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Vinício Carrilho

Centenas de Mortos


Até na proporção maior de civis mortos, em relação aos combatentes militares, a onda de violência em São Paulo se equipara a uma guerra. Na Faixa de Gaza, na Palestina, também morrem mais civis do que militares, incluindo-se aí mulheres, idosos e bebês ou crianças de colo.

Na capital paulista, pode-se identificar alguns dos grupos humanos mais visados nos recentes combates urbanos: os policiais assassinados; os bandidos mortos em confronto; os civis conhecidos como “cidadãos de bem”. Sendo que estes ainda se subdividem, entre: moradores de áreas de risco, favelas, comunidades; vítimas a esmo, transeuntes que simplesmente passavam pelo lugar errado, na hora errada; estudantes ou trabalhadores do período noturno.

Outra categoria é formada pelos ditos “suspeitos” e/ou marcados para morrer, seja pela queima de arquivo, acerto de contas ou porque foram identificados pelos grupos de policiais de extermínio. Por enquanto, este é o grupo que mais tem baixas registradas, os chamados “fichados” ou quase isso, pois muitos não tinham passagem pelo ambiente policial – mas eram vigiados de perto pela polícia, antes de serem transformados em alvos pelas milícias exterminadoras da própria segurança pública.

O grupo de vítimas que mais cresce estatisticamente, entretanto, é o de civis indefesos, sem nenhuma ranhura em sua vida pregressa ou qualquer ruptura sistêmica; figuram como simples trabalhadores, jovens, mulheres, crianças e idosos, todos vítimas da desigualdade social ou do azar de passar perto dos bandidos (atuantes dos dois lados):

Dados do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa) mostram que, de 24 de outubro até o último dia 19 (27 dias), 62 civis foram mortos por PMs na região metropolitana, em uma média diária de duas mortes --entre janeiro e setembro, era registrado um caso por dia[1].

 

            Um final de semana, como este que passou, pode ser ainda mais assustador, uma vez que foram 60 pessoas alvejadas por arma de fogo, com duas dezenas de vítimas fatais. Neste caso, há ainda que se lembrar que a violência do extermínio não está mais confinada em certas áreas periféricas ou polemicas: muitos bairros residenciais já são palco de massacres de civis inocentes.

            As motivações são muitas, algumas já descritas aqui na coluna. Mas, o que mais importa é que se reconheça essa barbárie, a guerra civil que via de regra vitima os mais indefesos. Enquanto o próprio Estado não reconhecer sua parcela de culpa ou de protagonismo na violência urbana e institucional o nível de violência não vai diminuir.

            Esta, no entanto, das medidas é a mais fácil, pois bastaria punir os policiais matadores de aluguel e exigir que a polícia agisse dentro da lei, obedecendo ao mesmo Estado de Direito que abriga o cidadão de bem, o trabalhador, a dona de casa, o estudante. A polícia deve policiar a polícia; não dá mais, em 2012, para que os aparatos repressivos de Estado soprem apenas para os lados dos pobres, suburbanos, desempregados, desalojados. Por isso, não é difícil ver que o mais complicado e que, certamente, empurra-se para bem longe dos holofotes da mídia é a imensa miséria que assola a maior e mais rica cidade brasileira.

Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto II da Universidade Federal de Rondônia
Departamento de Ciências Jurídicas
Doutor pela Universidade de São Paulo

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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