Quarta-feira, 31 de maio de 2017 - 17h46
* Yêdda Pinheiro Borzacov
É para você que conhece a obra do governador Jorge Teixeira de Oliveira e ama Rondônia, esta crônica de hoje, carregada de lembranças e saudades, na data em que ele se estivesse vivo materialmente, completaria 96 anos – dia 1º de junho.
Abre-se a cortina do tempo e lembro-me daquele oficial do exército brasileiro, o último governador do Território Federal de Rondônia e o primeiro do Estado, chegando ao aeroporto de Porto Velho, em um avião da Cruzeiro do Sul, dia 10 de abril de 1979, anunciando que havia recebido “a missão de transformar o Território em Estado”...
Lembro-me que já no seu discurso de posse, o Governador Teixeirão, nome pelo qual os manauaras o chamavam, de imediato foi absorvido pelos rondonienses, resumiu em estilo próprio a sua futura administração: “aqueles que trabalharem comigo terão que rezar pela mesma cartilha – Trabalho, Trabalho, Trabalho”.
Lembro-me do governador Teixeira, vestindo safari como traje de trabalho e com boné vermelho, usado pelos paraquedistas (praticava o esporte), percorrendo toda Rondônia de helicóptero, em ritmo de trabalho infatigável... os motoristas das estradas o reconheciam em razão da bolha transparente do helicóptero, pela boina vermelha e piscavam os faróis...
Lembro-me do governador Teixeira, audacioso nos seus planos, administrando-os com perseverança e otimismo, mantendo sérios esquemas de controle das execuções, sempre atento às datas de conclusão e avaliação da qualidade...
Lembro-me do governador Teixeira, dotado de um determinismo e vontade férrea, jamais se deixando subjugar diante das dificuldades, contornando-as, solucionando os conflitos, através de atitudes incisivas e corajosas, ligadas às suas maneiras de pensar, seus modos de agir...
Lembro-me do governador Teixeira fazendo Rondônia experimentar um enorme surto de progresso com as estradas abertas e que foram fundamentais para iniciar a consolidação do futuro Estado...
Lembro-me do governador Teixeira defendendo com firmeza os interesses de Rondônia e o carinho para com a sua gente... Não andava com seguranças... e as crianças ao vê-lo, corriam para abraçá-lo, gritando: “Teixeirão, Teixeirão”...
Lembro-me do governador Teixeira atraindo o povo, com aquela extraordinária personalidade, de onde transbordava a esperança, a solidariedade e a capacidade de evolução...
Lembro-me que Rondônia, de 10 de abril de 1979 a maio de 1985 era um canteiro de obras: Banco do Estado de Rondônia, Tribunal de Contas, Ministério Público, Poderes Legislativo e Judiciário, Ginásio de Esportes nos municípios, Universidade, Hidrelétrica de Samuel, Hospital de Base “Ary Pinheiro”, escolas dentre outros... Rochilmer Rocha o comparava “a um trator, removendo terra e construindo, mesmo que para isso tivesse que atropelar burocracia e politicagem”...
Lembro-me do governador Teixeira, guardião do patrimônio histórico material e imaginário de Rondônia, entendendo que a cultura, como herança e trabalho... recuperação de 23 km da E.F. Madeira-Mamoré em Porto Velho... 5 km em Guajará-Mirim... restauração de locomotivas e outros materiais rodantes e de prédios... a instalação do Museu Ferroviário com acervo de cerca de 2000 peças... a criação do Arraial Flor do Maracujá e Mostra de Quadrilhas e Bois-Bumbás... a criação e instalação da Casa do Artesão, no Plano Inclinado... o Centro de Documentação e Pesquisa Histórica... a recuperação do Posto Telegráfico de Rondon, em Ji-Paraná, para a implantação do Museu das Comunicações “Cândido Mariano da Silva Rondon”... a criação da Galeria Arte-Centro (o primeiro espaço concedido para o artista plástico expor suas telas)... homenagem aos músicos integrantes da banda de música da extinta Guarda Territorial, entregando-lhes diplomas... avivaram-se em minha memória as mais belas melodias selecionadas pelos já músicos velhinhos, tocadas harmoniosamente e com grande emoção, homenageando Teixeirão, tendo como cenário a praça das Três Caixas D’Água...
