Integração Brasil-Peru exige vôos transfronteiriços, armazéns aduaneiros e acordo comercial
MONTEZUMA CRUZ
Agência Amazônia
PUCALLPA, Amazônia Peruana – Na terra e no ar, a festejada integração Juruá-Ucayali depende mais de acordos regionais com respaldo de Lima e Brasília. Nos próximos 60 dias, políticos e empresários do Estado do Acre e do Departamento (Estado) de Ucayali querem que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) brasileira recupere a condição internacional do Aeroporto de Cruzeiro do Sul. “Se as cargas são importantes, o turismo é mais ainda”, resumiu o secretário de esportes, turismo e lazer do Acre, Cassiano Marques de Oliveira.
Um grupo de trabalho está encarregado de eliminar gargalos nos vôos de passageiros e de cargas, mas isso depende diretamente da alteração de leis no Congresso Nacional. O diretor geral de Aviação do Peru, Fernando Monly Hada, lembrou que há dez anos delegações aeronáuticas haviam cobrado essa decisão, no entanto, persistem as dificuldades.
Na selva, Huánuco também quer
“o progresso contra a pobreza”
PUCALLPA, Ucayali – Altoandina, Huánuco (759 mil habitantes), província vizinha a Ucayali, assume um compromisso às vésperas dos seus 470 anos: “abrir-se ao mundo” para conquistar investimentos. Esta é a bandeira defendida por Jorge Espinoza, que representa na região o Serviço Nacional de Sanidade Agrária (Senasa).
Nem parece a região tão afetada pela guerrilha do Sendero Luminoso, que enfrentou ditaduras militares durante mais de 20 anos ali e em Ayacucho. Guerrilheiros perseguidos pelo Exército Peruano costumavam embrenhar-se na floresta amazônica, em Huánuco.
A principal peça de propaganda do Governo Regional de Huánuco expõe sua vitrine: licores, derivados de cacau, calçados feitos à mão, café torrado e moído, rico artesanato de fibra, entalhes de madeira e confecções em macrame. Eles constituem uma linha modesta, porém, tão importante quanto os projetos de exploração das minas de zinco, cobre, prata, ouro, molibideno e não-minerais (mármore, argila, carbono e dolomita) guardados em suas entranhas.
“En El mundo actual existen dos tipos de pueblos: aquellas que atraen inversiones y aquellas que la espantan. Huánuco, em este sentido, se inscribe entre los primeros, pues sabe, ahora más que nunca, que no existe otro modo para reducir la pobreza que em incremento de las inversiones productivas”, assinala o governo regional no folder colorido com o tema: "integração para o desenvolvimento".
Nos 36,8 mil quilômetros quadrados da província onde pontificam as atrações naturais, a serra e a selva. É um território é rico e diverso em flora e fauna distribuído entre três bacias hidrográficas: Huallaga (37 rios e 101 lagoas); Pachitea (27 rios) e Marañon (27 rios e 197 lagoas).
Kotosh, Garu, Shillacoto, Tantamayo, Piruro formam o patrimônio arqueológico da região, junto com outras riquezas Incas igualmente famosas. Enfim, uma esplêndida Amazônia mais conhecida por turistas estrangeiros do que por nós, brasileiros, que somos donos da maior parte dos 7 milhões de quilômetros da mais rica biodiversidade do planeta. (M.C.)
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Se já funciona uma linha de ônibus-leito entre Rio Branco-Assis Brasil-Iñapari-Puerto Maldonado (capital do Departamento de Madre de Dios), as taxas de embarque preocupam: Cruzeiro (73,9 mil habitantes) cobra R$ 25 de quem viaja para Pucallpa, enquanto nesta cidade, o passageiro com destino ao Acre pagará 12 dólares. Mais: o real não é aceito no câmbio regional, onde circulam apenas novos soles (moeda peruana) e dólar norte-americano.
Na semana passada, o assunto dominante em Pucallpa (310 mil habitantes) foi a união comercial entre as regiões fronteiriças, buscada sucessivas vezes desde o início do século passado. De 23 a 25, uma delegação acreana participou do
Encontro pela abertura da fronteira comercial de Ucayali com o Vale do Juruá, a partir de Cruzeiro do Sul, a 220 quilômetros daqui. O vôo entre as duas regiões demora apenas 25 minutos.
“Tão próximos, mas tão distantes por conta do isolamento”, observou o presidente da Associação Comercial de Cruzeiro do Sul, Marcos Venício Alencar de Souza ao falar no Colégio Médico, local da abertura do Encontro. Para o presidente da Frente Parlamentar Brasil-Peru, deputado Ilderlei Cordeiro (PPS-AC), a Anac precisa adequar a política aeroviária à política externa, criando incentivos para vôos transfronteiriços com tarifas domésticas.
O presidente da Assembléia Legislativa do Acre, deputado Edvaldo Magalhães (PCdoB), disse que Ucayali é rica em combustíveis, mas há dificuldade na comercialização de gasolina entre Santa Rosa do Purus e Puerto Esperanza, por exemplo. A viagem de barco entre Pucallpa e Santa Rosa demora quase uma semana.
