Quinta-feira, 16 de dezembro de 2010 - 12h24
MONTEZUMA CRUZ
Editor de Amazônias
Emissários do Governo de Rondônia e do Partido Democrático Social (PDS) conseguiram atrair José de Assis Cavalcanti, seduzindo-o com o presente de um automóvel usado. Um suborno no mais alto grau, em se tratando das primeiras eleições da história do novo Estado, em 1982.
Estávamos às vésperas da convenção para a eleição do primeiro Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores (PT). Cavalcanti era o presidente da Comissão Provisória e deveria presidir o ato. Havia “vazado” há mais de uma semana, colocando em pânico Odair Cordeiro.
O PT quando começou, vocês se lembram, tinha um tanto de filiados em Porto Velho que, apertadamente, lotavam uma Kombi (ou uma Rural Willys, conforme o gosto do freguês).
Desconfiado e angustiado, Odair chamou-me às pressas, mais cedo que o de costume, à modesta sede do Bairro do Cruzeiro. Lá estava, há meia hora, uma observadora da Justiça Eleitoral. A convenção teria que sair a todo custo, presidida por mim, então secretário. E assim foi.
Odair Cordeiro (E) orientando o prefeito Roberto Sobrinho durante o debate na TV Candelária. Foto/Serginho/Gentedeopinião |
Odair veio ser o presidente do partido. Esse militante paulista nascido em Catanduva e com alguns anos vividos em São José do Rio Preto fora preso político nos anos 1970, no DOI-CODI de São Paulo, junto com o goiano Athos Pereira. Desembarcava em Rondônia pouco depois que José Neumar, mestre Ataíde e Bernardo Lopes se reuniam sucessivas vezes com um pequeno grupo de pessoas para fundar o PT, inicialmente na capital. Ele foi o terceiro filiado, eu, o sétimo. Neumar havia contribuído para me "arrastar" de Brasília, onde editava o Porantim (jornal da causa indígena). Apresentou-me ao Odair e firmarmos logo um compromisso político que demandou muitas boas pelejas.
O representante comercial Odair também iria gerenciar a ServLar, uma grande loja de móveis e utilidades domésticas. Chegava “carimbado” pela repressão política, porque em São Paulo, ele e Athos Pereira davam guarida a alguns militantes de esquerda, a maioria, comunistas perseguidos pelo regime. Resultado da façanha: foram presos e torturados.
Ele tinha virtudes e defeitos, a exemplo da maioria dos seres humanos militantes políticos. Centralista, escolhia a dedos quem iríamos contatar para entrar no partido. Agia assim, muitas vezes turrão, movido pela constante vigilância sobre nossas cabeças. A ditadura só agonizaria quatro anos depois. Divergimos muito, mas o PT foi maior do que o zelo e o entusiasmo de cada um. Na convenção estadual em 1985 já lotava umas 40 Kombis ou Rurais.
Apreciava muito ouvir MPB – e só ela – em sua casa, na Rua João Goulart nº 1964 (!). E ensinava também aos filhos Chico e João a riqueza musical e a história política brasileira. Remexia os armários, emprestando-nos discos e publicações notáveis, entre as quais, preciosos exemplares da original revista “Senhor”.
Odair Cordeiro em dois momentos, prestigiando o bloco carnavalesco 'Pirarucu do Madeira' em 2006. Foto: Serginho/Gentedeopinião |
Do jeito que nos recebia, bisava a dose aos sábados, quando o Diretório promovia as tradicionais feijoadas que arrecadavam finanças para um partido bem romântico. Apoiava a luta de Bernardo Lopes no vaivém a um sítio lá no outro lado do Rio Madeira, no sentido Humaitá, de onde o companheiro trazia sacos de farinha puba para a Feira Popular do PT, na sede do Cruzeiro. Além da farinha, vendíamos galinhas vivas, ainda de madrugada. Clareava o dia, as galinhas acabavam. Odair sorria. E fumava um tanto.
Odair viajava muito, sempre vislumbrando ampliar o PT. Era dono de uma persistência diária, com pouco espaço para o esmorecimento. Memorizo: ele vendendo móveis e cativando militantes no interior; Bernardo, Chico Guedes, Vólia Barreira, Lúcia Cordeiro, Nancy Silveira, Verônica Guedes, Cristina Ávila, Jorge Streit e Mado mobilizando uma diversidade de correntes e tendências na capital; José Neumar, presente regularmente nas salinhas que seriam sedes de sindicatos de trabalhadores rurais e, ao mesmo tempo, estendendo seus braços e abraços às paróquias católicas, tornando-se delegado da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) em Rondônia.
Convenções, reuniões plenárias no interior e na capital; participação partidária na criação e instalação de sindicatos e associações tiveram em Odair um timoneiro assíduo, exemplar e até visionário. Foi dele o esforço para levar ao PT um número considerável de professores, urbanitários, pedreiros e bancários.
