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Stefane Leite Nogueira mostra o pé-de-moleque acreano, campeão de vendas /FOTOS MONTEZUMA CRUZ
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ANA MARIA MEJIA
Amazônias
RIO BRANCO, Acre — Os olhos demoram a se acostumar ao contraste entre a claridade externa do sol e a sombra que predomina no interior do prédio onde funciona o Mercado Municipal Elias Mansour, na capital acreana.
No rebuliço do entra e sai, das vozes que informam preços, que chamam fregueses, o colorido da banca com múltiplos tons de verde desperta outros sentidos. Hortelã pimenta, algodão roxo, alfavaca estão nas bancas. O cravo da vitória se destaca. É uma planta com folhas rendadas e dá uma flor amarela ou alaranjada. Por isso também o denominam “cravo amarelo”.
— Quanta planta! – exclama a turista, alma de repórter. Cada uma tem sua serventia, vai logo explicando Maria José Campos Silva, que cultiva e também colhe as plantas nascidas espontaneamente na Chácara do Calafate, onde mora.
Chá de hortelã pimenta é bom para o estômago e auxilia na digestão. Algodão roxo combate hemorragias uterinas, problemas hormonais e infecções urinárias. Alfavaca é diurética, cicatrizante e relaxante. O cravo da vitória, novo nome do conhecido cravo de defunto, é usado para combater dengue (
texto abaixo).
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Ouricuri, apreciadíssimo pelo ser humano e por animais. Tem sabor especial e deixa um travo na boca
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Registre-se que, há dez anos, o médico Radjalma Cabral ajudou a saúde pública a combater uma epidemia de dengue numa área de inundação, ideal para a proliferação do mosquito transmissor da doença, o Aedes aegypti.
Embrapa coleta besouros
Usado em chás, banhos, compressas, as plantas curam todo tipo de doenças. Maria José anima-se com o interesse da repórter e conta o que já vem ocorrendo há um ano na periferia de Rio Branco:
— O pessoal da Embrapa andou lá pela chácara para coletar besouros. Eles estão fazendo pesquisa. Se for melhor para nós, vai ser bom.
De repente, os olhos se enchem de curiosidade com a diversidade de cocos — na verdade, o mesmo coco ouricuri, mas, segundo os vendedores meio maduros, pequenos e grandes. Sebastião Cavalcante Ferreira, 74 anos, se anima em contar sua rotina. Ele traz coco, castanha e frutas de época para vender no mercado. Parte do trajeto é feito de canoa a remo, ou a motor e a outra ele percorre a pé.
Da mesma forma que o tucumã, o ouricuri é apreciadíssimo pelo ser humano e por animais. Casca marrom, parte interna amarelada, tem um sabor tão especial que deixa um travo na boca.
Também Rosemildo Carlos da Silva, 48, três filhas se ocupa em recolher os frutos do coco nas áreas de mata próximo ao bairro Belo Jardim para vendê-los no mercado. Há 30 anos morador da capital acreana, ele vende o cesto a R$ 4,00. O cento custa R$ 40,00.
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O amplo Mercado Municipal Elias Mansour
é ponto obrigatório para as compras dos acreanos
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Bolo de macaxeira, sabor de banana
Na banca ao lado, o jeito desconfiado das meninas é logo substituído pela curiosidade. Elas observam a máquina fotográfica, o bloco de anotações, riem, abaixam os olhos e tornam a sorrir.
Marta Lúcia de Souza, 27, moradora de Belo Jardim I é quem comanda o negócio. Vende pé-de-moleque, bolo de macaxeira, tapioca servida com coco e castanha. Três vezes por semana, junto com filhos, irmãs e parentes, ela deixa a casa e traz a produção, preparada ao longo da semana.
No quintal, planta macaxeira que serve para preparar a farinha e a goma para a tapioca. Ganha entre R$250,00 e R$ 300 por semana. Não reclama.
— A vida é uma rotina pesada, mas vale a pena. Os meninos estão na escola, estudam e a gente precisa trabalhar — diz.
— Esse bolo é de banana?
Mais risos. É o pé-de-moleque feito de macaxeira com um leve gosto de banana. O segredo? Bem, primeiro é preciso deixar a mandioca ficar puba, o que se consegue deixando-a descascada e imersa na água uns dois ou três dias; depois misturar a massa com manteiga, sal, óleo, sem fermento, um pouquinho de cravo da índia e assar no forno a lenha na folha da bananeira! Diferente.
Para a dengue, basta o chá do cravo da vitória
MONTEZUMA CRUZ
Amazônias
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Maria José vende verduras e cultiva plantas nascidas espontaneamente na Chácara do Calafate, entre as quais, o cravo da vitória
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RIO BRANCO — Andando para lá e para cá, o médico e pesquisador Radjalma Cabral de Lima divulga o cravo da vitória (
Tagetes erecta L), com o qual conseguiu atenuar surtos da dengue no Acre, na Bahia, em Alagoas e Pernambuco.