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O presidente regional (governador) Jorge Porto Carrero: integração amazônica / M.CRUZ |
O presidente regional (governador) Jorge Velásquez Porto Carrero está confiante na concretização do antigo sonho, algumas vezes frustrado. “Até 2010 consolidaremos a saída para os portos do Pacífico e nos dedicaremos a todo vapor aos negócios fronteiriços, respeitando-se principalmente os nossos recursos naturais”, afirmou. Invocando a Lei 27.037 (de promoção e investimentos), os peruanos falam até num projeto ferroviário entre Cruzeiro e Pucallpa, cujo custo previsto é de US$ 1 bilhão.
Antes do trem, virá o avião. O diretor-presidente da Star Perú, Ronan Casiano prometeu abrir duas novas rotas aéreas na região, uma delas ligando com um Boeing 737 os aeroportos de Cruzeiro do Sul e de Coronel Portillo, a principal província da capital de Ucayali. Para o vôo regular o Acre acenou com uma isenção de 28% no imposto sobre combustível de aviação. Enquanto isso, o secretário de turismo Cassiano de Oliveira assumiu o compromisso de ampliar no Ministério do Turismo a luta pelo plano de marketing da rota aérea Pucallpa-Cruzeiro do Sul.
Em falta
O Peru tem 27,2 milhões de habitantes e a região fronteiriça cerca de 244 mil consumidores. Em agosto, a Exposição Agropecuária do Juruá promoverá uma grande feira de produtos regionais que movimentarão a economia local, que gira em torno de 31 milhões de novos soles. Um dólar corresponde a 3,48 soles.
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Cidade da Amazônia Peruana tem mais de 300 mil habitantes / M.CRUZ |
O transporte de produtos entre os dois países é feita pelo mar; apenas 0,09% por estradas e 0,17% por via aérea. A região norte brasileira oferece ao Peru, de eletroeletrônicos a motocicletas, e compra frutas, cimento e calcário, entre outros.
“Nossos países nunca tiveram relações problemáticas; sempre fomos bons amigos e vamos continuar neste caminho”, afirmou o diretor de Desenvolvimento Regional do Ministério das Relações Exteriores do Peru, José Benzaquen. Enfatizou a luta contra a pobreza e o livre comércio para a construção da Aliança Estratégica Peruana, via Integração da Infra-Estrutura Regional Sul-Americana. Também destacou o acesso do seu país ao Sistema de Vigilância da Amazônia (Sipam).
Na prática, já houve integração no passado, lembrou o prefeito de Cruzeiro do Sul, Vagner Sales (PMDB): “Há 30 anos já levávamos cimento daqui”. Marcos Venício acrescentou: “Nos anos 1970 comprávamos, em Pucallpa, cerveja San Juan, cebola, alho, motor de popa e artesanato. A globalização econômica encurtou os caminhos”, ele assinalou.
Cruzeiro do Sul, cidade com quatro torrefações de café e dois frigoríficos que abatem 600 bois por dia, consome mensalmente nove toneladas de frutas e verduras procedentes do Amazonas. Tudo encarece quando a rodovia BR-364 fecha durante pelo menos quatro a cinco meses durante o “inverno amazônico”.
União aduaneira
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Espinoza, da Sanidade Nacional em Huánuco: "Seremos a maior força econômica do Peru" / M.CRUZ |
Pucallpa sonha ser um grande porto fluvial, tal qual São Francisco, na Califórnia (EUA), disse o presidente da Câmara de Comércio e Indústria de Ucayali, Jorge Ruiz Rojas, ao anunciar entusiasticamente que investimentos no Peru “significam a possibilidade de uma abertura para o Mercosul, China e Canadá”. Da mesma forma, Cruzeiro também pretende ser um entreposto comercial.
Não faltam boas intenções.
Jorge Espinoza, do Serviço Nacional de Sanidade Agrária em Huánuco (departamento vizinho, a 420 quilômetros de Pucallpa), proclamou: “Vamos formar com Ucayali a região mais poderosa do Peru. Nós também estamos a menos de meia hora de vôo daqui e a 2h30 por carretera (estrada)”. O representante do Ministério da Agricultura brasileiro, Jorge Luiz Hessel, prometeu que tão logo o aeroporto de Cruzeiro voltar a ser alfandegado, um fiscal sanitário ficará à disposição dos empresários locais para as exportações.
Com isso, segundo explica Hessel, já está adotada a importação sem análise de risco. Estão na lista dos produtos peruanos: abacate, alho, aspargo, cenoura, feijão, fumo, gergelim, maçã, melão, orégano, pêra, pupunha, repolho, tomate e uva.
O vôo 1823 da Star Perú levou de Cruzeiro à capital de Ucayali 140 passageiros – entre eles, 20 dos 24 deputados estaduais, seis deputados federais, seis presidentes de Câmaras de Vereadores, empresários e jornalistas. Foi a maior comitiva da história da integração entre as duas regiões.
Fonte: Montezuma Cruz - A Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião e OpiniãoTV.