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Yêdda Pinheiro Borzacov

UNIÃO E PERSEVERANÇA CEM ANOS DE HISTÓRIA - Yêdda Pinheiro Borzacov


AUG: CRUZ DA PERFEIÇÃO MAÇÔNICA

R\L\S\: UNIÃO E PERSEVERANÇA, Nº 947

CEM ANOS DE HISTÓRIA (1918-2018)

* Yêdda Pinheiro Borzacov

AUG: Cruz da Perfeição Maçônica R\L\S\: União e Perseverança nº 947 – Cem Anos de História (1918-2018) é o título do livro do historiador, professor doutor e confrade do Instituto Histórico e Geográfico de Rondônia e da Academia de Letras de Rondônia, lançado no dia 24 de janeiro dentro das comemorações alusivas ao centenário da Loja, vinculada ao Grande Oriente do Brasil – Rondônia, sempre prestando beneméritos serviços à sociedade de Rondônia nas áreas da filantropia, ação social e civismo.

Reproduzo abaixo uma crônica de minha autoria, inserida no livro do renomado pesquisador e historiador Dante Ribeiro da Fonseca, obra que merece ser incluída no acervo bibliográfico histórico e cultural do estado:

BAILE DE GALA EM PORTO VELHO

Associando-me às homenagens merecidamente prestadas à Loja Maçônica União e Perseverança, no centenário do seu nascimento em Porto Velho, aceitei honrada e feliz o convite do amigo e historiador Dante Ribeiro da Fonseca, para escrever alguma lembrança referente ao baile de gala promovido pela nobre instituição no dia 24 de junho, nos fins da década de 1950.

A adesão foi movida pelas saudades dos anos da juventude, quando participava daqueles bailes memoráveis, acompanhando meu pai, Ary Tupinambá Penna Pinheiro, médico e maçom.

Revisando a memória, nas trilhas do humor que surge impregnado de força subjetiva profunda e penetrante, reconstruí com imagens a fisionomia das pessoas participantes e acontecimentos ocorridos antes e depois da realização de um desses bailes. Um deles idealizado e concretizado pela impulsividade e inexperiência juvenil.

O evento, além de propiciar à ocasião inestimável oportunidade de confraternização entre a classe maçônica e membros da sociedade, tendo à frente, nomes que constituíam a bandeira da vida cultural da então bucólica e sossegada cidade, contribuía para que as costureiras fizessem um extra em seus proventos. Assim sendo, dona Floripes Carvalho, dona Agostinha Miranda Jorge, dona Maria Riva, dona Maria Silva e dona Berila trabalhavam até a madrugada visando atender satisfatoriamente a clientela feminina, ansiosa e entusiasmada para exibir os modelos escolhidos na revista Manequim, confeccionados em tecidos de organza, seda pura, laise, organdi ou renda.

A banda da Guarda Territorial regida pelo maestro Antônio Pires Dantas, músico gabaritado, oriundo da Polícia Militar do Amazonas e que legou à musicalidade porto velhense, composições, tais como: marchas militares e fúnebres e dobrados de apurada melodiosidade. O historiador e maçom Esron Penha de Menezes relata em seu livro II, “Retalhos para a História de Rondônia” que foi o maestro Dantas o autor das partituras dos “Céus do Guaporé”, escolhido para hino do estado com o nome “Céus de Rondônia”. Seu filho, José Dantas, legítimo sucessor das manifestações sentimentais do pai, preparava também com equilíbrio, ritmo e harmonia a seiva de composições musicais constituída por valsas, boleros, mambos, sambas e outras que animariam o renomado baile.

A presença de casais da considerada elite, era expressiva, entretanto um item era observado rigorosamente: rapazes não recebiam convite, atitude antipatizada e que indignava as moçoilas frequentadoras que gostavam imensamente de dançar e para não ficarem fazendo “crochet” (termo usado para as jovens que comparecendo às festas não eram convidadas a dançar, ficando sentadas), submetiam-se a bailar com os amigos dos pais, considerados por todas nós de velhos, “caindo aos pedaços”.

Naturalmente como toda jovem, possuía minha turma, “patota”, como assim é denominada hoje, e como não apreciávamos o costume, o gesto, o hábito e a maneira de ser cultivados com esmero pelos senhores maçons da época, fato que definia o perfil sociocultural de Porto Velho antiga, antiquíssima, traçamos um plano: cada uma de nós procuraria surrupiar um convite dos vários que os papais receberiam para distribuir aos casais amigos. No dia seguinte do plano ser aceito por todas, encontrei (que sorte!), embaixo de um livro que meu pai esquecera em cima de um móvel, os desejados convites que propiciariam a entrada de nossos amigos – pares de danças. Audaciosa e com singular presteza, os convites foram para a minha bolsa e o livro para uma das estantes. Faceira e orgulhosa da corajosa façanha, reuni a turma e mostrei os sonhados e tão desejados convites, recebendo de imediato, aplausos, abraços e vivas. O anseio que considerávamos justo de transpor as limitações oferecidas para a realização do baile foi efetivado em razão do meu grande atrevimento. E o meu pai? Esquecera totalmente dos convites ou não lembrara onde os havia guardado.

Ao chegarmos elegantes e lindas (assim nos achávamos), os nossos convidados já se encontravam sentados ao redor de mesinhas e quando a banda (a única da cidade) iniciou a primeira música, Liberalino Souza, Aricy Biloia, Carlos Papafanurakis, Divancy Oliveira, Rubens Rodrigues e José Carlos Ribeiro, dentre outros, dirigiram-se às mesas onde as dançarinas se encontravam, convidando-as para a dança (era hábito da época). Ao término da dança, aplausos e bis e depois o cavalheiro conduzia o seu par à mesa e agradecia.

Testemunha preocupada e curiosa daquela presença explosiva da rapaziada, o maçom Emanuel Pontes Pinto aproxima-se de meu pai e com aquela esmerada educação de sempre, com voz pausada e grave, com discrição exclamou:

— Ary, quem convidou esses rapazes? Gostaria imensamente de saber. Nunca, jamais esse fato ocorreu.

E meu pai, respondeu:

— Como vou saber? Os convites não foram contados e distribuídos para nós entregarmos só para casais amigos conhecidos? É bom apurar o sucedido.

Eu, ao lado, muda, calada, séria, fingindo não ter escutado o diálogo, aguardava o início de uma nova música para prosseguir dançando e rindo intimamente da “peça” que pregamos nos “velhos” senhores.

Essas lembranças compõem a marca indelével de uma juventude porto velhense sadia e feliz. Lembro-me dos versos de Camões:

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, muda-se o ser, muda-se a confiança, todo mundo é composto de mudança tomando sempre novas qualidades.

Às vezes os tempos modernos procuram ofuscar épocas pretéritas, entretanto, a Loja Maçônica União e Perseverança resgata, este ano, o baile de gala que enterneceu e encantou uma geração. Como esquecê-lo?

* Yêdda Pinheiro Borzacov, da Academia de Letras de Rondônia, do Instituto Histórico e Geográfico de Rondônia, vice-presidente do Memorial Jorge Teixeira, da Academia Histórica Militar Príncipe da Beira e colunista do site Gente de Opinião.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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