No ano passado encantou cerca de 60 pessoas numa palestra feita no Pré Núcleo Luz do Oriente, do Centro Espírita União do Vegetal, situado na zona rural de Brazlândia, a 50 quilômetros do Plano Piloto de Brasília.
O cravo da vitória, usado desde o período dos Astecas, na América Central, nasce em qualquer lugar do Brasil. Com zelo no que relata, Lima conta que ainda há preconceito contra o seu trabalho. Mesmo expondo os convites de secretarias de saúde e o próprio reconhecimento público da Fundação Nacional de Saúde (FNS), ele ainda se depara com situações constrangedoras causadas por quem desconhece o uso de plantas para fins terapêuticos.
Sempre auxiliando
— Meu trabalho é auxiliar a estancar a doença, apenas com o uso desse chá de uma erva comum. Não prometo curas, deixo bem claro. Demonstro que a prevenção é importante e, sobretudo, possível.
A dengue está de volta aos estados do centro-oeste e do norte brasileiros. Quando a situação aperta, convocam Lima para demonstrar a força desse cravo que não implica gastos nem possui contra-indicações.
O médico especializou-se em plantas medicinais e homeopatia. Trabalhou durante algum tempo no Centro de Saúde do Tucumã, em Rio Branco. Pós-graduado em fitoterapia especializou-se em homeopatia e chegou a ser membro do Conselho dos Direitos da Pessoa Idosa na capital acreana. Agora se dedica ao consultório montado no município de Coração de Maria, perto de Feira de Santana, na Bahia. Levou para essa localidade as experiências anteriores, no Acre.
— Quem renomeou o cravo, tirando a palavra defunto e acrescentando a palavra vitória foram as equipes de Saúde da Família em Rio Branco – ele conta, satisfeito. É simples e comovente o raciocínio de Lima:
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Sebastião Ferreira, 74 anos: castanhas em saquinhos plásticos |
— Antes da descoberta da penicilina e da aspirina — a primeira extraída de um fungo (cogumelo) e a segunda, do salgueiro (árvore conhecida por chorão) —, as pessoas sempre se trataram e sobreviveram usando ervas e outros produtos naturais. Infelizmente, esse conhecimento tradicional foi desprezado porque não tinha base científica — lamenta.
Como é
O remédio consiste no uso de dez folhas inteiras do cravo. São fervidas. Em seguida, bebe-se o chá ainda morno, no menor espaço de tempo para não perder seus princípios ativos. Depois, de duas horas, pode-se repeti-lo sucessivamente enquanto durar ou ressurgir os sintomas.
— Sempre com a infusão morna, pois compromete o tratamento se tomá-la fria ou gelada. Não se precisa de outro medicamento e não tem contra-indicação como no caso de se tratar a doença com o ácido acetilsalicílico — reforça.
O cravo vem sendo estudado nos Estados Unidos para a obtenção da substância “luteína” e seus efeitos na medicina. Pesquisas indicam que a erva ainda serve para combater outras doenças, entre as quais, angina, tosse, espasmos, reumatismo e cólicas uterinas.
Pelo trabalho desenvolvido no Acre, ele participou da premiação “Sérgio Arouca de Gestão Participativa” no Sistema Único de Saúde e na 3ª Mostra Nacional de Proteção e Saúde da Família, em 2.008, evento paralelo ao 4º Seminário Internacional de Atenção Primária à Saúde da Família do Ministério da Saúde. A capital do País conhece os seus feitos.
E agora, flores no caminhão
ANA MARIA MEJIA (*)
Amazônias
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Flores vendidas no mercado agora estão em feira itinerante, num caminhão /MARCOS VICENTTI–AscomRB
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RIO BRANCO – A Associação Florescer uniu-se à Empresa Municipal de Urbanização de Rio Branco (Emurb) e ao Sebrae, conseguiu um caminhão e colocou à venda diversas variedades de flores. O negócio tem a participação de 32 produtoras de mudas acostumadas a vendê-las no ponto fixo do grupo, no mercado municipal e nas férias livres dos bairros.
Associação e Emurb pretendem divulgar agora os dias específicos de venda, às quartas, quintas, sextas e sábados. No caminhão das flores, todas as associadas obtêm espaço garantido para apresentar a “safra” de flores.
— Cada qual pode oferecer 15 mudas — informa a coordenadora do Projeto Jardinagem Comunitária, Elizângela Pontes. Segundo ela, o caminhão possibilitou a melhoria de renda, autonomia para as mulheres e a valorização do meio ambiente.
— Com o caminhão, as mulheres recebem apoio nas vendas e comercialização de seus produtos e esse é um interesse da Coordenadoria da Mulher, em proporcionar emprego e renda para mulheres e famílias sob risco social.
Elizângela Pontes reconhece que, sem o apoio dos nossos parceiros e do Governo Estadual, esse projeto não decolaria. Há cinco anos, a Coordenadoria da Municipal da Mulher desenvolve o projeto Jardinagem Comunitária: Flores e Folhas da Amazônia. Já possui oito núcleos, alguns deles na rural.
(*) Com informações da Assessoria de Comunicação Social da Prefeitura Municipal de Rio Branco. Conheça o site da Prefeitura.
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