MONTEZUMA CRUZ
Sem qualquer perplexidade, o mundo toma conhecimento da hipótese de que a nascente do Rio Amazonas começaria no Rio Apacheta e não no Córrego Carhuasanta, no pico nevado Mismi, nos andes peruanos, a 5.597 metros de altitude.
Rio Amazonas tem 6.750 quilômetros de extensão. Nenhum governo da região amazônica, nenhuma entidade não-governamental ousou comprová-la ou contestá-la. Houve, sim, muito interesse em se ler todas as notícias a respeito. E elas convergiram para o trabalho de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Dois peruanos do Instituto Geográfico do país vizinho participaram ativamente da expedição.
EDe acordo com os cientistas do Inpe, o trecho da nascente de Carhuasanta, localizada no pico de Mismi, tem dez quilômetros, contra 54 do córrego Apacheta, no Monte Queuisha. Assim, uma vez que Apacheta seja comprovada como a mais distante da foz, a medida, sugerida pelo Inpe, ficará em 6.992 quilômetros.
Prevalecendo a hipótese da mais recente pesquisa, comprovadas as distâncias e reconhecida a nova situação, milhares de citações enciclopédicas e milhões de exemplares de livros escolares terão de ser modificados.
Uma equipe do instituto retornou daquela região no início de junho e começa a encampar tese a respeito. Lembro-me do que disse o jornalista Silvestre Gorgulho em seu blog: “Q
ue me perdoem os Nilos, os Eufrates, os Ganges, os Danúbios, os Mississipis, os Yang Tsés, os Renos e os Tejos. Mas rio imponente, exuberante e místico é o rio Amazonas. Tão misterioso e tão fantástico que até hoje sua nascente é um mito e sua foz uma lenda. É tão descomunal que nem se sabe se o Amazonas deságua em estuário ou delta”.
A Wikipédia explica: um estuário é a parte de um rio que se encontra em contato com o mar. Por esta razão, um estuário sofre a influência das marés e possui tipicamente água e salobra. Do ponto de vista da ecologia e da oceanografia, um estuário é uma região semi-fechada do oceano influenciada pelas descargas de água doce de terra, quer seja um ou mais rios, ou apenas da drenagem do continente. Muitas vezes, usa-se a palavra estuário em contraposição ao delta, onde o rio se mistura com o mar através de vários canais ou braços do delta. No entanto, um delta pode considerar-se também uma região estuarina. Já um “mar interior” igual ao Mar Báltico pode apresentar em toda a sua extensão as características de um estuário.
Com a palavra, o sábio professor Aziz Ab’Saber, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo: “Quando eu era aluno em Geografia Física me perguntavam se a embocadura do Amazonas é um delta ou estuário. Eu nada podia responder e o professor também não! Então, ele dizia: “Na falta de conhecimentos mais precisos, vamos considerar que se trata de um delta estuarino?”.
Segundo Ab’Saber, hoje em dia se pode dizer, com certeza, que a boca norte do Amazonas é um estuário com uma saída fantástica de argila. “Trata-se do rio mais sujo do mundo em relação à quantidade de sedimentos finos que lança mar afora. A saída do Amazonas emboca no mar, à frente de Marajó e do Amapá, chegando à costa do Pará e até às proximidades da costa noroeste do Maranhão”, ele diz.
Outra lembrança do geógrafo: um grupo de portugueses, ainda no início da colonização, partiu de barco de Belém (Pará), seguindo para a Fortaleza de São José, no Amapá. Nesse percurso pelo mar, a um certo momento, os marinheiros já começavam a padecer de muita sede, sem energias para prosseguir, quando observaram um índio que os acompanhava na viagem caminhando e trabalhando pelo barco normalmente. Ele sabia algo que os demais não podiam sequer desconfiar: aquela água, apesar de estarem navegando em pleno mar, não era totalmente salgada e que, apesar de conter bastante argila, ainda era água doce, potável.
“A Amazônia guarda segredos que nós, cientistas, nem podemos supor”, observou.
A verdade, nada mais do que a verdade. É o que teremos brevemente, do raciocínio e da boca de experientes cientistas que visitaram os andes peruanos e de lá saíram convictos do êxito de sua missão. Com o cuidado, porém, de invocar o princípio socrático: “Só sei que nada sei”.m 1996, uma expedição chefiada pelo polonês Jacek Pavkleviez, membro da Royal Geographic Society, situou o ponto inicial do Amazonas na quebrada Apacheta, província de Caylloma, em Arequipa, a 5.170 metros de altitude, na Cordilheira de Chila.