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Crônica

Muito além do meme


Muito além do meme - Gente de Opinião

A indignação é um sentimento que ultrapassa os limites da revolta pessoal, é o que transborda do medo, da tristeza, da raiva, do nojo. Nenhum meme causou mais impacto nas mídias sociais do que a reação espontânea, tensionada pelos músculos da face, estampada nos olhos furiosos, que ditaram, em voz contundente, a frase da garotinha Patrícia Veloso, 9 anos de idade, descoberta, recentemente, pela imprensa, quando ela já estava com 47 anos – Que show da Xuxa é esse?

O meme foi tão forte que centralizou a atenção de todas as classes, de todas as idades, de todos os graus de educação, invadiu os dicionários singulares e, num misto de vídeo e texto, passou a ser um forte sinônimo de indignação.

Se alguém da direita está inconformado com as atitudes do Xandão, dentro do STF, basta colocar uma peruca imaginária da Xuxa, na careca do ministro, e perguntar: Que xou da Xuxa é esse? Aliás, esse país virou mesmo um xou da Xuxa. Como não rir e não se indignar com a condenação e absolvição de um morador de rua, preso como golpista do 8/01 e, dois anos depois, liberado, com a declaração de “foi por engano”. Que justiça é essa que só se engana, quando lhe é conveniente, quando é para melhorar sua aparência, diante do povo? Por que não prenderam todos os militares, inclusive os oficiais do exército, que davam suporte ao acampamento, na porta do quartel do exército, em Brasília? Em vez disso, prenderam a imbecil massa de manobra, depois que ela foi incitada a invadir as instalações dos três poderes.  

Prender os autores do plano “punhal verde e amarelo”, por absoluta incompetência em dar um golpe, até acho justo, mas mandar prender os idiotas, que estavam acampados na praça do quartel do exército, acho ridículo. Que armas aqueles coitados possuíam, na hierarquia da vida, a não ser o “oba-oba” e a ingenuidade de que, destruindo as instalações dos três poderes, demonstrariam força e os militares, na calada da noite, os ajudariam a recolocar o capitão no poder?

Em Porto Velho também tivemos um xou da Xuxa particular, na briga por holofotes de dois prefeitos (o eleito e o que perdeu a indicação), quando da inauguração/desinauguração (?) da rodoviária de Porto Velho: que xou da Xuxa é esse, senhores prefeitos? A pergunta/indignação pode ser feita na Câmara, no Senado, no STF, no Planalto, no Exército, na Marinha, na Aeronáutica, situações não faltarão.

Por outro lado, não adianta embarcar na metáfora de Pilatos e lavar as mãos, a sujeira que as impregnou advém da inoperância, da vergonha, da falta de coragem, não se apaga com uma simples lavada metafórica. Contudo, o travesseiro, as lágrimas e a dor na consciência se encontrarão, durante muitas madrugadas, com a pergunta que não lhes sairá dos ouvidos: que xou da Xuxa é esse? Acabou a confiança/esperança! Acabou a tal interpretação do Art. 142 da Constituição Federal, estamos à mercê de um Rasputin de cabeça pelada. Sem apoio dos militares, sem um congresso confiável, o povo não terá como impedir que a Constituição seja rasgada, que o STF dite normas, faça leis, julgue, mande prender, mande soltar, à revelia da população e de seus representantes no Congresso. Parece que o soldo fala mais alto do que a missão.

A frase completa, dita aos gritos, demonstra uma indignação social e cultural inaceitável, inadmissível em alguém com 9 anos: "Eu cheguei aqui três horas da madrugada, isso não pode acontecer! Deixaram o moço entrar e as crianças ficaram! Que Xou da Xuxa é esse?! Que Xou da Xuxa é esse?!" Quem viveu àquela época e acompanhou os bastidores, lembra bem: a Xuxa não era esse amor de pessoa que aparenta hoje, ademais não deu o crédito merecido ao papel da Marlene no sucesso do programa, ao longo dos anos, nem no documentário feito pela Globo. Quem seria o moço que entrou, deixando as crianças na porta? Descubram e, quem sabe, estarão acrescentando mais um elemento ao meme, no corpo significativo da indignação.

Diante da viralização do meme, resta perguntar: por que será que tantos outros instantes de indignação popular não explodem na mídia? A ciência nos ensina que “o indignado sofre a dor alheia, ao testemunhar outras pessoas (o presidente, os corruptos), lograrem êxito ao se aproveitarem de uma situação difícil, para obterem vantagens para si, ou se apropriarem do que, por mérito, não lhes pertence”. O Lula em seu discurso desta semana, comemorando o fato de ainda estar vivo, gritou alto e forte: - Ainda estamos aqui! Mas, de mãos dadas com Janja e a insensatez, não conseguiu silenciar a voz indignada e espontânea do povo: a ausência e o silêncio popular estiveram na Praça dos Três Poderes, ratificando o golpe dos moradores de rua, enquanto o povo, no aconchego de seus lares, perguntava, indignado: QUE XOU DA XUXA É ESSE? O meme interrogativo não possui a ressonância merecida, porque teme as punições da ditadura da toga, afinal a proteção de Fachin é exclusividade do Lula.

E para encerrar o desabafo, vale citar Santo Agostinho e Paulo Freire: “a esperança tem duas filhas lindas, a indignação e a coragem; a indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las (SA)”;

“Não é possível refazer este país, democratizá-lo, humaniza-lo, torna-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, in-viabilizando [sic] o amor. Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda (PF)”.

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