Domingo, 8 de novembro de 2015 - 00h01
"Temos o direito de ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito de ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades"
(Boaventura de Sousa Santos).
Francisco das C. Lima Filho[1]
Na semana passada a questão do racismo voltou a pauta em virtude do lamentável e condenável acontecimento com a atriz Tais Araujo, que foi vítima de comentários desairosos e preconceituosos em razão da cor.
Esse acontecimento nos faz refletir, mais uma vez, sobre o problema do preconceito racial, infelizmente ainda recorrente no Brasil, em que pese a inútil tentativa de escondê-lo.
Pode-se afirmar que o racismo é a convicção sobre a superioridade de determinadas raças[2], com base em diferentes motivações, em especial as características físicas e outros traços do comportamento humano. Consiste, pois, "em uma atitude depreciativanão baseada em critérios científicos em relação a algum grupo social ou étnico".
Lastimavelmente esse tipo de comportamento existe desde os mais remotos tempos na História da Humanidade, e quase sempre foi usado como instrumento de defesa de um grupo contra invasores pacíficos que apresentavam características distintas. Porém, ganhou mais fôlego com a colonização pelas potências europeias que se sentiam superiores aos povos conquistados ou colonizados, especialmente nas Américas e África.
No Brasil, em que pese um discurso, muitas vezes hipócrita, de fraternidade e igualdade, a discriminação racial, fruto do preconceito, ainda existe e de forma bastante acentuada, embora insistentemente negada.
Um país que se pretende democrático não pode conviver com a discriminação e o preconceito de qualquer natureza ou origem.
O preconceito que leva à discriminação ainda é muito forte no Brasil e termina levando muitas vezes certos segmentos sociais como os negros, os homossexuais, os povos indignas, nordestinos, os obesos e tantos outros grupos a serem vítimas de discriminação, em que pese sermos signatários de vários documentos internacionais proibitórios da discriminação, como, por exemplo, da Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racional (ONU), e encontrar-se expresso no Texto Magno não apenas o direito à igualdade, mas também o pluralismo e a fraternidade (arts. 1º e 3º da Carta de 1988).
Esse quadro de discriminação não se justifica, pois à medida em que os Estados ratificam as Convenções internacionais sobre o combate a todas as formas de discriminação assumem, no âmbito internacional e interno, a obrigação de, progressivamente, eliminar todas as formas de discriminação, assegurando assim, o pleno e efetivo exercício da igualdade, mas não uma igualdade formal no ponto de partida e sim uma igualdade substancial no ponto de chegada com medidas que além de combater a discriminação, sejam capazes de conscientizar, pela educação e pela criação de oportunidades de inserção social dos discriminados no processo de cidadania, de modo que aqueles que não têm as mesmas oportunidades e visibilidade da atriz Tais Araujo, também possam ter seus direitos respeitados.
No âmbito interno encontramos todo um arcabouço normativo de combate à discriminação, a começar pela Constituição brasileira estabelecendo (art. 3o) como um dos objetivos da República Federativa do Brasil, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” enquanto no art. 5o (incisos XLI e XLII) o constituinte estabeleceu que o Estado punirá “qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais” acrescentando que a “prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”.
Visando dá cumprimento prático a essas promessas do constituinte, foi editada a Lei 7.716, de 05 de janeiro de 1989, que define os crimes resultantes do preceito de raça ou cor, e em 13 de maio de 1997 foi aprovada a Lei 9.459/97 estabelecendo a punição dos crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou precedência nacional, alterando a Lei 7.716/89 de tal forma que ampliou o seu objeto de tutela que inicialmente estava restrito ao combate dos atos resultantes de preconceito de raça ou cor, o que foi reforçado pela edição da Lei 12.228/2010 que institui o Estatuto da Igualdade Racial, ainda não bem compreendido nem implementado na prática.
É claro que essas leis ainda não conseguiram alcançar o almejável e necessário efeito prático porque o preconceito, especialmente o racial que fomenta a discriminação, ainda que alguns não queiram admitir, infelizmente encontra-se arraigado na cultura brasileira e mostra-se ainda muito presente como se viu de lamentáveis episódios de que foram vítimas uma cabeleireira em Brasília e um vendedor-ator no Rio de Janeiro e agora a atriz Tais Araujo.
Mas não se pode esquecer que esse tipo de comportamento ocorre rotineiramente com pessoas simples e sem visibilidade, sequer denunciados e por isso mesmo não chega ao conhecimento das autoridades nem são levados em consideração pelas estatísticas e estudos, evidenciando a grande dificuldade de aplicação prática da lei, especialmente pelas deficiências na produção da prova dessa inadmissível e criminosa prática.
De fato, a prática o preceito racial apresenta-se de forma bastante sutil e quase sempre disfarçado com outras práticas igualmente criminosas de difícil comprovação, máxime porque o racismo e a discriminação costumam ser praticados por pessoas pobres de espírito que, por ignorância que gera o preconceito, julgam os seus semelhantes pela aparência ou pela cor da pele como se estes elementos fossem capazes de qualificar o ser humano..
Nesse quadro, urge a adoção de medidas severas de punição desse tipo de prática para que possa servir de exemplo e desestimular aqueles que ainda não aprenderam a conviver com a diferença e com o respeito ao semelhante, mas também de criação de oportunidades de inserção social e no processo de cidadania daqueles que invisível e anonimamente são discriminados, principalmente dos grupo mais vulneráveis a esse insidiosa prática.
Como disse Nelson Mandela: "Eu odeio o racismo, pois o considero uma coisa selvagem, venha ela de um negro ou de um branco".
[1] Desembargador do TRT da 24ª Região. Mestre em Direito pela UNB.. Mestre e Doutor em Direito Social pela UCLM (Espanha).
[2] Embora cientificamente exista apenas uma raça: a Raça Humana.
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