Tudo
precisa mudar: a maneira como produzimos (e consumimos) nossos
alimentos, como construímos nossas cidades (e vivemos nelas), como
lidamos com o lixo, medimos prosperidade, produzimos conhecimento,
cuidamos das florestas, do oceano, da atmosfera, da biodiversidade, e
por aí vai.
“Todas as pessoas, em todos os lugares, de todas as
vocações, têm um papel a cumprir na proteção da saúde do planeta e das
pessoas para as gerações futuras”, conclui o documento. A declaração
inclui recomendações específicas para 19 setores da sociedade —
governos, empresas, instituições financeiras, universidades, imprensa,
agricultura, lideranças religiosas e culturais, entre outros —, sobre
como cada um deles pode contribuir para a Grande Transição.
“Considerar
o poder e o impacto da tecnologia, a fim de facilitar soluções
transformadoras para o benefício de todas as pessoas e do planeta e para
transmitir informações baseadas em evidências”, por exemplo, é uma das
recomendações para profissionais da tecnologia. Para instituições
financeiras, a orientação é: “Não investir em projetos e empreendimentos
que lucrem com a degradação da natureza e, consequentemente,
prejudiquem a humanidade. Em vez disso, priorizar aqueles que enfatizam o
bem-estar humano e a recuperação dos sistemas naturais”.
A
declaração deriva de uma conferência internacional realizada em abril
(em formato virtual, em função da pandemia): a Reunião Anual de Saúde
Planetária 2021, organizada pela Planetary Health Alliance e a USP, que
atraiu milhares de pessoas, de diversos setores e diversos países, para
discutir, durante seis dias, os desafios e os caminhos para se chegar à
Grande Transição.
“Não
precisamos somente de novas leis, mas de novos comportamentos”,
ressalta o professor Antonio Mauro Saraiva, da Escola Politécnica da
USP, um dos organizadores da declaração e autor da carta na Lancet. A
pandemia de covid-19 deu uma demonstração clara disso, segundo ele: não
basta as autoridades publicarem leis exigindo o uso de máscaras e o
distanciamento social, se as pessoas não mudarem seu comportamento. Por
isso, completa o pesquisador, é importante que o movimento de transição
rumo à saúde planetária ocorra “de baixo para cima”, liderado pela
sociedade civil. “Precisamos trazer mais gente para essa conversa.”
A
declaração, segundo Saraiva, é uma “chamada à ação”, e não apenas um
discurso teórico: “Tem muita ação concreta que dá para fazer”. O
documento foi talhado na conferência de abril e depois refinado com base
numa consulta pública, realizada por meio da plataforma digital
SparkBlue, do PNUD, da forma mais inclusiva e colaborativa possível. “Se
é para produzir um documento que se propõe a induzir mudanças globais,
temos que partir desse pressuposto de que todos precisam estar
envolvidos, porque todos têm um papel a desempenhar”, pondera o
professor.
“A saúde do planeta é um tema importante, urgente, e
que abre perspectivas de pesquisa muito amplas e multidisciplinares”,
diz o pró-reitor de Pesquisa da USP, o físico Sylvio Canuto.
“A
ideia de organizar o evento em São Paulo, e na USP em particular, foi
uma forma eficiente de chamar a atenção dessas oportunidades e, ao mesmo
tempo, dar maior integração internacional para os nossos grupos já
atuantes.”
Entre
os signatários da declaração estão várias instituições de ensino e
pesquisa do Brasil, incluindo as academias nacionais de Ciências, Letras
e Medicina. O documento segue aberto para subscrições e será
apresentado num evento internacional virtual, nesta quarta-feira (6 de
outubro), às 12 horas, patrocinado pelo PNUD.