Terça-feira, 11 de maio de 2021 - 13h46
O holandês, Rutger
Bregman, autor de Utopia para Realistas, lançou recentemente no Brasil
seu livro mais comentado na Europa e EUA − Humanidade: uma história otimista
do homem. O autor é considerado um dos proeminentes pensadores da
atualidade. Na minha visão de leitor, um livro completa o outro, mostrando uma
nova perspectiva da humanidade que, de certa forma, confirma o pensamento do
filósofo francês Jean Jacques Rousseau: o homem nasce bom e a sociedade
o corrompe, ou, o homem nasce livre e a sociedade lhe coloca correntes. Para
Bregman, “Individualmente, os
humanos não são tão inteligentes. O que nos distingue é que podemos cooperar
como nenhum outro do reino animal”. É um mito considerar que, por
sua própria natureza, os seres humanos sejam egoístas, agressivos, e que
rapidamente entrem em pânico.
Embora com novos
argumentos, aceitáveis cientificamente, é fatigante contestar, em dois
volumosos exemplares, a essa altura do campeonato, pensadores antigos e
modernos, pela assertiva de que os seres humanos, em sua expressiva maioria,
são maus, egoístas por natureza e agem pensando no interesse próprio. Segundo o
conceituado historiador, o ser humano, enquanto Homo sapiens, foi
programado para ser bom, cooperativo, porém, a partir da descoberta da
agricultura, do conceito de propriedade e da competição, os relacionamentos
começaram a se deteriorar, moldando parte do atual pensamento ocidental. Bregman
não concorda com o resultado da evolução e apresenta uma nova visão, um jeito
novo de encarar as coisas. Segundo ele, acreditar na humanidade, na
generosidade e na colaboração entre as pessoas, não é uma atitude otimista – é
uma postura realista. Tarde, mas não tarde demais! Contrariando Nietsche, a esperança
não se cansa de acenar.
Em se tratando
de Brasil, a análise feita sobre a maioria da sociedade tem resultado diferente
daquele feito sobre individualidades, daí porque é difícil uma postura realista
que passe pela crença num político honesto e solidário, num ministro bem
intencionado, num economista querendo diminuir as distâncias sociais, num
médico preocupado em salvar ou curar vidas, despretensiosamente, ou noutro
profissional qualquer, totalmente altruísta. Esta é uma viagem sem retorno. No
entanto o povo brasileiro é um povo bom, honesto e solidário. Nenhum partido de
direita, de esquerda ou de centro, está preocupado com as respostas aos
questionamentos sobre a sociedade, o trabalho, a felicidade, a justiça e o
dinheiro. “Os pactos, sem a força,
não passam de palavras sem substância para dar qualquer segurança a ninguém”
(TH). Primeiro os meus, depois os teus.
As descobertas visionárias do
Bregman são bem vindas, mas o efeito seria maior se o mundo estivesse começando
agora, com novos e iniciantes marcos civilizatórios. Do contrário, necessitaremos
de mais de mil anos só para consertar os estragos que a escravidão fez ao
mundo, em épocas e regiões diferentes. Enxergar humanidade na humanidade, sob a
perspectiva de que a maioria humana é decente e solidária é uma reflexão válida
e funciona como um contraponto ao bombardeio de notícias ruins, emanadas de
dirigentes maus, mas não muda muita coisa, apenas confirma que a generalidade
de Hobbes − O homem é lobo do homem, em guerra de todos contra todos −
não é verdadeira, realmente não somos todos maus, logo não somos insociáveis,
mas precisamos renovar constantemente o pacto social, cuja premissa maior é a
liberdade, fugindo assim ao totalitarismo absolutista, imaginado por Thomas Hobbes,
no Leviatã.
Em várias partes do universo,
são muitos os humanos que navegam contra a maré de maldade, promovendo o bem
com ideias criativas, como os projetos de ajuda ao próximo, promovidos pelo procurador
federal Reginaldo Trindade, com a ajuda de outros confrades/acadêmicos da ARL,
como o juiz Dimis da Costa Braga e o sociólogo Abel Sidney, além das
instituições não governamentais, que, nesses tempos difíceis de Pandemia,
cuidam para que não falte pão na mesa dos invisíveis, nem na do trabalhador
desempregado, que vive à espera da democratização das vacinas. Ademais as
ajudas do pobre ao pobre, repartindo o pouco que consegue, são exemplos de que
realmente há algo de bom na essência humana.
Gente boa existe nos quatro
cantos do mundo, mas as lideranças nacionais foram corrompidas pelo formato
anterior, com pensamentos e estudos científicos que interferiram nas sociedades,
por centenas de anos: “As fronteiras são a maior causa de
discriminação em toda a história mundial. As lacunas de desigualdade entre
pessoas que vivem no mesmo país não são nada em comparação com aquelas que
existem entre cidadãos globais separados geograficamente” (RB). No
século XXI, a verdadeira elite são aqueles nascidos não na família certa ou na
classe certa, mas no país certo.
Os sapiens até podem ter
nascidos com a mesma essência de bondade, mas as sociedades, inexplicavelmente,
sob uma premissa falsa, evoluíram de formas diferentes, amenizando os efeitos da
bondade sobre a humanidade. A descoberta do estudioso é fascinante, mas soa
como algo pensado sob a premissa de que a ociosidade é a mãe da filosofia.
Nos livros do holandês, transparece
uma grande dose de decência humana e acreditamos nisso. Sabemos que são muitos
os que alimentam dentro de si o lobo bom e solidário, mas, infelizmente,
convivemos com uma minoria, formadora de opinião, que comanda a alcateia,
interferindo nos destinos do homem. Talvez, durante a caminhada existencial da
humanidade, alguns despreparados, que se tornaram dirigentes de nações, foram
atingidos por pedradas, advindas do próprio ego freudiano, que lhes atingiu
em cheio a bondade, a decência e a solidariedade, inerentes ao ser humano. Impressões sensoriais não bastam
para modificar a humanidade.
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