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Montezuma Cruz

Pesquisador sonha com pelo menos mil roças sem fogo no Pará


 

Fogo já foi mal necessário ao País. Segundo Raimundo Brabo, a Amazônia Ocidental se antecipa para evitar queimadas

 

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MONTEZUMA CRUZ
montezumacruz@agenciaamazonia.com.br  

ABAETETUBA e ALTO ITACURUÇÁ, PA – A Amazônia Ocidental adiantou-se para aplicar programas de substituição de queimadas, originalmente nascidos na Amazônia Oriental. Esta é a visão do coordenador do Núcleo de Apoio à Pesquisa e Transferência de Tecnologia da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), no Baixo Tocantins, Raimundo Nonato Brabo Alves. Ele aguarda resposta das secretarias de agricultura e do meio ambiente do Pará à sua sugestão para que o estado adote imediatamente um programa de mil roças sem fogo.

Percorrendo lavouras de mandioca que seguiram o seu consagrado projeto do trio da produtividade, Brabo Alves notou na agricultura familiar, em Alto Itacuruçá, roçados de oito meses de idade com u

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Verde que te quero verde: esta é uma promissora lavoura de mandioca no modelo do trio da produtividade, em Moju, a 68 Km de Belém /RAIMUNDO BRABO

ma produtividade média equivalente a 15 t/ha de raiz de mandioca. “Se prosseguirmos nesse ritmo, vamos obter muito mais, mas é preciso o envolvimento de todos os órgãos do governo para destinar recursos financeiros e estruturar o programa da maneira como ele deve ser feito”, comentou à Agência Amazônia.

Junto com outros pesquisadores da Embrapa, entre os quais, Otávio Lopes, Milton Kanashiro, Eduardo Maklouf, Manoel Cravo e Osvaldo Kato, o coordenador vê a urgente necessidade de se adotar todos os mecanismos possíveis para a valorização do solo paraense, pelo menos nas regiões nordeste e do Baixo Tocantins, onde se pratica a roça sem fogo e o agroextrativismo de resultados. Daí, ele insistir em políticas públicas efetivas não apenas do Pará, mas de todos os estados amazônicos: “Aquelas que preservem de verdade a diversidade, que é a nossa grande riqueza", assinalou. 


Carbono nas árvores
 

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Brabo Alves: "Esse fazer deve ser voluntário, antes que se torne compulsório" /M.CRUZ

Em maio deste ano, durante um seminário com a participação de representantes de populações indígenas e tradicionais, em Brasília, divulgou-se que 15 bilhões de toneladas de carbono estão nas árvores dos 100 milhões de hectares de terras indígenas e reservas extrativistas. Conforme o Instituto de Pesquisas da Amazônia (Ipam), esse volume é 30% das 47 bilhões de toneladas de carbono espalhadas nos troncos, galhos e no solo das florestas da região. Ou seja, oito vezes o esforço mundial de reduzir a emissão de gases-estufa prevista no primeiro período do Protocolo de Kyoto.

Brabo Alves acredita que a Embrapa Amazônia Oriental esteja fazendo a sua parte no controle das emissões de carbono na atmosfera. Mas alerta: “De nada adiantaria produzirmos essas tecnologias, se não vencêssemos as barreiras dos interesses econômicos para chegar a quem realmente precisa”. Vê-se, portanto, que os estudos científicos da roça sem fogo devem ser aplicados em parceria com os governos, prefeituras, com a sociedade e os próprios agricultores. “O conhecimento científico é importante sim, mas que nós também temos muito a aprender com os pequenos produtores e isso é a nossa realidade por aqui”, ele diz. 


Mato Grosso, Rondônia e Acre

De acordo com a organização não-governamental Iniciativa Verde, as queimadas na Amazônia respondem por aproximadamente 70% das emissões brasileiras de gases do efeito estufa. “O mais urgente, em questão de mudança climática, é estancar as queimadas na Amazônia a qualquer custo. É inadmissível que o País tenha essa postura indolente em relação a um crime ambiental dessa monta”, apela o diretor da Iniciativa Verde, Osvaldo Martins. 
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Técnicos da Emater reunem-se com produtores em Alto Itacuruçá, para avaliar os resultados do trio da produtividade /DIVULGAÇÃO



Embora tenha reduzido em quase 60% a incidência de queimadas em 2008, Mato Grosso ainda apresentou 74.414 focos de calor ao longo do ano, de acordo com o monitoramento por satélites termais realizado pelo Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam).

Por ser o estado que sofre maior pressão ambiental devido ao desenvolvimento da agropecuária, o Mato Grosso segue à frente dos demais analisados no estudo do Sipam. O Acre registrou 1.933 pontos em 2008, enquanto Rondônia teve 14.157 focos. As ocorrências retomaram a tendência de redução observada nos anos anteriores a 2007.

Rondônia manteve a tendência de queda registrada desde 2005, registrando 14.157 focos de calor. Nos meses de agosto a outubro as ocorrências corresponderam a 94% desse total. A maioria das queimadas acontece no norte e sudoeste do Estado. Os municípios de Porto Velho, Machadinho do Oeste, Cujubim e Costa Marques os mais atingidos.

“Se relacionada a área do município com o número de focos, São Francisco do Guaporé leva a primeira posição. No estado, o fogo ocorre mais em áreas particulares e de desmatamento antigo (43%), mas assentamentos, unidades de conservação e mesmo as terras indígenas aumentaram suas queimadas, representando juntos cerca de 44% do total”, analisa o Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam). Entre esses, a Floresta Nacional do Bom Futuro se destaca com a ocorrência de 1.007 focos. (M.C.) 


