Terça-feira, 9 de julho de 2024 - 13h30
Das
vistas que me atormentam a existência, as da janela da alteridade (ou será da
empatia?) são as mais difíceis de serem assimiladas, compreendidas como sendo
de fundamental importância, no respeito ao outro, nos relacionamentos. Como é
difícil encontrar dentro da gente um ser humano sinceramente psicossocial. A
simples empatia, a troca de favores, o altruísmo, o sentir a dor do outro é
razoavelmente possível, mas nem sempre buscado. Deixar a caverna custou
milênios da evolução, embora em algumas atitudes da vida, parece que a caverna
nunca nos deixou. Como entender as milhares de crianças assassinadas na
Ucrânia, na Palestina, na Somália, Sudão …? Que diabo de civilização é esta que
não evolui, parou no tempo?
Entrementes,
se em cada cabeça há uma sentença, assimilar e aceitar as vistas da janela do
outro, não é tão fácil assim. Não se trata de diferença de cor, de gênero, de
comportamento fora dos padrões éticos, mas de penetrar o pensamento alheio,
como se estivesse na pele do outro, porque só assim você perceberia a
existência de situações esdrúxulas, como a dos morenos ou pardos, que se
comportam como brancos e têm preconceito de cor. A ABL, do moreno Machado de
Assis, recusou por duas vezes o ingresso de Lima Barreto, nos quadros da
Academia, simplesmente por preconceito de cor, porque ninguém ousaria, àquela
época, duvidar da capacidade do autor de Triste fim de Policarpo Quaresma.
Como
entender alguém que se acha melhor porque “tem mais”, ainda que este “ter”
tenha um passado comprometido com a ética;
Ou o
outro que se acha mais sábio, mais inteligente, ainda que a vida tenha nos
ensinado que “o homem que diz sei, não sabe; que diz sou, não é”, etc. etc.
E se
você for o reitor de uma universidade, líder de um partido político, presidente
da Câmara de Vereadores, da Assembleia Legislativa, da Câmara dos Deputados, do
Senado, ou simplesmente presidente de uma academia de letras, formada por
juízes, desembargadores, médicos, advogados, professores, cientistas, artistas
plásticos, egos inflados, que precisam ser administrados levando-se em conta o
princípio da empatia ou da alteridade? Não, não é fácil, meu caro Diego
Vasconcelos!!!
Às
vezes me ponho a abrir a janela do outro ou a trocar a janela dele pela minha,
as vistas são de difícil assimilação, porque envolvem muito mais do que a
simples diferença de cor, de gênero, de grau de instrução, de cargo, de status
e vão às profundezas da alma, onde se escondem os primeiros comprometimentos
genéticos, que determinam de que parte do mundo você veio, quais conceitos você
assimilou ao longo do tempo, o que entrou mais no cantinho da memória do seu
cérebro e permanece até hoje, tanto do lado materno quanto do paterno.
Gustave
Young nos ensinou que no cérebro humano está a soma de todas as civilizações,
entretanto, um ser do norte da Europa foi influenciado pelo meio e se comporta
de forma diferente dos demais europeus, gerando outra civilização, o mesmo
ocorre com judeus e árabes, árabes e persas, árabes e europeus, incas e
astecas. etc. etc. Atualmente, estudiosos
como Yuval Noah Harari acrescentam mais um diferencial: não apenas os Sapiens
sobreviveram ao tempo, deixando marcas nas civilizações, mas também os
Neandertais, gerando características físicas e mentais diferenciadas, ao longo
dos continentes, apontando os grandes fantasmas que perseguem o homem desde a
origem.
Com
isto não quero dizer que não seja possível a interação humana, quando você se
relaciona com outras pessoas ou grupos, difícil é reconhecer e aprender com a
diferença, fazendo-se respeitar ao mesmo tempo em que respeita o indivíduo, uma
verdadeira via de mão dupla, onde ocorrem invasão de pista alheia, derrapagem,
contramão, atropelamento e mortes.
Às
vezes eu gosto de me imaginar em um universo paralelo, onde a
alteridade fosse a norma que levaria o ser humano ao amor pleno, ao
profundo significado do perdão, o fim de todas a desavenças pessoais. Logo vejo
o comboio da vida, puxado pela locomotiva da razão, passando por cima das
variantes da fabulação: pobre menino septuagenário, de perfil comprometido
pelos sonhos da ficção.
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