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Crônica

Suicídio na Praça dos Três Poderes


Suicídio na Praça dos Três Poderes - Gente de Opinião

Apesar das agruras da seca, o nordestino é um cabra festeiro, além do carnaval, começa a comemorar os santos juninos com o casamenteiro Santo Antônio, passa por São João, o maior dos festeiros e conclui com São Marçal, o padroeiro dos bombeiros. O São João de Bonfim é inesquecível, uma semana de festas. Tem para todos os gostos: forró na praça, fogos variados colorem o céu. Blocos de festeiros visitam as casas, acompanhados de tocadores de sanfona, zabumba, pandeiro e pífano, um tipo de flauta transversal muito popular no Nordeste, em formato de cilindro, produzida em diferentes tipos de material, como bambu, taboca, taquara, ferro, alumínio, e até mesmo de tubo PVC. A cantoria vara a noite inteira e invade nosso cantinho cerebral dedicado às lembranças tatuadas: de vez em quando me surpreendo, em janeiro, cantarolando músicas juninas, no banheiro!

Foi numa noite igual a esta

Que tu me deste o coração

O céu estava assim, em festa

Porque era noite de São João

Era e é comum, em dia de São João, acender uma fogueira na porta da casa, reunir os familiares e amigos para saborearem aluá (nome proveniente do Quimbundo “Ualuá”, bebida feita a partir da fermentação de grãos ou da casca do abacaxi); quentão, licor de gengibre, de casca de queijo do reino, de jenipapo e de tantos quantos cabem na inventividade do nordestino. Lá se faz licor de tudo! Canjica, bolo de fubá, mungunzá, milho e batata doce assados na fogueira fazem parte das iguarias que marcam presença em todas as casas. Fogos variados animam a garotada. Traque, bomba de todos os calibres, cobrinha, chuvinha, rojões, morteiros de artificio, com bombas, assovios e lágrimas em cores variadas. É, sem dúvida alguma, uma festa vistosa e barulhenta, além de animada.

Lembro do seu Manoel Fogueteiro que fabricava fogos caseiros em sua casa, usando pólvora, barbante encerado, taliscas de bambu, papel grosso, cerâmica, etc. O povo nordestino além de festeiro gostava e gosta de usar fogos, mas só em algumas cidades da Bahia havia, e ainda há, a famosa guerra de espadas (um cilindro feito com bambu com cerca de 25 cm de comprimento por 4 cm de diâmetro, cheio de pólvora, presa nas extremidades com cera ou argila). Quando um dos lados da espada era aproximado de um tição, soltava um facho de fogo, com cerca de 2 m de comprimento e era como se o brincante, enquanto durava a pólvora, estivesse portando uma longa espada de fogo. 

Gostoso era lançar as espadas contra outros grupos brincantes, formando uma verdadeira guerra de espadas. Cada bairro preparava uma árvore com cerca de 4 metros de altura com os galhos lotados de presentes, mimos das pessoas mais abastadas da rua, que convidavam os grupos de outros bairros para tentarem toma-la de assalto (comer a fogueira crua, como se dizia antigamente), ou seja, antes da hora marcada pelo fogo: na base da árvore, acendia-se uma fogueira que deveria queimar, até que a árvore tombasse, deixando os ricos presentes à disposição dos guerreiros.

Enquanto a fogueira queimava, a guerra de espadas corria solta. Não era fácil invadir a área de pessoas, como o médico Pedro Amorim, que comprava dezenas de dúzias de espadas e contratava peões da fazenda dele, para defenderem a árvore, cheia de atrativos, às vezes até cheques valiosos.  Depois que a árvore caía e os mimos era saqueados, o próprio médico abria os portões da sua casa e convidava a todos, para beberem e comerem à vontade. Olha pro céu meu amor, veja como ele está lindo!!! O mesmo se repetia em outros bairros da cidade. Nem preciso dizer, que durante os festejos de São João, o Pronto Socorro da cidade ficava lotado.

Ninguém participava ou participa de um São João em Bonfim, sem usar roupas apropriadas e um chapéu de couro ou de palha. Além da direção incerta de uma espada, quando é jogada, foguetes de haste de bambu cruzam os céus da cidade, voando para mais de cem metros de altura, deixando um rastilho de pólvora até que as bombas espoucam e os destroços despencam “ladeira abaixo”, ameaçando os de cabeça desprotegida os “sem telha”.

Imaginem se o Xandão e sua careca brilhosa resolvessem visitar Senhor do Bonfim, em dia de São João! Ia faltar tinta ditatorial na bic azul da autoridade máxima. Seriam tantos os possíveis terroristas, metade da cidade receberia a visita dos delegados da PF. Aliás foi o suicídio do “mártir” catarinense Francisco Wanderley Luiz ou Tiü França, na praça dos três poderes, com fogos de artifício, que me fez lembrar do São João da minha cidade. Só mesmo um louco atentaria contra o STF e o Congresso, com meia dúzia de fogos debaixo do braço. Nas palavras da competente primeira dama, possível candidata a presidanta do Brasil, o tal Chico não passava de um Bestão, tentando atrapalhar o G20. Se fosse esperto não teria morrido, teria se divertido, guardaria os fogos para celebrar a conquista da taça Libertadores da América pelo Botafogo. Vai fogão!!!

Desta vez Xandão respirou aliviado, não havia como punir defunto débil mental, mas não deve ser fácil dormir com o barulho atentatório de tanta gente. Quase que ao mesmo tempo do tal suicídio, surgiu na imprensa comprometida, uma nova/velha notícia bombástica: um grupo de generais, ligados ao Bolsonaro, estaria comprometido com o projeto de envenenamento de Lula, Alckmin e Alexandre, numa tentativa de golpe de estado. Eu quero ovo de codorna pra comer, o meu problema ele tem que resolver. Viva Antônio Conselheiro, viva Zumbi dos Palmares, viva Maria Quitéria, viva Santo Antônio, o único santo que usava a língua com tanto vigor e liberdade de expressão, que ela está preservada, pelo poder de Deus, no altar da basílica de Santo Antônio de Pádua, na Itália. No quesito língua poderosa incorruptível, tenho inveja de Santo Antônio.

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