Segunda-feira, 23 de janeiro de 2023 - 22h20
Quando
meu pai resolveu realizar a exposição dos seus quadros, uma senhora amiga,
muito rica, encontrou-o no Passeio das Caridosas, e após o formalismo da praxe,
disparou:
-
Quando faz a exposição? Avise-me para a ver!
-
Estou a fazer aguarelas e desenhos para ela!
--Pinta
só a aguarela?!
-
Sim! Deixei de pintar a óleo há muitos anos. Não gosto do óleo, mas da luz e da
cor da aguarela, como Daniel Constant. É uma festa, para os olhos!
-
Bem, bem: Estou ansiosa de ver essa exposição, até preciso de um bom quadro.
Meu
pai agradeceu o elogio e a preferência, talvez prevendo possível comprador.
Mas
a senhora continuou muito interessada:
-
Tem de me dar um dos seus quadros!
Meu
pai sorriu contrafeito e tentou desembaraçar-se da "simpática"
senhora, que se declarou conhecedora de arte, tecendo pictóricas opiniões. Já
na despedida, voltou à carga:
-
Não se esqueça de me ofertar o quadro! Que não esqueça!
Afasta-se
um pouco, e volvendo, diz, em alta voz:
-Ah!
Já me ia esquecendo: que seja a óleo. Sim! É que para o ambiente de minha casa,
com marfins, tapetes... o quadro tem de ser a óleo!
A
mim aconteceu, também, caso semelhante:
Entrevistei
poetisa. Recebeu-me festivamente numa mesa recheada de vistosos bolos. Servido
o chá, realizei a entrevista de gravador em punho.
Decorrido
uma semana, soou o telefone. Era ela, dizendo que acabara de editar um livro
seu, e mo ia enviar, contrarreembolso.
Desculpei-me,
argumentando que não podia comprar os livros e os quadros de todos que
entrevistava.
-
Mas, são só vinte euros!...Não me diga que não tem vinte eurinhos!?...
Ficou
amuada, e deixou de me chamar " ilustre" jornalista, coisa que não me
preocupou, porque sou tudo, menos ilustre...
Há
pessoas de inaudito descaramento. Uma, queria um quadro de graça; outra
desejava vender um livro por vinte euros!...
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