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Crônica

Doutor


Luiz Albuquerque - Gente de Opinião
Luiz Albuquerque

No meio acadêmico, Doutor é título oficialmente reservado apenas aos que obtêm o grau de doutorado numa entidade de ensino superior ou que recebem o título Honoris Causa que é atribuído a personalidade eminente por sua contribuição à cultura, à educação ou à humanidade. Os médicos, assim como os advogados, por consideração especial, também ostentam o uso do título de doutor.

Os graus acadêmicos de doutor, no Brasil, recebem diferentes designações, dependendo de suas respectivas áreas de especialidade, como, por exemplo: Doutor em Engenharia, Doutor em Medicina, Doutor em Direito, Doutor em Economia etc. Infelizmente, independentemente de ter ou não graduação, é comum chamar de “doutor” o elemento ou que esteja no poder ou que tenha bastante dinheiro e, por isso, é bajulado.

Pensando nisso, lembrei-me de um fato que presenciei a algumas dezenas de anos numa cidadezinha do interiorzão da nossa Amazônia.

Estava de passagem pelo local quando fui convidado para um jantar com algumas pessoas que, naquele dia, haviam participado da sessão de instalação da 1ª Junta de Conciliação e Julgamento do TRT na cidade. O destaque da mesa era um Doutor que viera da capital para a cerimônia. À princípio, numa formalidade incômoda, todos se tratavam de “doutor”. Era um tal de “Dr. Fulano” para cá, “Dr. Beltrano” para lá, que sobrou até para mim, pois fui chamado algumas vezes de “doutor”, ainda que explicasse que não possuía tão honroso título.

Discursos (muitos). Jantar, bebidas, mais bebidas, e, aos poucos, os paletós foram para os encostos das cadeiras, as gravatas e as gargantas foram se soltando e os títulos, sumindo. Não demorou muito para eu descobrir que todos os presentes eram funcionários da Prefeitura local ou aliados do prefeito. A exceção era o “de fora”, o destaque, o “Doutor” ali tão adulado.

Algum tempo depois me vi envolvido em longa conversa com o tal doutor, que logo contou ser operário de uma indústria na capital e que, por suas ações como sindicalista, estava na função de juiz classista mesmo sem ter formação em direito, tendo galgado tal cargo por indicação do sindicato dos trabalhadores para um mandato temporário na Justiça do Trabalho.

A única pessoa do evento que tinha, por direito, o título de Doutor, veio somente para a instalação da Junta e logo em seguida, ainda pela manhã, embarcou no mesmo aviãozinho fretado que lhe trouxera horas antes, seguindo sabe Deus para onde. Era o Juiz daquela e de outras duas Comarcas.

PS: o cargo de Juiz Classista foi extinto no ordenamento jurídico brasileiro.

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