Quem se lembra da Astracor (Associação dos Trabalhadores na Construção Civil de Rondônia), embrião do sindicato da categoria? E do Movimento Contra a Carestia, outra “sacada” inadiável no momento de inflação e de desemprego gritante? Projetos dele.
Ele arranjava sempre uma promoção. Com isso, arrecadávamos fundos e pagávamos despesas. Dirigentes e militantes em Manaus visitavam Porto Velho para ver como funcionava a engrenagem partidária local. De repente, nos tornamos exemplo de mobilização. Bernardo era amigo do funcionário público e ator de teatro Fernando Benicasa, com o qual conseguia imprimir panfletos clandestinamente na reprografia da repartição onde ele trabalhava. A maior parte dos panfletos era redigida por Odair.
A dupla Odair-Neumar, em que pensem naturais divergências até certo ponto ideológicas, soube plantar uma semente logo reconhecida pelo Diretório Nacional. De São Paulo e de Brasília, dirigentes e militantes não pensavam duas vezes em nos enviar pacotes com jornais, livros e revistas. Os jornais iam parar até nas glebas em Cacoal, Ji-Paraná e Colorado do Oeste.
Bastou Neumar se reunir com os padres Ludovico Bononi, Mário Fioravanti e Mansueto dal Maso, para ocupar uma sala da Paróquia Nossa Senhora das Graças, tínhamos funcionando a Sociedade Rondoniense dos Direitos Humanos (SRDDH), com reuniões semanais (!).
Odair liderava a militância na Praça Rondon, abrindo o movimento pela libertação do presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Colorado do Oeste, Francisco Cesário, de Oto Ramminger e de Olavo Nienow, então colaboradores e ativistas da Comissão Pastoral da Terra; e do mecânico José Barbosa. Todos envolvidos com a luta pela terra na Fazenda Cabixi, dez anos antes do Massacre de Corumbiara, ocorrido em agosto de 1995.
Acusados de “fomentar invasões de terras e de agitação de posseiros”, eles foram denunciados ao Tribunal de Justiça, mas absolvidos numa célebre sessão com o Tribunal de Justiça totalmente lotado. Nesse dia havia mais policiais e “arapongas” por metro quadrado que populares, entre os quais, a militância petista.
A SRDDH teve importante participação nessa decisão, já que pichava muros na capital, distribuía panfletos nas casas e no comércio, fazendo ver à população do Estado o que ocorria nos bastidores da política e na luta pela reforma agrária cujo slogan, no PT, era “sob controle dos trabalhadores”.
Em ocasiões diferentes, quando Neumar presidia o Diretório Estadual, os líderes metalúrgicos José Ibrahim e Djalma Bom visitaram Rondônia. Ibrahim, que voltara do asilo político no Panamá, havia auxiliado na organização do PT em São Paulo e fazia palestras com o mesmo objetivo, sob o telhado de uma serraria, em Cacoal.
Odair havia preparado o terreno para o apoteótico Encontro Estadual do PT. No dia, Ibrahim desembarcaria na cidade acompanhado do líder metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva. A partir daí e depois do retorno de Lula a Porto Velho, duas vezes, o PT conquistava seu espaço em Rondônia.
A campanha nas primeiras eleições, em 1982, transcorreu sob a égide da Lei da Falcão. Significa dizer que apareciam na TV apenas os retratos – horríveis, por sinal – dos candidatos a todos os cargos, com breves informações a respeito de cada um. No rádio, apenas um fundo musical e as mesmas informações. O meu, providencialmente escolhido por Odair, era “Brasileirinho”. Candidatava-me a deputado estadual. Everton Leoni faria, de graça, as gravações para todos os candidatos petistas.
Nas reuniões, Odair defendia radicalmente a nossa rejeição a qualquer auxílio para impressos em gráficas locais. No final das contas, por 25 cruzeiros cada, conseguíamos a nossa simplória propaganda num pequeno folder com os nomes e breve biografia de todos os candidatos.
Fiquei muitos anos afastado de Rondônia, quando trabalhei no Maranhão, em Mato Grosso e na fronteira Brasil-Paraguai-Argentina. Não sou credenciado para descrever o Odair que não vi mais, exceto nos raros encontros em Porto Velho, durante minhas visitas jornalísticas.
Sei que ele trabalhou um tanto, sem modificar um milímetro o tamanho dos seus sonhos. Foi chefe regional do DNIT e do gabinete do prefeito Roberto Sobrinho. Daqui a pouco, lá estará o paulista, noutro Plano, promovendo encontro com velhos companheiros, manifestando solidariedade aos excluídos, rindo e se indignando com um tanto de situações.
De uma coisa tenho certeza: cuidado para não falarem alto o nome do presidente Lula, notadamente se forem criticá-lo. Odair ouvirá tudo, e aí virá uma discussão sem tempo certo para findar-se.
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