Sábado, 21 de julho de 2012 - 20h01
Deputado Nilton Capixaba e Samuel Saraiva, durante encontro em Brasília /DIVULGAÇÃO |
MONTEZUMA CRUZ
Editor de Amazônias
O exame de polígrafo (detector de mentiras) ou demais tecnologias para indiciados ou réus condenados poderá ser requerido em defesa de sua inocência. Projeto de lei nesse sentido será apresentado à Câmara dos Deputados, em agosto próximo, pelo deputado Nilton Capixaba (PTB-RO), oferecendo nova redação aos artigos 155 e 156 do Código de Processo Penal (CPP), com respectivos incisos.
“Espero que os juízes possam formar sua convicção pela livre apreciação da prova obtida em contraditório judicial”, diz o jornalista Samuel Saraiva, mentor da ideia. O projeto obriga o Estado a investigar quem for apontado pelo indiciado, ou réu, como autor, mandante do crime ou preparador do flagrante.
O polígrafo mede e grava registros de diversas variáveis fisiológicas durante o interrogatório ou depoimento. Também é conhecido como exame de detecção psicofisiológica de fraude. Segundo o projeto, as provas materiais e técnicas surgidas após a preclusão dos prazos do processo em primeiro grau serão consideradas pela instância superior, que determinará a abertura de novos prazos às partes no juízo próprio.
As falhas podem ocorrer no âmbito do Ministério Público, do juízo processante, ou da polícia, em prejuízo do réu, sustenta Saraiva, residente em Washington, D.C. “O projeto assimila a preocupação de cidadãos que já sofreram massacre moral e físico por parte de agentes do Estado, seja em cerco retaliatório por denúncias semelhantes às ocorridas em Brasília, em 1988, quando o então senador Olavo Pires (PTB-RO) – assassinado em 1992, em Porto Velho, após vencer o 1º turno da eleição para governador do Estado de Rondônia –; em consequência de flagrantes adredemente preparados por policiais ávidos pela fama e lucro; por erro de pessoa, quando alguém é reconhecido por testemunhas – a prostituta das provas, no meio jurídico – como autor do crime, ou porque se trata apenas de homônimo inocente.
"Deve-se excluir a palavra “exclusivamente” do texto do art. 155 do CPP e interpretá-lo sistematicamente, em consonância com os princípios e valores prestigiados pelo Estado, a fim de harmonizá-lo com o que consta de outras normas que compõem nosso sistema jurídico de um Estado Democrático de Direito", afirma Saraiva. "Qualquer prova não abrigada sob o manto do contraditório deve ser ignorada, sejam quais forem as “confissões” em delegacias sem a presença de um defensor, muitas vezes resumidas à palavra de quem armou um flagrante”.
Segundo o magistério de Aury Lopes Jr., em decorrência dessa inserção manteve-se a autorização legal para que juízes e tribunais se valham da versão dissimulada, muito em voga, de condenar com base na prova judicial cotejada com a do inquérito. "Conforme essa fórmula jurídica, não havendo no processo prova capaz de respaldar a condenação, o juiz pode valer-se do que está no inquérito, vulnerando a garantia de jurisdição e do contraditório", comenta Saraiva.
Ao juiz é permitido utilizar toda e qualquer prova inquisitorial para respaldar sua decisão. Num processo penal, a valorização do homem frente ao Estado se faz com observância de um progresso, segundo o qual, para uma condenação, em regra o julgador deve se ater tão somente à prova judicializada produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, como ressalta a primeira parte do artigo de lei em estudo.
Ampla defesa e inocência presumida
"A verdade real é tão somente um mito cultuado no processo penal, pois durante a instrução probatória há absoluta prevalência da “verdade processual”, que serve de alicerce ao juízo de convencimento do magistrado", afirma Saraiva. "Essa verdade deve sempre ser submetida à prova e oposição da defesa, jamais se permitindo o acolhimento das provas policiais sem que elas passem pelo crivo do contraditório, do devido processo legal e da ampla defesa, colunas constitucionais que sustentam as garantias individuais. Os incisos I a III, a serem adicionados ao art. 155 do CPP, homenageiam os princípios da ampla defesa e da inocência presumida”, explica.
