Invento “ambientalmente correto” atende áreas isoladas no Estado do Acre.
MONTEZUMA CRUZ
Agência Amazônia
SENA MADUREIRA e RIO BRANCO, AC – Numa casa simples de taipa, às margens do rio Juruá, dona Raimunda Estevão de Brito, 47 anos, mãe de três filhos, aguarda com expectativa o momento de ver funcionar o seu fogão a lenha Geralux, que cozinha e ao mesmo tempo produz energia suficiente para ligar, simultaneamente, uma TV, um rádio, oito lâmpadas e até um pequeno computador.
Moradora numa pequena área cercada por igarapés, situada a meia hora de lancha voadeira da barranca do rio, em Sena Madureira (distante 144 quilômetros de Rio Branco), ela faz parte da lista de trezentas famílias isoladas que ganharão o fogão Geralux no próximo ano. Os primeiros fogões foram instalados em casas de seringueiros, que moram em áreas da floresta aonde só se chega a pé ou de canoa.
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Sato, o criador do Geralux, explica o funcionamento do fogão a um casal de seringueiros /GOV.ACRE
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O município de Xapuri também reivindica algumas unidades para seus seringueiros. Até o mês passado, mais de 80 fogões haviam sido fabricados. Dona Raimunda, de Sena Madureira, faz parte das 25 mil famílias isoladas que deverão ser atendidas pelo Programa Luz para Todos, do Governo Federal. “Os fogões serão doados”, anuncia Alcides Santos, do Centro Referência de Energia de Fontes Renováveis. Seu colega Alexandre Médici Aguiar é o responsável pelo levantamento de campo.
Projetado pelo engenheiro paraense Ronaldo Muneo Sato, esse fogão tanto agradou que a Fundação de Tecnologia do Estado do Acre (Funtac) ofereceu-o à empresa mineira BMG Lux, responsável por sua fabricação no Parque Industrial de Rio Branco. Com o invento, Sato é vencedor do Prêmio Finep da Região Norte.
Retém a fuligem
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Modelo antigo e modelo novo: tecnologia "vendida" pela Funtac despertou interesse nacional /JANE DANTAS
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Para a Funtac, o Geralux é também “mais ambientalmente correto do que os fogões tradicionais”: economiza até 50% da biomassa hoje empregada, além de reter toda a fuligem no próprio fogão. A inalação de fuligem é apontada pela Organização Mundial de Saúde como a 8ª causa de morte no Brasil. Lá se vai a fumaça pela chaminé, sem poluir o interior da casa. E o consumo de lenha cai pela metade.
O Geralux não utiliza caldeira. Isso simplifica sua construção e reduz riscos de acidentes. O vapor gerado no trocador de calor é transformado em energia mecânica e, a seguir, elétrica. A energia é armazenada em uma bateria comum de automóvel – cerca de 30% de sua carga é suficiente para a iluminação da residência em um período de quatro a cinco horas.
Vice-prefeito sobe e desce
o rio para cadastrar famílias
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A coordenadora estadual Programa Luz Para Todos, Nadma Kunrath, atende às regiões isoladas do Acre /ALTEVIR PAULO
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RESEX CAZUMBÁ-IRACEMA – Um kit distribuído pelas Centrais Elétricas do Norte Brasileiro (Eletronorte) e pela Prefeitura de Sena Madureira possibilita ao seringueiro optar por um motor de popa de 5,5 HP e uma canoa, ou pelo fogão Geralux. “Cada família sabe do que mais necessita. Algumas precisam dos dois recursos”, explica à Agência Amazônia o vice-prefeito de Sena, Jairo Cassiano. Ele é o responsável pelo cadastramento das famílias interessadas por essas benfeitorias nas reservas extrativistas Cazumbá-Iracema e Macauã, fazendo a cada mês um vaivém às áreas isoladas.
“Na verdade, todos os que moram longe das cidades e ainda não desfrutam de energia elétrica, querem ter logo o fogão. Vão desfrutar de um mínimo de conforto”, comenta Cassiano. Ele tem na ponta da língua e repete o caso do carteiro terceirizado Raimundo Maia, que remou durante 15 anos pelos rios da região, para exercer a sua profissão a serviço dos Correios. “Seu Raimundo tem nove filhos e cada um possui um motor”, disse. “Logo terá energia elétrica também”, promete.
A complexidade das regiões mais distantes, o difícil acesso e a impossibilidade de se fazer um atendimento com rede convencional às comunidades isoladas, fez surgir um grupo de trabalho formado por representantes do Governo do Estado, Eletroacre, Eletronorte, Universidade Federal do Acre e Funtac, para garantir a instalação de soluções tecnológicas, alternativas, entre as quais, o uso de fontes renováveis que possibilitem às comunidades tradicionais, o acesso à energia, aos processos produtivos, a educação e à cidadania.
Levantamento feito até agora aponta 560 km de rede com linhas convencionais trifásicas e posteamento. A coordenadora estadual do Programa Luz para Todos, engenheira florestal Nadma Farias Kunrath, visitou as reservas e sentiu a receptividade dos seringueiros e ribeirinhos ao kit de energia. Deverá voltar algumas vezes lá, para distribuir kits e inaugurar sistemas de distribuição. (M.C.)
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Fonte: Montezuma Cruz - A Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião
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