Sábado, 9 de julho de 2016 - 15h27
Samuel Castiel Jr., médico, contista, poeta, membro da Academia de Letras de Rondônia
São muitos os bairros que participam de concursos de quadrilhas e boi-bumbás nas festas juninas aqui em Porto Velho. Sem dúvida o grande concurso acontece no Arraial “A Flor do “Maracujá” onde as barraquinhas vendem comidas típicas tais como vatapá, tacacá, maniçoba, caruru, galinha a cabidela, bacalhau a Gomes de Sá, etc., além churrascos e churrasquinhos de gato com carnes bovina e caprina, bebidas diversas como cervejas, refrigerantes, quentão, aluá, “capetão”, vodka, pingas variadas, caipirinhas e caipiroscas, bem como sucos de frutas regionais da época. E entre as luzes coloridas, rodas-gigantes, montanhas russas, barcas-voadoras, etc., shows sertanejos e vaquejadas, vão desfilando as quadrilhas e bois-bumbás durante a noite inteira, sob o som de sanfonas, chucalhos, triângulos e pandeiros.
É nesse cenário que Godofredo cresceu, amando as festas juninas, onde tinha a oportunidade de apresentar-se dançando com seu boi Malhadinho. Era o dono do boi e começava a ensaiar seus componentes já no mês de maio, num campinho de futebol na lá zona leste da cidade, bairro que começava a ser habitado, com grande invasão de áreas por grupos do movimento “sem teto”. Godofredo ensaiava seus brincantes para a grande disputa final no Arraial “Flor do Maracujá”, no mês de julho, as vezes já em agosto. Costumava concorrer com outros grandes bois como o “Corre Campo” cujo amo chamava-se“Galego” ou “Garantido” cujo dono era o Zé Luiz. Tinha também o “Diamante Negro”, do Aluizio Guedes, que se destacava em suas apresentações pela exuberância das fantasias. Godofredo colecionava alguns troféus de memoráveis quadras juninas. Quando completou dezoito anos, teve que se apresentar para serviço obrigatório do exercito. Tornou-se um recruta. Sabia que a disciplina e as normas militares eram rígidas. Quando se aproximou o mês de maio, e precisava começar os ensaios do boi Malhadinho, Godofredo ficou preocupado, mas mesmo assim foi ao sargento que lhe dava instrução de preparo físico e perguntou-lhe se podia brincar com o seu boi Malhadinho mesmo sendo um recruta do exército.
- Olha Reco, acho bom você nem pensar nisso, pois aqui a disciplina e os horários são rígidos e existem para ser cumpridos, certo?
Ficou triste, pois o seu boi Malhadinho nunca deixara de participar das festas. Mas, como os ensaios eram lá na zona leste da cidade, começou a ensaiar seus brincantes. Entretanto, não estava satisfeito, pois o que ele gostava mesmo era de dançar como Amo do Boi, ou seja aquele que puxa os cânticos e toadas, todo vestido com roupas coloridas, chapéu com fitas e espelhos, de pandeiro na mão!...Com o corte de cabelo militar, era fácil identificá-lo com Reco. Acontece porém que quanto mais se aproximava o dia da competição, os ensaios ficavam mais intensos e se estendiam noite adentro!
O exército tinha patrulhas compostas de 10 ou 12 soldados, comandados por um cabo experiente ou um sargento. Essas patrulhas vaziam ronda nos locais de maior aglomeração, tais como festas, cinemas, praças, jogos de futebol e também nos arraiais, já que não havia ainda sido criada a Policia Militar (PM). Essas rondas com patrulhas do exército eram chamadas Patrulha Especial (PE) e tinham como objetivo inibir a ação de desordeiros, ladrões e meliantes que se infiltrassem nessas aglomerações populares.
Já na véspera do concurso final, o Godofredo não resistiu! Durante o ultimo ensaio, avisou sua mulher que queria brincar! Afinal, não via mal nenhum nisso, pois tinha plena consciência que ninguém ficaria sabendo. Depois de pensar muito, teve uma ideia: ia brincar de “miolo” do Malhadinho, pois lá embaixo ninguém iria descobrir nem perguntar quem é que dançava pelo boi!...Chamou o Joca, miolo titular, e disse-lhe:
- Olha aqui Joca, vou confiar em você, que já brinca a anos no Malhadinho e é como se fosse meu irmão! O exercito não permite que o Reco brinque nas festas juninas, principalmente em boi. Mas eu tô que não me aguento!... Vou brincar de “miolo” no seu lugar, e você vai de Cazumbá, pois já conhece a estória e sabe as falas e toadas, OK?
- Certo, “broder”! Você é que manda!...
- E vou aproveitar logo hoje pra fazer o último ensaio, antes da competição lá na “Flor do Maracujá”.
A patrulha do exército (PE) nessa noite estava sendo comandada pelo Cabo Félix, um cearense que, de tão caxias, diziam que já nascera vestindo a farda verde oliva do exercito. Pra se ter uma ideia, o Cabo Félix batia continência pra ele mesmo frente ao espelho todas as manhãs ao se acordar!... E nessa noite soube do ensaio do boi Malhadinho lá pras bandas da zona leste, onde começavam a surgir as “gangs” violentas, que posteriormente viriam aterrorizar as noite de Porto Velho. Resolveu dar uma “batida” por lá. Quando a patrulha chegou, havia uma grande aglomeração em torno do Malhadinho, que dançava muito animado, com muito vigor, balançava o rabo, botava a língua pra fora e dava saltos passando bem perto aos curiosos que assistiam aquele ensaio. O Cabo Félix então começou a notar que quando o Malhadinho se aproximava da patrulha, imediatamente virava de costa, balançava o rabo e se afastava aos saltos para o outro lado da roda do ensaio. Numa dessas manobras, o Cabo Félix olhou para os pés do Malhadinho e o que viu foram dois coturnos pretos e bem engraxados! Imediatamente mandou que os soldados cercassem o ensaio e, quando o Godofredo percebeu o cerco, sentiu que tinha sido descoberto, jogou o Malhadinho em cima dos soldados e passou por eles em desabalada carreira, sendo contido lá na frente pelo próprio Cabo Félix, que já o esperava:
- Tentando enganar nossa patrulha, não é seu Reco? Você não sabe ainda do regulamento militar que jurou cumprir quando foi admitido e incorporado?
- Cabo, eu só tava dançando de “miolo”, mas juro que não ia concorrer!
- Pois eu juro que é você que não tem miolo! E juro também que o Comandante é que vai decidir quantos dias você vai ver o sol nascer quadrado!
Virou-se para seus soldados e ordenou:
- Aos costumes pracinhas! Algemas e “camburão” nesse “miolo”!
O Malhadinho nesse ano perdeu o troféu principal, mas ganhou um premio de consolação entregue a esposa do Godofredo!
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Lúcio Albuquerque
9910 8325
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