Domingo, 23 de fevereiro de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Montezuma Cruz

Urucuia, o Vale da Vida


    


MONTEZUMA CRUZ
Agência Amazônia

ARINOS-MG, Vale do Urucuia – Quatro meses de seca implacável no sertão do noroeste mineiro emagrecem o gado, empoeiram árvores do Cerrado, casas, pontes, estradas, e obrigam novamente os agricultores a enfrentar dificuldades – as mesmas repetidas há décadas por conta de ausência de políticas públicas. No ano passado cinco mil cabeças de gado morreram de fome, atoladas nas veredas, registra a Agência de Desenvolvimento Integrado Vale do Rio Urucuia, fundada em dezembro de 2000 com o objetivo direto de combater a pobreza e a desigualdade social por meio da cooperação mútua.

A mandioca é a salvação na região do Vale do Urucuia: a maior parte do gado, cavalos, éguas, burros, jumentos e porcos criados nesses 27,9 mil Km² da região – o equivalente às áreas dos estados de Alagoas e Sergipe – vem se alimentando com raspas e folhas de mandioca "mansa". 

Urucuia, o Vale da Vida - Gente de Opinião
Alaor Silva: quatro toneladas de ração por hora /FOTOS M.CRUZ

As hastes principais dessa mandioca são muito ricas em vitaminas A, C e do complexo B, e apresentam teor de proteína superior a 20%. Também possuem boa concentração de cálcio e fósforo. O rio Urucuia vem de Goiás e atravessa o noroeste de Minas Gerais até desaguar no rio São Francisco. A região fica a 700 quilômetros de Belo Horizonte e a 180 Km de Brasília. Mesmo na seca, vê-se muita vida nas veredas, esse vinco da terra onde brotam fartas folhagens de buriti, no meio de água boa e fresca.

Desilusões

Urucuia, o Vale da Vida - Gente de Opinião
Estiagem prolongada castiga novamente o sertão de Minas Gerais
Além da estiagem prolongada, os agricultores acumulam desilusões nas pequenas propriedades próximas a latifúndios de sojicultores. Uma grande fecularia foi montada em Arinos, mas o seu dono não era do ramo e o projeto fracassou. Entre outros prejuízos, um produtor com 1.200 hectares de mandioca teve 800 ha atacados por mandarová.

Financiado pela Fundação BB, desde 2003 a 2008 o Projeto de Desenvolvimento do Arranjo Produtivo Local de Beneficiamento de Mandioca recebe recursos que totalizam R$ 6 milhões, para o atendimento a cerca de 4 mil famílias de 11 municípios. 


Seis fábricas abastecem a bacia leiteira

Urucuia, o Vale da Vida - Gente de Opinião
José Ferreira e Valdemar da Silveira são mandioqueiros e associados ao projeto da ração
Onze municípios do Vale do Urucuia, próximos à tríplice divisa de Minas Gerais, Bahia e Goiás, cultivam 150 hectares de mandioca, mas o mapeamento feito pela agência indica que comportam até 500 ha.

A Embrapa Cerrados recomendou aos produtores que reservem 20% de suas áreas para expandir lavouras e plantar capim. O motivo é nobre: de cada cem quilos de mandioca consumidos pela população de Arinos, 80Kg são dali.

A raspa e a manipueira são usadas na alimentação animal, especialmente vacas leiteiras. No distrito de Sagarana cerca de 200 produtores obtêm 10 mil litros de leite por dia, vendidos entre 70 e 85 centavos o litro. "

O aumento da produção leiteira é significativo, porque os veranicos desses dois anos destruíram 60% do plantio", observa Idelbrando Souza. "Mas eles já se arrumaram para retomar as áreas e fabricar ração que beneficiará a todos, porque se situam em áreas estratégicas", emenda o pedagogo colombiano Rafael Pinzón Rueda, assessor da agência. 

Urucuia, o Vale da Vida - Gente de Opinião
Em dois anos, cinco mil reses morreram de fome. Agora o gado é salvo pela mandioca

 
Formar estoques, a meta

Há mais de três décadas na região e com a bagagem de ter trabalhado nos estados do Acre e do Pará, ele está empenhado em promover uma mudança cultural entre os produtores. "É preciso que eles façam a estocagem de manivas, capim e cana-de-açúcar. Assim, o gado sobrevive à estiagem", apela.

Com o impacto das secas de 2006 e 2007, seis fábricas de ração de mandioca com 18% de índice protéico salvam a lavoura e também o estômago dos animais. Aproveitaram a parte aérea da planta e passaram a trocar o leite pela ração que vinha de fora.