Diante de interesses políticos do Estado, a verdade real, tão proclamada, é negligenciada e até atropelada. Segundo Saraiva, há diversos casos de juízes mancomunados com policiais em casos de flagrantes de droga adrede preparados: “Eles decretam a prisão preventiva de um acusado com maior capacidade de defesa, mesmo sem ocorrência de flagrante, ignoram a prova produzida em juízo em favor da versão policial e prolatam a sentença antes que o réu apresente a prova de suas alegações de defesa, ou seja, a prisão tem o desiderato de bloquear a ampla defesa, de encobrir a verdade”.
A justificativa do projeto menciona a existência de casos de “flagrante” de droga em que os agentes provocadores “fogem” ao cerco policial e nem sequer são processados. “Prova-se a materialidade do delito apenas com fotografias até inverossímeis e análise de material; tal qual o exame de fezes, o analista sabe do que se trata, mas ignora de onde saiu."
Com isso, observa Saraiva, “a condenação vem rápida, enquanto os principais envolvidos – no caso de droga – policiais estrangeiros ou brasileiros a serviço de estrangeiros fogem espetacularmente sem qualquer perseguição e nunca são apanhados pela lei”. Tal prática, ele assinala, é ilícita,
"Onde não há controle, inclusive sobre os estoques que incineram, está aberta a porteira da corrupção", alerta Samuel Saraiva |
imoral, e configura flagrante preparado, onde não há crime, segundo a Súmula 145 do STF.
Droga a mais
O caso dos irmãos do ex-deputado federal Jabes Rabelo (Rondônia) é um deles. A tese é o controle dos policiais, fazendo-os comparecer em juízo em qualquer tempo, até nas ações em sede de revisão criminal, um direito imprescritível do réu, está na justificativa. "A prisão desses indivíduos que pegam droga a custo zero, sem controle, pois declaram quantidades fantasiosas, enquanto a verdadeira droga some e nem na foto aparece, esclareceria a verdade e evitaria o crime maior, privando alguém de seu bom nome, de sua liberdade".
Menciona ainda a justificativa que, só para satisfazer a curiosidade de alguns, no processo do traficante Juca Galeano a polícia apreendeu 52 quilos e declarou 214, por causa dos prêmios da DEA (agência antidrogas dos EUA) e para impressionar a opinião pública; em Barretos (SP), apreendeu 54 kg (envolvendo um agente da DEA e o boliviano Juan Lopez Zuniga, irmão de um ex-ministro da Justiça da Bolívia), entretanto, declarou 130 kg, sem ao menos exibir a droga; em setembro de 1985, no município de Fernandópolis (SP), um delegado federal convenceu um colombiano a financiar com o dinheiro que trouxera para a compra de um avião (era dono de táxi aéreo em seu país) um carregamento de cocaína, que chegou unicamente em duas maletas, uma com 12 kg e outra com 15, 8 kg, devidamente escamoteadas. Apresentaram 140 kg apenas em foto, sem o cuidado mínimo de tornar verossímil a carga – embaladas em 42 pacotes transparentes, moles, cujo peso variava de 1,3 kg a 3,5 kg.
Um desses pacotes foi fotografado sobre a alavanca de flaps do Sêneca II e afundava-se contra ela, quando se sabe que coca refinada, como dizem ter apreendido, é dura; as embalagens de bolsas plásticas são protegidas com fita adesiva; e os pacotes têm peso igual, geralmente um quilo líquido, pois o grama dele valia mais que um grama de ouro. Nunca em pacotes com tamanha variedade, brancos, transparentes, sem proteção alguma, especialmente se for considerado que seriam descarregados em plena tarde num aeroporto onde havia um administrador com uma bomba para abastecimento das aeronaves.
O juiz sentenciante de primeiro grau mentiu na sentença de forma vergonhosa e o de segundo grau, no TRF, abraçou-a parcialmente, apesar dos absurdos e invenções autoverificáveis do juízo “a quo”, com total desprezo do princípio in dúbio pro reu, talvez porque tenha sido influenciado politicamente – era desses ministros políticos, oriundo do gabinete do ministro Leitão de Abreu, no final do governo João Figueiredo, e a cúpula do DPF, onde pontificava o depois senador Romeu Tuma, tinha interesse na condenação a qualquer custo.
