Quarta-feira, 31 de agosto de 2022 - 12h54
Fernando Pessoa dizia que
não escrevia em português, escrevia ele mesmo (Eu não escrevo em Português.
Escrevo eu mesmo), também penso assim, o que não significa, que estou
me comparando ao grande poeta. Saramago achava que somos todos escritores, só que
alguns escrevem outros não.
Enquanto
escritor eu sou a janela de mim mesmo, oferecendo vistas aos meus leitores.
Tenho-as para todos os gostos: ora sou alegre, ora chuto o balde e protesto;
produzo crônicas nos seus mais variados segmentos; meus contos são instigantes
e possuem finais inesperados, mas os romances me realizam, são mais completos,
sinto-me heterônomo, posso participar da vida das personagens, não como se
fossem fantoches, nem extensões de mim mesmo, mas personagens de um mundo
independente, criado ora na raiz, ora no apogeu da arte literária.
Ah os poetas, como é legal lê-los, Pablo
Neruda, do alto da sua genialidade, chegou a resumir a arte de escrever
dizendo: Escrever é fácil. Você
começa com uma letra maiúscula e termina com um ponto final. No meio você
coloca ideias. Parece
fácil, mas outro escritor, Henry Miller, disse que nenhum
escritor é bom a não ser que tenha sofrido. Será?
Lembro que, no auge das grandes composições
brasileiras, dizia-se que o autor de uma boa letra precisava do sofrimento,
para se exprimir com a alma, contribuindo com o sucesso do(a) intérprete. Maysa
Matarazzo, a rainha da fossa, comentou diversas vezes que ela só conseguia
escrever bem, se estivesse na fossa.
Por muito tempo o sofrimento foi considerado a
marca registrada dos grandes poetas, não foi à toa que Castro Alves, Fagundes
Varela, Casemiro de Abreu, Alvares de Azevedo e tantos outros, embora românticos,
foram também exaltados por serem vulgarmente melodramáticos na desgraça, quase
todos influenciados pela prosa “miserável” de Victor Hugo.
Eu penso um pouco diferente, concordo com
Fernando Pessoa quando diz que o poeta é um fingidor. Por outro lado, destaco o
prazer do autor, diante da sua obra, como se fosse um artista plástico diante
da tela, para o escritor as tintas são as palavras.
Neste campo minado das autodescrições
literárias, endosso humildemente as palavras do genial cronista Rubem Alves,
reconhecendo que muita gente gosta mais dos meus escritos do que de mim mesmo: Escrever e ler são formas de fazer amor. O
escritor não escreve com intensões didático – pedagógicas. Ele escreve para
produzir prazer. Para fazer amor. Escrever e ler são formas de fazer amor. É
por isso que os amores pobres em literatura ou são de vida curta ou são de vida
longa e tediosa”
Escrever é desejar ao leitor que abra meus livros, a cada
dia, a cada hora, a cada momento, como se estivesse abrindo a janela de seu quarto,
perscrutando vistas agradáveis e criativas.
Todavia
ao abrir a janela da poesia, ficcionista que sou, nas raras vezes que me
aventurei, na difícil arte de poemar, o fiz pelo prazer de uma boa vista,
repetindo à exaustão as palavras de Edgar Allan Poe: E nenhum poema será tão grande, tão nobre, tão
verdadeiramente digno do nome de poesia quanto aquele que foi escrito tão só e
apenas pelo prazer de escrever um poema.
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