Quatro toneladas por hora

Cada máquina picotadeira, adquirida por R$ 1 mil financiados faz até 4 toneladas por hora. Segundo o presidente do Comitê Gestor da Mandiocultura, Alaor Tavares da Silva, os agricultores escolheram mandiocas mais resistentes a pragas e doenças, entre as quais, as IAC 12, 23 e 14, a Pioneira, a Urucuiana e a Palmeira.

Há dois anos eles testam 12 variedades para mesa e 12 para indústria, com predominância das IAC 12 e 14, Iracema, Periquita, Tapioquenta, Urucuiana e Urubu. "Já temos 13 hectares de experimentos para bancos de sementes", conta Silva, animado. Aragem a gradeação é um dos mais caros componentes da lavoura. O aluguel da máquina simples para gradear custa R$ 60 por hora. O uso de máquina de maior porte sai por R$ 100. (M.C.)

 
"Esse problema eu não tenho mais" 

Urucuia, o Vale da Vida - Gente de Opinião
Militão, com o neto William: ração foi a salvação das vacas leiteiras
A mandioca que rende até 40 toneladas/ha está sendo comercializada a R$ 80 a tonelada para indústria. José Ferreira dos Reis, o Zé Messias, acredita que esse preço poderá melhorar, se todos se empenharem em cultivar variedades de boa produtividade. "Vamos plantar mais em outubro para colher em março e abril de 2009", ele prevê.

O comitê gestor assume o papel de orientar os produtores a fazer a poda dos mandiocais com um ano, aproveitando a manipueira na alimentação animal. Ao completar um ano e meio já se tem nova produção de raízes e da parte aérea. "No ano passado a safra não deu para quem quis", comenta Valdemar da Silveira.

Até o ano passado, Militão Gomes Monteiro alimentava o gado com milho na sua Fazenda Jibóia (90 ha), no Distrito de Sagarana. Orientado, mudou para raspa e ramas de mandioca, que saem bem menos caras. "

Os bichos não vai passar fome", garante. E não passam mesmo. Suas vacas leiteiras comem o dia todo no cocho. Os vizinhos também adotaram o método. Militão, seis filhos e oito netos, mostra a picotadeira no galpão de madeira e liga a máquina para demonstrar a eficácia da trituração.

"Contei 50 minutos, e ela encheu 20 balaios", diz. Militão, apelidado de "Militanto" pelo pessoal da agência de desenvolvimento, esparrama a ração sobre uma lona plástica e se diz feliz: "Esse problema eu não tenho mais" (M.C.) 

ACOMPANHE AS MATÉRIAS DESTA SÉRIE



Fonte: Montezuma Cruz - A Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoDomingo, 23 de fevereiro de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Taxa de 30% sobre remessas internacionais enviadas desde os EUA, acima de US$ 200, auxiliaria política imigratória, sugere Samuel Saraiva ao Governo Norte-Americano

Taxa de 30% sobre remessas internacionais enviadas desde os EUA, acima de US$ 200, auxiliaria política imigratória, sugere Samuel Saraiva ao Governo Norte-Americano

O cidadão Samuel Sales Saraiva propôs nesta quarta-feira ao presidente dos Estados Unidos, estudos técnicos legislativos ou medidas executivas feder

De cada 60 homens que partiam, dez morriam e 20 ficavam doentes; libras de ouro circulavam em Santo Antônio (2)

De cada 60 homens que partiam, dez morriam e 20 ficavam doentes; libras de ouro circulavam em Santo Antônio (2)

Quando o nível do rio permitia, o transbordo obedecia à correnteza nas cachoeiras Jirau, Ribeirão e Teotônio, no Rio Madeira. Santo Antônio, via circu

Saraiva sugere a Trump conclamar cidadãos a ajudar Polícia Federal de Imigração com informações que permitam a prisão e deportação de criminosos e fugitivos

Saraiva sugere a Trump conclamar cidadãos a ajudar Polícia Federal de Imigração com informações que permitam a prisão e deportação de criminosos e fugitivos

Em carta enviada ao Presidente Donald Trump, com cópia para a direção da Polícia de Imigração e Alfândega (ICE), o cidadão americano Samuel Saraiva

Novo livro de Lúcio Flávio revela paixão pela floresta

Novo livro de Lúcio Flávio revela paixão pela floresta

Jornalista mais premiado da história na Região Norte, de acordo com o Ranking + Premiados da Imprensa Brasileira 2024, Lúcio Flávio Pinto acaba de lan

Gente de Opinião Domingo, 23 de fevereiro de 2025 | Porto Velho (RO)