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Montezuma Cruz

POLÍTICA EM FRANGALHOS



Do tempo em que honra se escrevia com H maiúsculo



MONTEZUMA CRUZ
Agência Amazônia

Assessorei um senador da República que relatou o Orçamento Geral da União em 2001. Um dia ele se cansou do assédio do colega ACM, da Bahia, ameaçado de cassação no Conselho de Ética. Era membro desse Conselho e pediu para sair, porque não quis mais julgar colegas. Sete anos depois, vi o deputado Paulinho "da Força", acompanhado de assessores apressados e ansiosos, entrarem em gabinetes de integrantes do Conselho de Ética da Câmara, para suplicar absolvição. "Falta de provas" foi a justificativa do representante paulista, recheada de calhamaços de papéis. 

E numa churrascaria de Brasília, tão logo recebeu a notícia da absolvição no Conselho ameaçou, arrogante: "Se esses caras tentarem me cassar de novo, não vão conseguir, porque 2010 está aí. Se quiserem insistir em me perseguir, vamos buscar os dados sobre a atuação de cada um e pôr todos no poste". 

O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar aprovou nesta quarta-feira, por 7 votos a 3, o parecer do deputado José Carlos Araújo (PR-BA) que absolve Paulinho. O PSol anunciou que vai reunir assinaturas para recorrer da decisão do colegiado e tentar dar continuidade ao processo de cassação.

Deve ser chocante para os jovens que começam a enxergar o modus operandi da política partidária brasileira verem a safadez perdoada, pondo a sucumbir o Conselho de Ética da Câmara, ressalvando-se o esforço técnico nos relatórios que envolvem falcatruas

 POLÍTICA EM FRANGALHOS - Gente de Opinião
Barão de Mauá tinha vergonha
de parlamentares. Para quê um Conselho, se a ética está em fuga?

O político tudo pode

E aí o jovem ansioso por saber como se faz política raciocina: "Então, é normal a pessoa desviar dinheiro do BNDES, calotear o Banco do Brasil, prorrogar dívidas, adquirir fazendas superfaturadas, desviar dinheiro do FAT?". Vê que sim, e sobram maus exemplos na Praça dos Três Poderes.

Suas Excelências isentaram Paulinho "da Força", este "abençoado" cidadão endinheirado que, dias atrás, jantou com o presidente da República e ainda conquistou apoio no partido que passou a maior parte da vida defendendo a ética. Já se sabe que ética.

As caixas postais dos que votam sim pela "inocência" ficaram abarrotadas de mensagens repudiando esse voto nefasto. E se lixaram para as mensagens recebidas de eleitores do seus estados ou de outros brasileiros indignados. Desligaram o telefone na cara dos que indagaram a respeito de suas posições. As ligações foram dirigidas "à pizzaria do deputado fulano ou ciclano", ironicamente perguntando dos sabores e preços dessas pizzas.

Resgato trechos de artigos anteriores, para demonstrar que no passado tivemos homens de brio na República, capazes de corar de vergonha diante de privilégios. Para os Paulinhos e seus asseclas refletirem, sem nenhuma esperança de que resgatem o moral e a ética que o mandato parlamentar lhes exigiu, em vão.

1) A fortuna de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá somava 115 mil contos de réis, ultrapassando em 18 mil contos de réis o inflacionado orçamento do Império. Ele não era necessariamente o homem mais rico do planeta, mas tinha quase tanto dinheiro quanto o colossal Banco da Inglaterra ou quanto o magnata das estradas de ferro Cornelius Vanderbilt.

O Barão de Mauá tornou-se personagem histórico singular. Foi o maior empreendedor do Brasil à sua época. Quando faliu, por ter se chocado com condestáveis do Império, que o hostilizavam e trabalhavam para transformar suas vitórias em fracassos, Mauá deu um dos maiores exemplos de integridade da história.

Ele incentivou a navegação na Amazônia. Em 1878, escreveu um documento denominado "Exposição aos credores de Mauá & Cia", no qual se comprometeu a honrar os seus débitos. Aos 65 anos, o barão vendeu os bens e pagou suas contas. Passou a viver num palacete alugado. Numa das salas do Tribunal de Comércio do Rio de Janeiro, em 30 de janeiro de 1884, já com 70 anos, ele ouviu o juiz Miguel Calmon du Pin e Almeida reabilitá-lo.

Com um modesto capital, tomado de empréstimo de um dos filhos e de amigos, ingressou no ramo de corretagem. Segundo o escritor Aluísio de Azevedo, por seus méritos, Mauá mereceria uma estátua em cada estado brasileiro.

Para Francisco Viana, autor do livro "Hermes, a Divina Arte da Comunicação", personalidades iguais ao barão pertenceram a uma época de grandes referências — o cristianismo, o comunismo, o socialismo, o Estado-Nação. "Uma época marcada por simbolismos e utopias que tinha a matéria-prima da sua consciência e essência na legitimidade da política, dos fortes elos entre o individual e o coletivo, nas muitas conexões entre o bem-estar no mundo e os valores simbólicos", assinalou. 

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Venceslau Brás também tinha
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) Aos 45 anos de idade, Venceslau Brás foi eleito presidente da República, no dia 14 de março de 1914. Conduzido em carro aberto, quase foi atingido por uma jaca. Até então, ele fora vice-presidente do Marechal Hermes da Fonseca. No entanto, sem nenhuma participação no governo.

Brás encontrou uma "inominável desordem financeira" no País. Ao assumir, a dívida pública havia dobrado, alcançando 3,2 milhões de contos de réis. Decidiu baixar o próprio salário em 50%, mas o Congresso autorizou apenas 20%. Diante do exemplo, os congressistas consideraram por bem aceitar o fim do pagamento a eles destinado, pelas convocações extraordinárias.

Usando carro particular, o presidente proibiu mordomias e restringiu ao mínimo as nomeações. Quando o Brasil se declarou em guerra com a Alemanha, Instituiu impostos sobre salários dos funcionários, dos juízes, dos ministros do Supremo Tribunal Federal e do próprio presidente da República.

Enfrentou a gripe espanhola, as idiossincrasias dos políticos da época, e os conflitos internos. Mas sua política legislativa, financeira e administrativa deu vigor a um País à beira do abismo, registra o historiador Rodrigo Elias.

"Seu" Lalau, recebido em 1914 com o arremesso de jaca, deixou, a capital federal, Rio de Janeiro, em 15 de novembro de 1918, aclamado pelo povo, pelos políticos e pela imprensa. A essa altura o chamavam de "São Venceslau".

Naquele tempo, calote, sem-vergonhice e brio não se misturavam. Tal qual a água e o azeite.

Fonte: Montezuma Cruz - A Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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