Segunda-feira, 22 de outubro de 2012 - 10h55
Flavio Miguez de Mello
Por ocasião da Rio+20 o secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio
Zimermmann, indicou o caminho a seguir quando afirmou que “O mundo passou a
enxergar a capacidade de construir hidroelétricas como algo estruturante, capaz de
ajudar países em desenvolvimento.” O desafio que foi miraculosamente vencido pela
engenharia brasileira nos anos sessenta com a construção de algumas das mais
expressivas hidroelétricas do mundo, se repete agora pela necessidade de instalação
de cerca de 6000 MW por ano. Assim como nos anos sessenta, a opção mais
econômica se volta para a produção de grandes blocos de energia concentrados em
hidroelétricas de grandes portes cujos potenciais hoje se concentram na Amazônia
Legal, distantes dos principais centros de consumo de energia elétrica.
O potencial hidroelétrico brasileiro é estimado em 246 GW e apenas menos de um terço
é presentemente explorado. Historicamente, desde o final do Século XIX, a geração
hidroelétrica tem sido o principal propulsor do desenvolvimento nacional, sendo
caracterizada como produção de energia limpa e de fonte renovável.
Em futuro próximo deverá ser iniciada a exploração de mais um grande rio amazônico:
Os aproveitamentos hidroelétricos de São Luiz e Jatobá, ambos no rio Tapajós, deverão
adicionar 8471 MW ao sistema interligado. Encontram-se em construção outras quatro
grandes hidroelétricas estruturantes localizadas na Amazônia: Estreito em final de
montagem, colocou em julho a sétima das oitos unidades de 135,8 MW em operação
comercial, Santo Antônio que já tem seis unidades geradoras em condições de
operação, devendo atingir 766 MW em operação até o final do ano (entretanto, o longo
sistema de transmissão com 2.383 km de extensão conectado em Araraquara não
deverá estar operacional antes de dezembro), Jirau em plena construção no rio Madeira
e Belo Monte em início (conturbado) de construção no rio Xingu. A Amazônia Legal
poderá abrigar metade das 48 usinas previstas para entrarem em operação até de 2019
pelo Plano Decenal de Energia definido pela Empresa de Pesquisa Energética EPE.
O planejamento do governo indica que a expansão da oferta de energia elétrica a partir
de 2014 será feita exclusivamente a partir de fontes renováveis.
Segundo divulgação da EPE, a participação de fontes renováveis em 2011 atingiu
88,8% refletindo acréscimo de 2,5% em relação a 2010, tendo havido um acréscimo
nesse período de 6,3% na geração hidroelétrica. A oferta de energia elétrica em 2011
cresceu apenas 1,3% em relação a 2010, mas o consumo aumentou 2,6%. Pelo Plano
Decenal de Expansão as hidroelétricas devem perfazer 51% do acréscimo de
capacidade instalada com predominância em grandes hidroelétricas na Região
Amazônica. A capacidade instalada no País deverá passar de 117 GW em 2011 para
182,4 GW em 2021, dos quais 33 GW deverão ser de novas hidroelétricas.
Dos anos sessenta aos anos noventa foram implantadas diversas hidroelétricas com
reservatórios de regularização que conferiram ao País uma invejável matriz energética
limpa e econômica. Assim, foram implantados inicialmente os reservatórios de
regularização plurianual de Três Marias e Furnas que regularizaram os rios São
Francisco e Grande, possibilitando a instalação de inúmeras geradoras com destacada
economicidade que conferiram elevada garantia de suprimento energético. A operação
dos reservatórios de Furnas e principalmente de Três Marias, veio salvar, pouco após
terem sido implantados, toda a Região Nordeste de colapso sem precedente já no final
dos anos sessenta, através de intrincada operação de interligação hidráulica visando a
otimização operacional de sistemas que na época não eram eletricamente interligados.