A fuga de dois elementos que estavam presentes durante a campana de dez dias (“flagrante de Fernandópolis”) inclusive um deles se encontrava no aeroporto junto com o colombiano que financiara o negócio infame, impossibilitou que a realidade aparecesse. O delegado federal que serviu como agente provocador no papel de grande rico empresário de Fernandópolis foi identificado por dois acusados, quase dois anos depois.
Fora do alcance da lei
“Por não serem fiscalizados, esses preparadores de flagrantes eram e são tentados a vender a droga que obtinham ou ainda podem obter a custo zero para eles, mas a custo alto para a sociedade”, alerta Saraiva.
Apesar das denúncias a quatro ministros da Justiça, desde Maurício Correia a Marcio Thomaz Bastos, com pedido de abertura de sindicância e até de acareação com ele para fins de prova em sede revisional, ou, ao menos, a oitiva de dois policiais federais que o reconheceram quando lhes foi exibido um teipe do programa Goulart de Andrade no SBT, em três de maio de 1987, nada se fez. O policial, que também se “evadiu”, blindou-se, fora do alcance da lei, enquanto suas vítimas ainda amargam as consequências da sentença e do longo encarceramento. Elegeu-se deputado com a ajuda de milícias, segundo denúncias do deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ).
Pego na CPI da Pirataria presidida pelo deputado Luiz Antônio de Medeiros em 2002, um juiz de 1ª instância foi afastado pelo TJ-SP, entretanto voltou ao cargo após dez anos, porque o crime prescreveu. Ganhou absolvição pela inércia do Tribunal, perdendo-se o esforço da Câmara dos Deputados para eliminar a corrupção. O delegado federal José Augusto Bellini, que chefiou o conhecido “flagrante de Fernandópolis” também foi pego nessa CPI e preso. Nada disso, porém alterou o dano causado às vítimas do flagrante preparado.
Em entrevista na TV Bandeirantes no dia 28/11/1994, o então senador Romeu Tuma declarou sem rodeios que agentes da DEA aprontavam flagrantes no Brasil e eles, policiais federais, tinham de deixar fugir os agentes provocadores para que não respondessem a processo. Confessava com naturalidade a conivência com operações ilegais de estrangeiros no Brasil, que redundavam em prisões custosas, ao longo de anos, ao Tesouro Nacional.
“Onde não há controle, inclusive sobre os estoques que incineram, está aberta a porteira da corrupção. Eles armam os flagrantes (antigamente a DEA pagava aos policiais um mil dólares por quilo “apreendido”) e a sociedade brasileira pagava e paga o custo do processo e do encarceramento das vítimas do ardil. Isso é inaceitável", acrescenta Saraiva.
“Quem não deve, não teme”, lembra jurista
Lembrando que o Brasil é signatário do Pacto de São José da Costa Rica, sobre direitos humanos para os membros da Organização dos Estados Americanos, o jurista Maurício Gomes Pinto, de São Paulo, manifesta-se favoravelmente ao exame pelo polígrafo: “A recusa certamente fortaleceria a convicção do juiz pela culpa do acusado; o raciocínio é simples e vem da velha máxima segundo a qual quem não deve não teme”, ele assinala, com base num estudo do professor de Direito Civil Sandro Marino Duarte.
Segundo ele, a legislação nacional prevê algumas disposições que aceitam a presunção de veracidade no caso de omissão. “O artigo 8º, alínea “g”, ressalta que ninguém é obrigado a fazer prova contra si, logo a lei não passaria se tornasse obrigatória a submissão do acusado ao teste do polígrafo. Entretanto, o juiz pode apreciar livremente o conjunto probatório e decidir de acordo com a sua convicção”.
Pinto comenta no âmbito civil, em especial no direito de família, os casos de ação de investigação de paternidade: “Se a pessoa se recusar a fazer o exame de DNA, a paternidade é presumida, pois o art. 232 do Código Civil determina que a recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame”.
“A adoção do polígrafo não pode ser obrigatória, porém a sua recusa causaria uma presunção de veracidade que chamamos de hominis, descrita por Marino Duarte. É aquela que não está na lei, mas, efetivamente, no homem, significando o ser humano como ideia e coletividade, não como indivíduo. É a presunção que se funda na experiência de vida, no fato comum, na sabedoria popular, no que geralmente se pensa, no espírito de um povo, na alma comum, no que define o homem”. (M.C.)
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