Quarta-feira, 29 de janeiro de 2025 - 13h34
Desde que aprendeu a ler,
ouviu dos pais, a mãe professora: − Filho, com a leitura você terá a bagagem
necessária para viajar pelo mundo e o que é mais impressionante, você não só
poderá admirar paisagens, com os guias de viagens, como abrirá espaços mentais,
com o mundo da fabulação dos grandes escritores. A leitura e a pesquisa
internética são a base da bagagem do conhecimento, necessárias para trilhar os
caminhos que despertam a curiosidade. Mundo afora.
O costume de dar livros aos
filhos começava no chá de bebê: − Não me deem fraldas, quero livros infantis,
coloridos. Encham o berço de meu bebê com livros, assim ele se acostuma com o
cheiro do papel, com as imagens, e, de vez em quando, eu poderei ler uma
historinha pra ele e, se perceber que o livro não presta, uso o papel para
limpar o coco da cadelinha que nos acompanha.
Aliás, esse era outro costume da mãe, criar cães junto com os filhos.
Brinquedos eletrônicos só a partir dos cinco anos.
Isso deu tão certo que os
filhos de D. Lurdes Militão, ao chegarem ao ginásio, já haviam lido muitos dos
autores indicados para a idade deles, imprescindível a Bolsa Amarela de
Lygia Bojunga. O mais sonhador dos garotos viajou pela obra de Júlio Verne
e compreendeu de onde vieram alguns filmes que alimentaram a magia do cinema e
o encanto dos super-heróis. Tudo começou ou começa com a combinação das
letrinhas mágicas, seguida da imaginação fértil dos escritores. Cada
escritor é seguido de releitura, cada leitura acrescenta conhecimento! Mamãe coruja gostava de repetir pra si mesma o
velho preceito das artes literárias.
De vez em quando, enquanto
limpava os cômodos da casa, gostava de falar sozinha, na expectativa de que
algum dos filhos a ouvisse: - nem todos os que leem muito se transformam em
escritores, mas ninguém consegue escrever sem ter o costume de viajar pelo
mundo da leitura. A bagagem da leitura lhe acompanhará por todos os lugares
e ninguém poderá rouba-la. Com a chegada da internet, dos celulares e dos
computadores, as viagens online ganharam novos componentes ao vivo e a cores.
Dizem os críticos
pesquisadores, que quando o bardo William Shakespeare escreveu Romeu e Julieta
sequer conhecia a cidade de Verona, muito menos a casa que a indústria do turismo
apresenta como a casa dos Capuleto, os pais de Julieta, filha única. O mesmo se
diz de Romeu, filho único dos Montechio. As histórias das cidades italianas
atravessavam a Europa pela verve dos mercadores e andarilhos trovadores, até
que esbarraram na mente criativa, engenhosa e imaginativa de diversos autores,
entre eles, aquele que é considerado o maior escritor de todos os tempos. O
inventor do humano.
A professora Lourdes, quando o
último dos cinco filhos venceu a barreira da adolescência, criou um clube de
leitura familiar: cinco livros eram distribuídos para leitura e, à medida que
iam sendo lidos, eram trocados. Ao término da leitura de todos os livros, ela
marcava um encontro num sábado, fazia um grande jantar, dentro das suas
possibilidades, e discutia com os filhos, os amigos dos filhos e o marido,
mascate, o conteúdo de cada livro. Muitas mães, moradoras de Campo Formoso,
sertão da Bahia, a invejavam.
Com o avançar da idade, os
filhos seguiam a lógica familiar, mudavam de cidade, se casavam, ingressavam na
Universidade. Um morreu, antes dos vinte, acidente de moto. Dos cinco, o mais
novo, permaneceu em Campo Formoso. Fez faculdade de História, uma das poucas
que existia em sua cidade, aprendeu a falar inglês e se dedicou a dar aulas,
nos moldes do que fazia a própria mãe. Descrevia inúmeras cidades sem nunca as
ter conhecido. Adepto do gênero “Viajando pelo mundo, através dos Livros”,
exercia a vez de protagonista home office.
O pesquisador/professor
estudava os lugares mais interessantes do mundo, fazia comentários e críticas
aos monumentos históricos, indicava sites de pesquisa, sem sair da sua pequena
cidade, nem deixar o convívio das pessoas que mais amava.
Depois de algum tempo, com o
avanço do conhecimento, Marques Militão se dedicou a escrever livros, cada
livro aprofundava o visual de grandes cidades. Conhecer Paris é uma coisa, mas
vê-la pela ótica de Ernest Hemingway, em Paris É Uma Festa, é
instigante. Que graça tem viajar a Paris, sem saber quem foi o Marquês de Sade,
o Corcunda de Notre Dame, a Madame Bovary, quem foram Os Miseráveis de Victor
Hugo? de que adiantava subir a Torre Eiffel sem sentir o rumorejar do cérebro
com o Existencialismo de Sartre e Simone de Beauvoir? A França não é a mesma
sem O Pequeno Príncipe de Antoine de Saint Exupéry, sem Voltaire, sem
Napoleão, sem Descartes, sem Molière, sem Alexandre Dumas, enfim não basta
olhar a Bastilha ou o Louvre sem alimentar, para o resto da vida, o vírus do
conhecimento e da admiração! A vacina contra a asnice, feita com a matéria
prima da instrução, era sempre bem-vinda.