A esses dois grandes reservatórios de regularização se seguiram outros importantes
tais como os reservatórios das hidroelétricas de Sobradinho e Itaparica no Nordeste,
que viabilizaram a usina de Xingó e as sucessivas ampliações de Paulo Afonso, no rio
São Francisco, os reservatórios das hidroelétricas de Emborcação, Itumbiara e Ilha
Solteira que beneficiam as usinas nos rios Paranaíba e Paraná, o reservatório de Foz
do Areia, peça chave para o rio Iguaçu e o reservatório de Serra da Mesa que viabiliza
projetos no rio Tocantins. Através do sistema interligado os grandes reservatórios
beneficiam todas as unidades geradoras integradas ao SIN.
Especial menção deve ser feita à operação dos reservatórios das empresas do setor
elétrico, operação esta que, mesmo não sendo sua principal finalidade, tem procurado
minimizar, na medida do possível, os deletérios efeitos de descargas extremas de
estiagens e de cheias, estas geradoras de inundações com potencial de ocasionar
consequências catastróficas. Exemplos mais marcantes são os critérios de operação
dos reservatórios de hidroelétricas existentes na bacia hidrográfica do rio Paraíba do
Sul. Os reservatórios interligados de Paraitinga e Paraibuna e os reservatórios de
Jaguari e Santa Branca, situados no trecho superior da bacia hidrográfica do rio Paraíba
do Sul em São Paulo, bem como o reservatório de Funil, situado na bacia média, têm
critérios de operação condicionados para a manutenção de descargas compatíveis com
as captações de água para indústrias e para populações, inclusive para 94% da
população do Grande Rio, e para controle de cheias, já tendo sido evitadas severas
inundações que teriam ocorrido ao longo do vale que é densamente povoado em toda
sua extensão.
Os sistemas elétricos passaram de períodos críticos (espaço de tempo que o sistema
permanece fornecendo energia em condições normais mesmo em períodos da mais
extrema estiagem) de pouco mais de um ano na primeira metade do século passado,
para três anos sucessivos nos anos sessenta, atingindo ao máximo de 7,5 anos
sucessivos nos anos oitenta (o que revelava elevada confiabilidade na garantia de
suprimento de energia elétrica) para colapsar no apagão de 2001 por falta de
investimento na capacidade de regularização de vazões em reservatórios que
pudessem garantir o suprimento de energia em épocas de intensas e prolongadas
estiagens. As consequências econômicas e sociais do que se denominou apagão são
conhecidas de todos por terem sido recentes. Entretanto, há aparentemente um grande
esforço para que essa experiência seja esquecida em detrimento da confiabilidade e da
economicidade do sistema elétrico.
Tendo em vista as generalizadas resistências autodefinidas como ambientais, nos
processos de licenciamento ambiental que se verificam em anos recentes, os projetos
de hidroelétricas têm sido desenvolvidos como usinas a fio d’água, sem reservatórios
que contenham volumes úteis capazes de contribuir para armazenamento de energia e
regularização dos cursos d’água e, consequentemente, desprovidos de capacidade de
firmar maiores blocos da energia para todo sistema interligado. Presentemente o setor
elétrico, que antes dispunha de consideráveis capacidades de regularização de
descargas e, consequentemente, de elevada garantia de estocagem de energia,
observa a perda gradual da possibilidade de firmar a geração por causa crescimento da
demanda sem que haja o correspondente acréscimo da capacidade de regularização.
O caso mais marcante é a transformação do projeto da hidroelétrica de Belo Monte
presentemente em construção no rio Xingu. As renúncias na produção de energia
elétrica pela redução da capacidade de regularização visando minimizar os impactos
ambientais que seriam causados por inundação de terras no local da usina, fez com
que esta passasse de um fator de capacidade de 55% para menos de 40%,
correspondendo a um benefício renunciado superior a R$ 2 bilhões por ano, benefício
renunciado este que terá que ser compensado com a instalação de outras fontes de
energia em outros locais. A sociedade deve entender que, ao reduzir ou mesmo
eliminar a capacidade de regularização das novas hidroelétricas, aparece a
necessidade de instalação de elevadas capacidades em termoelétricas ou
termonucleares para garantir a confiabilidade de fornecimento de energia, pois
hidroelétricas a fio d’água, usinas eólicas e usinas solares não têm capacidade de
armazenar energia. Portanto, para cada potência instalada nas usinas atuais, há
necessidade de instalação de potências complementares em novas usinas térmicas,
onerando o sistema e sujando ainda mais a matriz energética brasileira que era uma
das mais limpas do mundo. Dessa forma, ambientalistas, mesmo com a melhor das
intensões de combater impactos ambientais negativos localizados, contribuem para
vigoroso aumento de impactos negativos no conjunto do território nacional.