Lembro-me do governador Teixeira usando estratégia inteligente para atrair o médico Claudionor Roriz, militante do MDB – Movimento Democrático Brasileiro para presidente do PDS (ex-Arena), com a finalidade de organizar o partido da direita e estruturá-lo nos municípios e distritos... para atingir seu objetivo, desviou o projeto da recém construída penitenciária em Ji-Paraná e com algumas adaptações destinou-a para um hospital (exigência de Roriz). Com o aval do Ministro da Justiça, o hospital foi inaugurado para satisfação de Roriz, que duvidava que o hospital saísse...
Lembro-me do governador na eleição de 1982, dirigindo uma mensagem ao povo rondoniense: “Ao entrar na cabine você estará julgando o meu governo. Se entender que estamos trabalhando, dê seu voto aos nossos candidatos”... e o resultado foi que elegeu os três senadores e das oito vagas a deputado federal, cinco foram seus candidatos... o povo julgou seu governo com louvor e aplausos...
Lembro-me que o governador acompanhou o jornalista Alexandre Garcia em sua visita a Rondônia, iniciando-a com um passeio na locomotiva da E.F. Madeira-Mamoré e depois de helicóptero visitavam os municípios... Alexandre Garcia em seu livro “Nos Bastidores da Notícia”, lançado em 1990, dedica capítulo ao Estado, fazendo referência em um dos textos a Vilhena: “Entre a cidade e a divisa com o Mato Grosso, Teixeirão tem uma surpresa: a BR-364 está congestionada de caminhões parados. Há centenas de caminhões atolados no barro. Teixeirão faz o helicóptero pousar junto aos barracos da empreiteira que estava asfaltando a estrada.
— Onde está o engenheiro responsável?
— Está na cidade almoçando.
— Mas que almoçando? Os caminhões atolados e ele almoçando? Os motoristas não estão almoçando; e ele está almoçando, enquanto tem aqui este serviço porco? Eu quero ele aqui agora, passando as máquinas nesse barro!
Os motoristas se aproximam:
— Ele é o Teixeirão. Já nos ajudou lá em Ji-Paraná, nos deu comida quando a gente estava atolado.
— Vocês não podem fazer um arroz com feijão para essa gente? Pergunta o governador ao capataz da empreiteira.
O Teixeirão falava com os pés enterrados no barro. A camisa já estava toda enlameada pelas mãos dos caminhoneiros que queriam cumprimentá-lo, tocar nele. Foi quando surgiu na boleia de um caminhão recém-chegado do sul uma mulher motorista, que gritou:
— Quem é esse cara?
— É o governador – respondem os motoristas.
— Ah! Diz a mulher com ironia, é o governador deste lamaçal? A gente entra no seu Estado e dá com a fuça neste lamaçal. Por que tem tanta estrada boa e quando a gente chega aqui encontra esta estrada horrível?
Teixeirão não perde o humor:
— Pela mesma razão que tem mulher horrível como a senhora e tem mulher bonita. Mas a minha estrada tem cura.
Os motoristas dão barrigadas de rir em torno do governador, e a mulher sai dali, sem graça, patinando no lamaçal.
Logo em seguida, mais sem graça, ainda, chega o engenheiro responsável.
— Que diabo de obra é esta? – pergunta o governador. Já tem gente perdida no cerrado, tentando evitar a estrada.
— Mas eu estou esperando o laudo técnico – tenta justificar o engenheiro.
— Mas que laudo técnico, homem? Nós estamos numa emergência, isto é uma guerra, e você vem me falar em laudo técnico? Eu quero é ver estes caminhões saindo daqui agora mesmo. Você está cheio de máquinas. Bote essas merdas para trabalhar. A riqueza tá aí parada, o pessoal está sem comer. Olhe, eu ainda vou até Colorado. Volto aqui às quatro da tarde e não quero ver um só caminhão atolado. Quero a pista desimpedida!
Às quatro da tarde passamos por lá, de volta. A porta de ligação de Rondônia com o resto do Brasil estava desimpedida. Aberta. Empurrada pelo peito do Teixeirão. Agora eu entendia por que os faróis piscavam quando os motoristas viam o gorro vermelho na cabeça daquele gaúcho na cabine do helicóptero”.
