Direito no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). “Chega de juízes temporários para preencher vagas existentes nos territórios!” – protestava Santana.
Ao mesmo tempo, e para todos também, pedia a organização de concurso na Procuradoria-Geral da Justiça do DF para promotores de Justiça, curadores e defensores públicos nos territórios – “especialmente em Rondônia” – ele frisava.
“Realmente sentíamos pena de nós todos, e a situação caótica entristecedora veio modificar-se de verdade somente a partir do funcionamento do Tribunal de Justiça”, avalia Origa Neto.
Diriam todos: ufa! Finalmente Rondônia teria juiz penal, juiz eleitoral, juiz de família, juiz de fazenda pública, juiz do trabalho e as seções da Justiça Federal.
Ao site do Tribunal de Justiça, o ex-desembargador Hélio Fonseca, que aqui chegou em 1959 para ser promotor público, declarava: “Naquele tempo a justiça daqui era subordinada ao Rio de Janeiro e, depois de 1960, passou para Brasília. O Tribunal ficava muito distante e não dava a menor confiança para a justiça local.”
Segundo Fonseca, a justiça dos territórios era mesmo vista como de segunda classe, o que desestimulava juízes e promotores. “Quem vinha para cá não tinha nem o direito de promoção, era nomeado juiz e jamais chegaria a desembargador do Tribunal de Justiça, e o promotor daqui jamais seria promovido para Brasília” – descrevia.
Ou seja, conforme Fonseca: “A carreira morria aqui, não se tinha um apoio psicológico, todos desanimavam.”
Funcionava mesmo uma justiça emprestada – de Brasília.
Para compor o Poder Judiciário houve uma exceção: o desembargador Dimas Fonseca assumiu, depois de pertencer ao quadro do TJDFT em Brasília.
O jornalista Lúcio Albuquerque lembra: “Em 1976, o advogado Olavo de Castro, conselheiro federal da OAB-DF cobrava no 1º Simpósio sobre a Justiça que os juízes lotados nos territórios, servindo nessas regiões, pudessem concorrer com os do DF às vagas no colégio de desembargadores.”
“Rondônia, Roraima e Amapá estavam ausentes, numa angustiante situação” – lamentava o advogado.
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