Prevê-se que o setor elétrico deverá passar por momentos difíceis já a partir de 2013.
Apesar de gerar energia limpa, o modelo presentemente adotado que privilegia usinas
eólicas e hidroelétricas operadas a fio d’água, vai causar impactos nos custos da
energia, além de instalação e da necessidade do despacho cada vez mais frequente de
termoelétricas mais poluentes.
Como consequência, usinas térmicas, inclusive as dieselelétricas, têm sido
despachadas para o atendimento da ponta de carga, onerando sobremaneira o custo
dos serviços de suprimento de energia para os consumidores. Presentemente estão
sendo despachadas 6500 MW de usinas térmicas, dos quais 2000 MW são
provenientes das duas unidades nucleares.
Estudo feito pela COPPE-UFRJ revela que uma termoelétrica a óleo emite 1,2
toneladas de C02/MWh, uma termoelétrica a carvão despeja 1,3 toneladas de
C02/MWh enquanto que numa hidroelétrica o volume de emissões varia de 0,05 a 0,5
toneladas de C02/MWh.
Essa tendência de carência de capacidade de regularização de descargas nas novas
hidroelétricas deverá ser acelerada com a entrada das grandes hidroelétricas
estruturantes presentemente em construção nos rios Xingu, Madeira, Tapajós e Teles
Pires, praticamente desprovidas de volumes úteis em seus reservatórios, e do grande
número de usinas eólicas que não dispõem de recursos físicos para estocagem de
energia. Em 2010 chegaram a ser despachados 9.000 MW térmicos para atendimento
da ponta, sendo previsto o intenso agravamento dessa situação nos anos vindouros.
Nossa matriz de geração de energia elétrica que, desde seu mais remoto início há mais
de um século, foi sempre caracterizada como sendo uma das mais limpas existentes,
está se tornando aceleradamente suja em função de uma falsa proteção ambiental que,
além de demandar a necessidade de implantação de usinas térmicas poluidoras,
contribui para a perda de economicidade do setor com os consequentes acréscimos de
tarifa que penalizam os consumidores residenciais e encarecem os produtos
industrializados, diminuindo a competitividade da indústria nacional.
Dados divulgados pela ANEEL dão conta da baixa confiabilidade do sistema que em
parte pode ser atribuída à concentração de geração de grandes blocos de energia a
longas distâncias dos centros de carga e à consequente carência de geração
distribuída. Em 2011 ocorreram mais de 200 apagões de grandes proporções no País.
Nos últimos três anos cada brasileiro ficou em média apagado durante 18,5 horas por
ano.
Apesar desses aspectos negativos, Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de
Pesquisa Energética, afirmou que “graças às hidroelétricas o Brasil é hoje um dos
países com menor nível de emissão (de gases de efeito estufa) do setor elétrico do
mundo,” acrescentando que as hidroelétricas são vetores de desenvolvimento regional,
econômico e social. Mário Veiga, presidente da consultora PRS, afirma que “Nossos
reservatórios também armazenam vento e cana.” Mário Santos que sempre vivenciou
planejamento energético mesmo antes de assumir a presidência do Operador Nacional
do Sistema Elétrico, estava plenamente correto quando afirmou, em recentemente
entrevista publicada no livro História das Barragens no Brasil, que a atual tendência de
reduzir projetos hidroelétricos a usinas operadas a fio d’água por receios de resistências
nos processos de aprovação ambiental é caso de lesa pátria.
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