Segunda-feira, 13 de janeiro de 2025 - 18h34
Certa
vez, padre Vitor Ugo, que já não era padre, mas dizia que uma vez padre, sempre
padre, durante uma exposição do VII Salão de Artes Plásticas de Rondônia – Sart,
na Casa de Cultura Ivan Marrocos, me puxou pelo braço, para me mostrar um
quadro da arte moderna abstrata, com perguntas contundentes: - professor, o
que você acha desse quadro? Tem meia hora que olho em todas as posições e não
vejo nada, será que a arte pode ser resumida em simples traços coloridos?
Atordoado
com a revolta do padre, medi e pesei as palavras, para não ferir o historiador,
o intelectual perdido no mundo da emoção: Meu caro Padre, esse é um ramo das
artes plásticas, cuja realidade é subjetiva e cabe ao expectador defini-la.
Procure sentir, deixe as formas e as cores invadirem sua alma. Liberte-se
da superfície, viaje!!! Observe que cores e formas são usadas para representar um
universo particular e único de emoções e sentimentos, resultando em sensações.
Perceba que o instante criativo é fruto de uma “necessidade interior”.
Após
movimentos contorcionistas, ele me olhou com os olhos arregalados, as pupilas
dilatadas, silencioso e inconformado com meu comentário. Soltou meu braço,
demostrando com os músculos da face que eu não servia para cúmplice de crítico
de artes plásticas. Entre dentes balbuciou: você deve ser mais um desses
intelectuais que acham que entendem de arte. Até logo, professor. Visite a
Itália. Respondi com um respeitoso aceno de cabeça, sabendo que com o
“visite a Itália” ele estava me punindo por eu ter enxergado arte, onde ele via
apenas traços e cores em formatos indefinidos e falsos, uma arte falsa, no
dizer dele. A criação é livre, no entanto, a
contemplação embute conhecimento e sensibilidade. Naquele ano eu fui
honrado com o convite da Fundação Cultural, para compor a comissão julgadora do
Sart.
Segundo os
críticos, a arte abstrata é a arte que não procura elaborar uma representação
visual precisa da realidade. Ela possui um distanciamento de qualquer ponto de
referência objetivo.
O russo Wassily Kandinsky é frequentemente citado como pioneiro desse estilo. Ele
já desenvolvia pinturas não representacionais em 1912. O médico Viriato Moura,
em Rondônia, segue a mesma linha do artista russo e há mais de 50 anos vem
produzindo telas de intensa beleza e profundidade.
Às vezes,
quando Viriato Moura, a quem apelidei O Senhor das Artes, divulga
sua produção no campo das artes visuais, sou tomado de um profundo silêncio, e
me deleito e permito a inversão do olhar. Não escrevo nada, não digo nada. Por
instantes, tenho medo de ferir o entendimento subjetivo de minha alma, com o contorno
objetivo das palavras. É como se minha imaginação e o meu inconsciente fizessem
uma ponte, com o instante criativo transcendental do autor.
Pierre
Bonnard, pintor francês pós-impressionista, ao pintar uma maçã sem a cor e sem
o formato original, deu aos críticos a chance de interpretarem: isto
é aquilo, mas pode ser outra coisa, conforme o olhar. Diferentemente
dos outros saberes, o saber do artista privilegia a ambiguidade. Na literatura,
ela é usada como recurso estilístico e se orgulha de aparências e falares
multi-interpretativos.
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