E assim Marques Militão ia
descrevendo as grandes cidades, acompanhadas de seus grandes personagens e do
significado dos monumentos. Londres, Brasília, Nova York, Rio de Janeiro,
Salvador, Recife, Lisboa etc. ganhavam um guia de viagens pra lá de
interessante. Já publicou 15 livros, para orgulho da mamãe coruja. Casado, pai
de um filho de 9 anos, alfabetizado em dois idiomas.
Certo dia, de surpresa, a
esposa o encurralou na alcova, onde já fizeram inúmeras viagens inesquecíveis,
entre gritinhos de gozo, compondo a poesia do corpo: − Marques, meu amor,
estou cansada desse faz de conta, queria viajar de verdade, subir num avião,
tomar um taxi, transar num hotel, conhecer um museu ao vivo, acompanhar pessoas
apressadas pelas ruas de Nova York, tomar banho nas praias de Miami, assistir
um musical na Broadway, visitar a Disney e os Estúdios de Hollywood, subir a
Torre Eiffel, atravessar o rio Danúbio, assistir uma missa na Notre Dame,
presenciar uma partida de futebol entre Real Madri e Barcelona, conhecer
presencialmente Buda e Peste. E Ancara, e Istambul e o estreito de Bósforo.
Queria sentir o prazer enchendo meus olhos e me descendo pela face; queria
descobrir se gozar num quarto de hotel francês é o mesmo que gozar na nossa
velha cama, mesmo sabendo que o jorro quente de seu esperma me completa por
inteira, qualquer que seja o cenário. Meu amor, compreenda a curiosidade de uma
mulher que o ama integralmente.
Tomásio, o filhinho de Dora e
Marques, apavorado com o discurso da mãe, em voz alta, de supetão, adentrou o
quarto do casal, pegou a mãe pela mão, fez a cara mais séria que a infância
permitia, olhos nos olhos, com voz aguda: − Mamãe, você ainda não pode
viajar porque não tem bagagem, você vai odiar as ruas antigas e o povo de
Paris, você ainda nem leu os livros do papai!... Papai tomou um susto, a
curiosidade estabeleceu contato com o prazer, queria saber de onde o garoto
tirara o ódio ao povo de Paris. Da internet, ora bolas. Dizem que é o pior povo
da Europa, o mais ‘metido à besta’ que existe. São boçais que nem os ingleses.
Boçais? E o pai nem sabia que o filho conhecia essa palavra.
O pai, orgulhoso, mas
estupefato, com os olhos cheios de lágrimas, acompanhou o filho até o quarto,
fechou a janela, impedindo o vice-versa das vistas, beijou o rebento e pediu
delicadamente que ele fosse dormir; apagou a luz e puxou a cortina escura, como
se estivesse iniciando o círculo da pré-adolescência. Amanhã será outro dia!
No silêncio da noite, pelas
ondas do nada, perguntou online a chorar: o amor, o amor onde está? o amor
está aqui, perto-perto de nós, está arrumando a bagagem, para uma viagem que
virá.
De mãos dadas atravessaram o
Arco do Triunfo; ela não viu quase nada, mas ele se encantou com Napoleão,
montado em seu cavalo branco, puxando o desfile patriótico das tropas que
libertaram a França, no fim da 2ª Guerra Mundial. Napoleão na 2ª guerra? seria
ótimo. Marques inclinou a cabeça em respeito aos soldados mortos nas grandes
guerras, recebendo de volta uma piscada de olhos do General De Gaulle.
De repente, uma multidão de
turistas invadiu as ruas de Paris. Mas não eram só turistas, havia milhares de
refugiados africanos, asiáticos, gente fugindo da guerra na Síria,
sobreviventes da fome. Marques percebeu que Paris perdera o seu glamour, até
para se tomar um café havia fila. No final da noite, exaustos das caminhadas
sobre ruas históricas de pedras, após um banho frio de desejos, se jogaram no
colchão, sem se preocuparem com detalhes estéticos do quarto, queriam apenas
dormir. Dora misturou o cansaço com as sábias ponderações do pequeno Tomásio.
Nem chegou e já pensava em voltar: Como estará meu menino querido na
companhia da vovó? Campo Formoso, meu campo formoso!!! Nas asas do pensamento,
olhos fixos no horizonte, posso imaginar, sentir, ver tuas serras e colinas, o
verde esmeralda de tuas paisagens ao vento.
*Inspirado em nanoconto de
Viriato Moura: Por falta de bagagem,
não sabia viajar.
Os restos mortais de Eça; pertencem ao estado ou á família? (Continuação)
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