Pesquisadores querem levar o “sacerdócio” ao Acre
 

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Cenário tétrico do fogo para a formação de pastagens ou renovação de lavouras motiva um grande debate no Pará /DIVULGAÇÃO

BELÉM – No Acre, o Ministério Público Federal moveu uma ação civil pública para tentar extinguir o uso do fogo como instrumento de plantio e exigiu do governo estadual e das prefeituras uma alternativa às seculares queimadas. Teve início uma batalha, envolvendo a Federação dos Trabalhadores Rurais, o governo, prefeitos e representantes de órgãos ambientais.

O MP quer solução para o problema até 2011, no entanto, aceita o período de transição de três anos proposto pelos trabalhadores rurais para que seja cumprida a proibição total das queimadas. Além disso, a proibição total ficaria condicionada à avaliação judicial, instruída a partir de audiências públicas nos municípios e desde que haja cumprimento das medidas de assistência técnica e material, de acordo com as condições dos produtores rurais.

Nessa circunstância, o deputado Fernando Melo (PT-AC), membro da Comissão de Amazônia da Câmara, se reuniu com o chefe da Embrapa no Acre, pesquisador Judson Valentim, para levar ao Estado o pesquisador Brabo Alves e colegas dele. “Esses pesquisadores da Embrapa Amazônia Oriental acumulam boas experiências e teriam a missão de explicar como funcionam programas conservacionistas da instituição no Pará. “Precisamos buscar sustentabilidade de fato, porque só assim ultrapassamos com todas as letras o nosso discurso”, argumenta o parlamentar. 

Mas o método difundido pela Embrapa desde os anos 1990 é um desafio a superar. Por que mudar essa herança cultural que se tornou indigna? – questiona Brabo Alves. Ele próprio define: “Porque está arraigada no pequeno produtor. É um sacerdócio, já que exige mudança de cabeça”. Nas gincanas com os produtores ele recorda que nos anos 1970 o fogo era tido como um “mal necessário”. Agora, o Brasil é o quarto país em emissões de carbono. 

Para o pesquisador, esse fazer deve ser voluntário, sob pena de se tornar compulsório. Caso do Acre, onde os procuradores da Justiça Federal querem que o governo ponha em prática um propalado “Estado da Florestania” ou “da sustentabilidade”. Vem funcionando no Pará graças à somatória dos orçamentos disponíveis – das prefeituras, dos sindicatos, da Emater e da Embrapa. “Sozinhos, não faríamos tudo isso”, explica Brabo.

Desmatamento, o maior vilão. Até quando? 

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Identificação de lavouras com consorciamento de açaí e cupuaçu, na região nordeste do Pará / M.CRUZ

BELÉM – Aproxima-se agosto. As queimadas em estados amazônicos estão novamente na ordem do dia. Para preveni-las, o Sipam promoveu sucessivas reuniões em Rondônia e no Acre, com a participação de representantes de órgãos da defesa Civil, secretarias de agricultura, de meio ambiente, florestas e de produção.

Segundo o secretário de meio ambiente do Acre, Eufran Amaral, há uma consciência geral quanto às conseqüências, mas ainda faltam recursos para substituir essa prática. Recentemente, o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), José Marengo, afirmou que as queimadas se associam ao desmatamento. “O País é ecologicamente correto na geração de energia, já que 80% da principal fonte energética do país (a energia elétrica) saem de hidrelétricas”, entende o Ministério do Meio Ambiente.

O Brasil possui um programa de substituição de combustíveis fósseis por renováveis, o Programa Nacional do Biodiesel. No momento, o etanol (nome científico do álcool da cana-de-açúcar) alcança 45% da matriz energética brasileira e a mandioca já obteve aprovação para também se transformar em bioetanol.

Entre 2006 e 2008, o governo brasileiro conseguiu reduzir em 52% o desmatamento na Amazônia. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, essa redução evitou a emissão de cerca de 430 milhões de toneladas de gás carbônico na atmosfera. Outra atitude tomada para evitar as queimadas foi a criação de novas unidades de conservação federal, que atualmente já superam 50 milhões de hectares. (M.C.)

PRECISA MELHORAR

● Segundo o IBGE, em 2006 o município de Abaetetuba obteve uma produção de 1.200 toneladas de raiz, com uma produtividade média de 12 t/ha. Contudo, os agrônomos Raimundo Brabo e Moisés Modesto, da Embrapa Amazônia Oriental, na comunidade de quilombolas a produtividade média dos agricultores familiares está ainda mais baixa, com apenas 10,23 t/ha de raiz de mandioca.

● Seculares, as queimadas são usadas geralmente para preparar o solo e limpar o terreno, mas constituem crime ambiental quando feitas sem autorização e sem levar em consideração técnicas de controle. É o que se chama de descontrole. O Ministério Público no Acre deu prazo ao governo e aos prefeitos para que ponham fim às queimadas até 2011.

● O fogo, sobretudo em áreas de floresta, elimina a vegetação e permite a incorporação da área a atividades econômicas, muitas vezes ilícitas.

● A época seca é escolhida para se fazer queimadas, porque favorece a propagação do fogo na vegetação. O auge da seca, de agosto a outubro, corresponde a 81% das queimadas anuais.

● Em Mato Grosso, a maioria das queimadas ocorrem no centro e no nordeste do Estado, especialmente nos municípios de São Félix do Araguaia e Nova Maringá. Quando estabelecida relação entre o tamanho do município e o número de focos de calor, Luciara, Itanhangá e Alto Boa Vista despontam entre os que mais queimam. (M.C.) 


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Fonte: Montezuma Cruz - A Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião e do OpiniãoTV.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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