Lembro-me do governador cujo desprendimento possessivo aos bens terrenos materiais e valorização ao próximo, fez com que presenteasse em 1984 o cadete Christómo de Moura (hoje coronel de engenharia, militar da reserva), com a própria espada de oficial do exército que carregou em sua vida militar, em face do cadete Christómo ter sido seu aluno do Colégio Militar em Manaus e que se formaria naquele ano na turma de oficiais na Escola Militar de Resende... sua família reside em Costa Marques... Teixeirão foi seu padrinho e a espada foi entronizada ao acervo do Memorial Jorge Teixeira, em solenidade ocorrida em 2016...
Lembro-me que a voz do povo consagrou o slogan “Teixeirão – Senador/1987”... a doença e sua partida para o Mundo Maior (apenas a cruel moléstia o derrotou), impediram a realização do sonho de quase todos os rondonienses, sonho que era também o seu...
Lembro-me do governador que viveu intensamente Rondônia. Com ele encerrou-se o último capítulo da História dos bandeirantes nessas terras de Rondon...
Lembro-me que Manaus e, sobretudo Rondônia têm dívida imensa com Jorge Teixeira, razão pela qual seus ex-assessores e amigos criaram a Sociedade Jorge Teixeira, sem fins lucrativos, e instalaram a obra imperecível do grande governador e estadista... não se pode conceber a criação do Estado sem Jorge Teixeira, presença marcante, presença renovadora...
Lembro-me do governador que com a saúde abalada, recusou o tratamento fora do Estado, afirma o médico Viriato Moura... desejava concluir o trabalho de solidificação de Rondônia... mesmo doente participava de atividades, não diminuindo o ritmo de trabalho...
Lembro-me do governador já com a doença avançada, no Rio de Janeiro, em 1987, ao visitá-lo, perguntava com voz firme e forte pelos projetos culturais que estávamos desenvolvendo, sobretudo na E.F. Madeira-Mamoré. Não lhe ouvi uma palavra de amargura (encontrava-se em uma cadeira de rodas); não lhe ouvi uma queixa. Era um estoico. Em momento algum demonstrou arrependimento pelos sacrifícios que havia feito. Sua aparência era frágil, mas sempre sorrindo.
Lembro-me do governador que no dia 28 de janeiro de 1988 partiu para o Mundo Maior, pobre de bens materiais, mas deixando seu nome eternizado na memória da História de Rondônia – exemplo edificante para as novas gerações...
Testemunha da transformação do Território em Estado, afirmo categoricamente que depois de Aluízio Pinheiro Ferreira, nenhum governante o superou na tarefa de servir ao povo, com desprendimento, determinação e sem laivos de bajulação ou queima de incenso aos parlamentares...
O privilégio de tantos anos de trabalho na área cultural e de amizade com o governador Jorge Teixeira e com a sua esposa, dona Aída, dá-me razões de todas ordens que mais que justificam, tornam imperativa esta crônica, referente a um ser humano pleno de dignidade, generoso, solidário, humano, amigo e leal.
Ao Governador Teixeira, o respeito que lhe tive, sempre terei.
Lembro ainda que o governador Teixeira, prossegue o seu trabalho no Mundo Espiritual, construindo algo e ajudando com certeza o Estado de Rondônia.
Selva, Teixeirão!
NOTA:Quanto aos 96 anos de nascimento do Cel. Jorge Teixeira, a 17ª Brigada de Infantaria de Selva Forte Príncipe da Beira, recordará as virtudes cívicas no dia 2 de junho, às 8h30, do oficial e governador de Rondônia, vitorioso em todas as atividades que empreendeu.
* Yêdda Pinheiro Borzacov, da Academia de Letras de Rondônia, do Instituto Histórico e Geográfico de Rondônia, vice-presidente do Memorial Jorge Teixeira, da Academia Histórica Militar Príncipe da Beira, colunista do site Gente de Opinião e do jornal Alto Madeira.
Governador Jorge Teixeira de Oliveira, Isaias Vieira e Yêdda Pinheiro Borzacov, mostrando obras de arte na galeria Arte-Centro. Foto: Arquivo Pessoal/Yêdda Borzacov
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