Domingo, 9 de dezembro de 2012 - 15h06
No Rio de Janeiro, policiais encomendavam a morte de colegas de farda. Em São Paulo, além dos grupos de extermínio, agora policiais colocam fogo em “suspeitos”[1](lembra a ação de jovens de classe média-alta que colocaram fogo em um índio, em Brasília). É claro que é uma bestialidade, uma insanidade que superou todos os graus negativos do sadismo. No entanto, o que mais isto nos indica? Com uma olhada simples, é fácil ver que cresceu muito a doença que atingiu a sociedade brasileira: a corrupção é o traço predominante da cultura.
A corrupção econômica, aquela que busca o lucro rápido, primeiramente, levou ao acordo com o crime organizado por muitos agentes de farda. Naquele momento, esta ação de se associar aos atos criminosos revelava que os servidores da lei estavam desesperados por dinheiro fácil – observavam as autoridades, às vezes seus próprios superiores, os políticos em geral, promovendo os acordos imorais, corruptos, mensais ou semanais, como se tudo fosse absolutamente normal. A corrupção econômica se tornou comum, natural (quer dizer, ditada pela “natureza do brasileiro”), para alguns obrigatória, e aí se expandiu para níveis bem superiores. Assim, tal qual o câncer que também evolui, a corrupção mudou de forma e de conteúdo. Hoje, além da farda, a corrupção veste o paletó, o jaleco, a camiseta, o macacão (ou o que sobrou dele), a minissaia, o tayer.
Não é apenas a economia ou a política que se corromperam, as pessoas não apenas vendem sua consciência em troca de dinheiro ou de benefícios – a corrupção chegou a tal nível de estranhamento que agora “estranhamos”, julgamos anormal, desconfiamos de quem não tem a alma convertida pelo Mal. O natural é achar um preço, um valor em que se enquadre a moral de qualquer um. Na sexta-feira, em meio a especulações dos dinheiros desviados da prefeitura, alguém assoprou a cifra de um bilhão (o equivalente ao orçamento de um ano inteiro). Um outro fez contas rápidas e disparou que seriam 20 beneficiados com 50 milhões cada. Este mesmo alguém disparou que não valia a pena vender sua alma por essa quantia. Não lhe perguntei, mas suspeito que acima disso concordasse em chegar a bom preço.
Nesta onda de concordata de tudo que não seja ou possa via a ser esculhambado, conheço outro indivíduo que diz abertamente que as “mulheres são prostitutas”. Para este segundo tipo, não há uma mulher que não se venda para ter uma família e um emprego ou provedor. Certamente, deve arrolar sua própria mãe. Esta pessoa soltaria rojões se soubesse que chegou ao preço de alguém não corruptível.
Na mesma linha, há professores que se gabam de “ensinar” o que não sabem (como assim? Pois é, desenvolvem técnicas de marketing ou retórica oca para falar do que desconhecem); há juízes que vendem sentenças; empregados domésticos que furtam de garfos a relógios; médicos que abusam de pacientes; advogados que surrupiam verbas de clientes, alunos que cobram para fazer os trabalhos dos colegas (na graduação, meus professores saiam da sala em dia de prova, a agudíssima competição nos impedia de olhar para os lados). Esta lista não tem fim, portanto, penso que a fase em que se corrompia economicamente já é coisa do passado.
O estrago é muito maior, até o inconsciente dessas pessoas está comprometido; quando dormem, sonham que estão enganando outros. Na verdade, enganam a si mesmos, mas como se julgam superiores, nunca olham para o cancro em que se tornaram. Também não é difícil perceber como glamourizam a corrupção integral dos sentidos; são tão assoberbados pela escuridão moral que se julgam seres iluminados. Desse modo, podemos entender a cena em que corruptores agradecem a Deus, em uma roda de mãos dadas, pela graça corrupta recebida.
São indivíduos que já perderam a noção do ridículo, de tanto mentir aos outros, acreditam nessas mentiras; mas, são esquecidos de que são mentiras infantis, boçais, ridículas, diria até enfadonhas, porque é tão pueril sua crença no Mal planejado que os cálculos deixam de considerar o óbvio: a inteligência do homem médio. Basta ter uma inteligência mediana para ver em seus olhos o quanto são podres seus argumentos e ações. Em verdade, são pessoas muito doentes, moribundas e que, a mínima proximidade, faz qualquer um sentir o vodu, a sombra escura, a ânsia que pairam sobre sua imoralidade.
Esses são os tipos que, aliás, exercem uma pressão para que se venda, troque, permute, empreste os valores, a confiança na verdade, o “não querer ser errado”. Há uma força corruptiva enorme, subvertendo todos a fim de que abandonem esta filosofia do não querer ser, propositadamente, errado. Todos podem errar, mas é bem diferente dos que sempre erram, propositadamente, e com isso produzem o Mal que aflige e condenam centenas, milhares, milhões à exclusão, à morte. Esta é a doença – apesar de não ser médico ou curandeiro da moral – que mais nos incomoda.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto II da Universidade Federal de Rondônia
Departamento de Ciências Jurídicas
Doutor pela Universidade de São Paulo
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